SÍNTESE DA ANALOGIA
Os conceitos (enquanto esquemas noéticos): essência e existência, matéria e forma, substância e acidente, causa e fim, etc, resultam da abstração de dados comuns da experiência, quer interna quer externa, por influência da intuição ou da razão.
Os conceitos mais abstratos conservam sempre uma referência à experiência imediata (intuitiva).
E é em consideração a essa experiência que eles tomam sentido, e quando designam o objeto dessa experiência, têm significação.
Poder-se-ia perguntar se os conceitos formados a partir dos dados da experiência poderiam representar, significar, dados de outra ordem?
(A espiritual, por exemplo).
Não se pode deixar de reconhecer que os conceitos se fundam em conteúdos da experiência fática. A incorporação do pathos – pathico nos conceitos da razão e da intuição é indubitável.
E na “Psicogênese” teremos ocasião de estudar esta influência.
Quanto aos modos de significações dos conceitos podemos classificar: significações — seus modos: analogia; equivocidade; univocidade.
Um termo ou conceito é unívoco, quando é aplicado a diversos seres com a mesma significação. Animal é unívoco quando aplicado a boi, cavalo, símio, etc. Quando usamos, porém, “que animal!”, referindo-nos a um homem, em sentido naturalmente pejorativo, não o usamos univocamente, mas analogamente, porque, aí, retiramos o racional, que caracteriza a essência do homem. O mesmo quando empregamos “é águia”, um “leão”, um “urso”, etc.
É equivoco um conceito ou termo quando é aplicado a diversos seres com significação totalmente diferente. Assim “cão”, quanto ao animal e quanto à constelação, etc.
É análogo, quando aplicado a coisas diversas, com acepções que não são nem propriamente idênticas, nem completamente diferentes. Exs.: uma razão forte e uma árvore forte, etc.
Os conceitos aplicados aos objetos, de onde são tirados por abstração e aplicados ao ser, enquanto ser, ou às realidades que formam o objeto da metafísica, são unívocos, equívocos ou análogos?
Não podem ser equívocos, pois não há nenhuma realidade que seja totalmente diferente do mundo de nossa experiência. Deus ultrapassa-nos totalmente, mas não é impermeável a nós, pois é a origem de tudo, e em tudo há algo dele.
Não podem ser unívocos, pois as realidades metafísicas, às-quais nós os aplicamos, diferem dos fatos da experiência de onde foram abstraídas.
São, portanto, análogos:
A univocidade leva-nos ao monismo, que admite uma única: realidade; Deus (monismo panteísta) ou matéria (monismo materialista) ou ao pensamento (monismo idealista).
A equivocidade supõe o dualismo ou o pluralismo, ou seja, a: existência de realidades totalmente diferentes (distintas), e independentes. Só a analogia pode assegurar a pluralidade ncr unidade: distinção do Ser absoluto e dos seres relativos, mas unidades, porque os seres relativos têm o ser do ser absoluto (criacionismo); distinção da alma e do corpo, mas unidade substancial (espiritualismo).
Esta síntese que acabamos de fazer desses antepredicamentos (assim são eles chamados na lógica, por serem preâmbulos e pré-requisitos para a ordenação dos predicamentos ou categorias), não exclui a problemática que surgirá sobre a univocidade e a analogia, que é de magna importância para os estudos ontológicos. Mas, seguindo nosso método, que primeiramente trata sinteticamente os temas, para analisá-los a seguir, e concrecioná-los finalmente, segundo a decadialética, na nossa concepção tensional, seguiremos, aqui, como em outras partes, os mesmos caminhos.
Logicamente considerado, um termo é unívoco quando significa (aponta, como sinal) uma razão simplesmente uma, convenientem multis distritibutive (unum in multis), isto é, uma conveniente, distributivamente, a muitos (um em muitos), como o definem os escolásticos. A sabedoria de Salomão e a sabedoria de um homem experiente, enquanto sabedoria, em sua quididade, isto é, em sua formalidade, é unívoca, pois sabedoria é sabedoria, e nada mais. A univocidade, aqui, é puramente formal, porque a sabedoria deste, e neste homem, consta de um saber qualitativamente de outro, pela soma maior ou menor de conhecimentos que um tenha em relação a outro 1. Mas a sabedoria, como sabedoria, é unívoca. Este ponto é importante, para, mais adiante, compreendermos a polêmica entre os escotistas, que se colocam, quanto ao ser, no campo da univocidade, com os tomistas, que se colocam no campo da analogia.
Quando dizemos que um termo é análogo, reconhecemos que, nele, há algo que se assemelha ao analogado e algo que se diferencia.
Analogia é, portanto síntese do semelhante e do diferente. Todos os entes são análogos. Mas há graus de analogia.
Distingamos:
De atribuição extrínsica |
Quantitativa Qualitativa |
|
De atribuição intrínsica |
||
De proporcionalidade |
Há analogia de atribuição intrínseca, quando o análogo (termo, conceito, conjunto simbólico) convém propriamente a todos os objetos que designa, embora adequadamente em certos casos, inadequadamente em outros.
Exs.: o ato existencial é misto de ato e potência, é híbrido. Ato e potência são aplicados a Deus e às criaturas, analogicamente, por atribuição intrínseca.
Há analogia de atribuição intrínseca qualitativa entre dois medicamentos que servem para o mesmo fim. (Também pode confundir-se em certos casos com a função, mas só quando tomado dinamicamente).
Há analogia de atribuição intrínseca quantitativa entre dois objetos de qualidade e espécies diferentes, mas do mesmo peso, por ex.: 1 quilo de papel e 1 quilo de açúcar.
Há analogia de atribuição extrínseca, quando usada em sentido nem unívoco nem equívoco, mas apenas por transposição em consideração metafórica (substituição de um sentido exterior por outro, que apresente semelhanças meramente exteriores). Um homem risonho, alegre, e um jardim risonho, alegre. Um clima não saudável, e um homem não saudável. As metáforas são verdadeiras analogias, quando não disparatadas. Qualitativa, quando é uma qualidade: por ex.: sombrios pensamentos. Quantitativa, quando é uma quantidade: por ex.: um monte de burrice. A metáfora pertence mais à estética do que propriamente à Metafísica.
A analogia de proporcionalidade ou de proporção é a que consiste entre coisas totalmente diferentes, mas que apresentam, cada uma, certa similitude de relação (analogia de relação), ou de função (analogia de função).
A ala direita e a ala esquerda de um exército; o pé esquerdo e o pé direito de um edifício, a entre um chefe e a tropa e a entre a cabeça e o corpo, são outros exemplos de analogia. Como exemplo da analogia na matemática, temos: 2/4,4/5.
Temos a homologia, quando há correspondência na função de um todo com a função de um outro todo, como por exemplo, a existente entre as asas dos pássaros e os membros anteriores dos mamíferos, entre as penas dos pássaros e as folhas da árvore.
- Analogia Comentarios – COMENTÁRIOS
- Metodo Analogico – ANALOGIA E MÉTODO ANALÓGICO
- Tema Analogia – ANