Leonor Loureiro
A noção de obrigação ultrapassa a noção de direito, que lhe é subordinada e relativa. Um direito não é eficaz por si próprio, mas somente pela obrigação à qual corresponde; a realização efetiva de um direito provém não daquele que o possui, mas dos outros homens que se reconhecem obrigados a alguma coisa para com ele. A obrigação é eficaz desde que seja reconhecida. Uma obrigação não reconhecida por ninguém não perde nada da plenitude de seu ser. Um direito que não é reconhecido por ninguém não é grande coisa.
Não tem sentido dizer que os homens têm, por um lado, direitos, e por outro lado deveres. Essas palavras não exprimem senão diferenças de ponto de vista. Sua relação é a do objeto e do sujeito. Um homem, considerado em si mesmo, tem somente deveres, entre os quais se encontram certos deveres para consigo próprio. Os outros, considerados de seu ponto de vista, têm somente direitos. Ele tem direitos, por sua vez, quando é considerado do ponto de vista dos outros, que reconhecem ter obrigações para com ele. Um homem que estivesse sozinho no universo não teria nenhum direito, mas teria obrigações.
A noção de direito, sendo de ordem objetiva, não é separável das noções de existência e de realidade. Ela aparece quando a obrigação desce à área dos fatos; por conseguinte, ela encerra sempre, numa certa medida a consideração dos estados de fato e das situações particulares. Os direitos aparecem sempre como vinculados a certas condições. Só a obrigação pode ser incondicionada. Ela se coloca numa área que está acima de todas as condições, porque está acima deste mundo.
Os homens de 1789 não reconheciam a realidade de tal área. Não reconheciam senão a realidade das coisas humanas. É por isso que começaram pela noção de direito. Mas, ao mesmo tempo, quiseram estabelecer princípios absolutos. Esta contradição os fez cair numa confusão de linguagem e de ideias que contribuiu bastante para a confusão política e social atual. A área do que é eterno, universal, incondicionado, é diferente daquela das condições de fato, e aí residem noções diferentes que estão vinculadas à parte mais secreta da alma humana.
A obrigação não vincula senão os seres humanos. Não há obrigações para as coletividades como tais. Mas há obrigações para todos os seres humanos que compõem, servem, comandam ou representam uma coletividade, tanto na parte de sua vida ligada à coletividade como naquela que é independente dela.
Obrigações idênticas vinculam todos os seres humanos, embora elas correspondam a atos diferentes segundo as situações. Nenhum ser humano, qualquer que seja, em nenhuma circunstância, se pode livrar disso sem crime; exceto nos casos em que, sendo duas obrigações de fato incompatíveis, um homem é obrigado a abandonar uma delas.
A imperfeição de uma ordem social se mede pela quantidade de situações desse gênero que encerra.
Mas mesmo nesse caso há crime, se a obrigação abandonada for não somente abandonada de fato, mas ainda por cima negada.
O objeto da obrigação, na área das coisas humanas, é sempre o ser humano como tal. Há obrigação para com todo ser humano, pelo simples fato de ele ser um ser humano, sem que nenhuma outra condição precise intervir, mesmo que ele não reconhecesse nenhuma.
Esta obrigação não repousa sobre nenhuma situação de fato, nem sobre jurisprudências, nem sobre os costumes, nem sobre a estrutura social, nem sobre as relações de força, nem sobre a herança do passado, nem sobre a suposta orientação da história. Pois nenhuma situação de fato pode suscitar uma obrigação.
Esta obrigação não repousa sobre nenhuma convenção. Pois todas as convenções são modificáveis segundo a vontade dos contratantes, enquanto nela, nenhuma mudança na vontade dos homens pode modificar o que quer que seja.
Esta obrigação é eterna. Ela corresponde ao destino eterno do ser humano. Só o ser humano tem um destino eterno. As coletividades humanas não o têm. Então, não há, para com elas, obrigações diretas que sejam eternas. Só é eterno o dever para com o ser humano como tal.
Esta obrigação é incondicionada. Se está fundada sobre alguma coisa, essa alguma coisa não pertence ao nosso mundo. No nosso mundo, ela não está fundada sobre nada. É a única obrigação relativa às coisas humanas que não está submetida a nenhuma condição.
Esta obrigação tem não um fundamento, e sim, uma verificação no acordo da consciência universal. Ela é expressa por alguns dos textos escritos mais antigos que nos foram conservados. É reconhecida por todos, em todos os casos particulares em que não é combatida pelos interesses ou paixões. É relativamente a ela que se mede o progresso.
O reconhecimento desta obrigação é expresso de uma maneira confusa e imperfeita, mas mais ou menos imperfeita segundo os casos, pelo que se denomina direitos positivos. Na medida em que os direitos positivos estão em contradição com ela, nesta exata medida, eles são atingidos pela ilegitimidade.
Embora esta obrigação eterna corresponda ao destino eterno do ser humano, ela não tem esse destino por objeto direto. O destino eterno de um ser humano não pode ser objeto de nenhuma obrigação, porque ele não está subordinado a ações exteriores.
O fato de que um ser humano possua um destino eterno não impõe senão uma obrigação; é o respeito. A obrigação não é cumprida senão quando o respeito é efetivamente expresso, de uma maneira real e não fictícia; ele não pode sê-lo senão mediante as necessidades terrestres do homem.
