Tonalidades Emocionais e sentimentos

(Bollnow2009)

Reconhece-se melhor o sentido estrito da tonalidade emocional como estado fundamental da existência humana ao diferenciá-la do domínio vizinho dos sentimentos em sentido próprio1.

Os sentimentos propriamente ditos referem-se sempre “intencionalmente” (Brentano) a um objeto determinado, são “sentimentos objetivos” (Klages), “dirigidos” (Lersch): toda alegria é alegria por algo (e por algo determinado), toda esperança é esperança de algo, todo amor é amor por algo, toda aversão [28] é aversão por algo, e assim por diante. As tonalidades emocionais, ao contrário, não têm um objeto determinado. São modos de ser, colorações da existência humana como um todo, nas quais o eu se torna imediatamente consciente de si2 de uma maneira particular, mas que não indicam nada externo a elas.

Assim, o medo (Furcht) é um sentimento (determinado), pois nele o homem teme sempre algo pelo qual se sente ameaçado (uma agressão, uma perda, um vexame, ou algo similar). A angústia (Angst), por outro lado, distingue-se do medo pelo fato de que nela o homem é incapaz de indicar um objeto determinado diante do qual se sinta angustiado. A angústia permanece absolutamente indeterminada quanto ao objeto. “Não era nada”, diz o indivíduo quando a angústia passa, expressando assim inconscientemente muito bem a natureza da coisa. Por isso, tenta-se depois superar a angústia por meio de raciocínios: como alguém pode se deixar atormentar por algo que nem sequer existe no mundo? Mas é justamente assim que se desconhece desde o início a natureza da angústia, tentando reduzir o indeterminado, e portanto estranho, da tonalidade emocional ao plano mais transparente dos sentimentos determinados. Por mais que se tente distrair o homem da angústia, ela se apresenta indubitavelmente na realidade da vida como um fato bruto. Por esse motivo, a filosofia da existência (Kierkegaard, Jaspers, Heidegger3) parte precisamente desse “nada”, dessa indeterminação: não há nada determinado no mundo diante do qual o homem sinta angústia, mas é sem dúvida a estranheza4 da existência que se revela na angústia.

 


  1. A distinção parece muito adequada nesta forma para uma definição conceitual mais clara, embora a linguagem corrente em geral, e com ela grande parte da linguagem científica, permaneça indeterminada a esse respeito. A linguagem corrente emprega o termo “sentimento” (Gefühl) tanto no sentido aqui usado de modo mais restrito (dirigido a um objeto determinado) quanto num sentido mais amplo que engloba a tonalidade emocional (não dirigida a um objeto determinado). Esta segunda acepção deve ser deixada de lado devido à indeterminação que acarreta, especialmente quando se trata posteriormente de conceitos precisos. Em algumas palavras compostas comuns, como Lebensgefühl (sentimento vital), Wohlgefühl (sentimento de bem-estar), Selbstgefühl (sentimento de si) etc., essa separação não pode ser mantida. Por isso, foi necessário usar posteriormente (sem justificar cada caso individualmente) alguns exemplos de tonalidade emocional onde geralmente se fala de “sentimento” quando na verdade se trata do que aqui se chama tonalidade emocional. Sobre o significado de “sentimento” na linguagem comum, ver: J. Voikeit, Versuch einer Fühlen und Wollen, München 1930, p. 3 ss.; P. Schroder, Stimmungen und Verstimmungen, Leipzig 1930. 

  2. Cf. Voikeit, Versuch einer Fühlen und Wollen, p. 12 ss. 

  3. Ver também do ponto de vista médico: F. Sauerbruch – H. Wenke, Wesen und Bedeutung des Schmerzes, Breslau 1936, p. 40 ss. 

  4. O autor usa aqui o termo Unheimlichkeit, que na linguagem heideggeriana já se costuma traduzir por “desenraizamento”, mas que indica em todo caso a estranheza radical do ser-no-mundo e um sentido de vertigem diante da angústia da existência