Original
La notion d’obligation prime celle de droit, qui lui est subordonnée et relative. Un droit n’est pas efficace par lui-même, mais seulement par l’obligation à laquelle il correspond ; l’accomplissement effectif d’un droit provient non pas de celui qui le possède, mais des autres hommes qui se reconnaissent obligés à quelque chose envers lui. L’obligation est efficace dès qu’elle est reconnue. Une obligation ne serait-elle reconnue par personne, elle ne perd rien de la plénitude de son être. Un droit qui n’est reconnu par personne n’est pas grand-chose.
Cela n’a pas de sens de dire que les hommes ont, d’une part des droits, d’autre part des devoirs. Ces mots n’expriment que des différences de point de vue. Leur relation est celle de l’objet et du sujet. Un homme, considéré en lui-même, a seulement des devoirs, parmi lesquels se trouvent certains devoirs envers lui-même. Les autres, considérés de son point de vue, ont seulement des droits. Il a des droits à son tour quand il est considéré du point de vue des autres, qui se reconnaissent des obligations envers lui. Un homme qui serait seul dans l’univers n’aurait aucun droit, mais il aurait des obligations.
La notion de droit, étant d’ordre objectif, n’est pas séparable de celles d’existence et de réalité. Elle apparaît quand l’obligation descend dans le domaine des faits ; par suite elle enferme toujours dans une certaine mesure la considération des états de fait et des situations particulières. Les droits apparaissent toujours comme liés à certaines conditions. L’obligation seule peut être inconditionnée. Elle se place dans un domaine qui est au-dessus de toutes conditions, parce qu’il est au-dessus de ce monde.
Les hommes de 1789 ne reconnaissaient pas la réalité d’un tel domaine. Ils ne reconnaissaient que celle des choses humaines. C’est pourquoi ils ont commencé par la notion de droit. Mais en même temps ils ont voulu poser des principes absolus. Cette contradiction les a fait tomber dans une confusion de langage et d’idées qui est pour beaucoup dans la confusion politique et sociale actuelle. Le domaine de ce qui est éternel, universel, inconditionné, est autre que celui des conditions de fait, et il y habite des notions différentes qui sont liées à la partie la plus secrète de l’âme humaine.
L’obligation ne lie que les êtres humains. Il n’y a pas d’obligations pour les collectivités comme telles. Mais il y en a pour tous les êtres humains qui composent, servent, commandent ou représentent une collectivité, dans la partie de leur vie liée à la collectivité comme dans celle qui en est indépendante.
Des obligations identiques lient tous les êtres humains, bien qu’elles correspondent à des actes différents selon les situations. Aucun être humain, quel qu’il soit, en aucune circonstance, ne peut s’y soustraire sans crime ; excepté dans les cas où, deux obligations réelles étant en fait incompatibles, un homme est contraint d’abandonner l’une d’elles.
L’imperfection d’un ordre social se mesure à la quantité de situations de ce genre qu’il enferme.
Mais même en ce cas il y a crime si l’obligation abandonnée n’est pas seulement abandonnée en fait, mais est de plus niée.
L’objet de l’obligation, dans le domaine des choses humaines, est toujours l’être humain comme tel. Il y obligation envers tout être humain, du seul fait qu’il est un être humain, sans qu’aucune autre condition ait à intervenir, et quand même lui n’en reconnaîtrait aucune.
Cette obligation ne repose sur aucune situation de fait, ni sur les jurisprudences, ni sur les coutumes, ni sur la structure sociale, ni sur les rapports de force, ni sur l’héritage du passé, ni sur l’orientation supposée de l’histoire. Car aucune situation de fait ne peut susciter une obligation.
Cette obligation ne repose sur aucune convention. Car toutes les conventions sont modifiables selon la volonté des contractants, au lieu qu’en elle aucun changement dans la volonté des hommes ne peut modifier quoi que ce soit.
Cette obligation est éternelle. Elle répond à la destinée éternelle de l’être humain. Seul l’être humain a une destinée éternelle. Les collectivités humaines n’en ont pas. Aussi n’y a-t-il pas à leur égard d’obligations directes qui soient éternelles. Seul est éternel le devoir envers l’être humain comme tel.
Cette obligation est inconditionnée. Si elle est fondée sur quelque chose, ce quelque chose n’appartient pas à notre monde. Dans notre monde, elle n’est fondée sur rien. C’est l’unique obligation relative aux choses humaines qui ne soit soumise à aucune condition.
Cette obligation a non pas un fondement, mais une vérification dans l’accord de la conscience universelle. Elle est exprimée par certains des plus anciens textes écrits qui nous aient été conservés. Elle est reconnue par tous dans tous les cas particuliers où elle n’est pas combattue par les intérêts ou les passions. C’est relativement à elle qu’on mesure le progrès.
La reconnaissance de cette obligation est exprimée d’une manière confuse et imparfaite, mais plus ou moins imparfaite selon les cas, par ce qu’on nomme les droits positifs. Dans la mesure où les droits positifs sont en contradiction avec elle, dans cette mesure exacte ils sont frappés d’illégitimité.
Quoique cette obligation éternelle réponde à la destinée éternelle de l’être humain, elle n’a pas cette destinée pour objet direct. La destinée éternelle d’un être humain ne peut être l’objet d’aucune obligation, parce qu’elle n’est pas subordonnée à des actions extérieures.
Le fait qu’un être humain possède une destinée éternelle n’impose qu’une seule obligation ; c’est le respect. L’obligation n’est accomplie que si le respect est effectivement exprimé, d’une manière réelle et non fictive ; il ne peut l’être que par l’intermédiaire des besoins terrestres de l’homme.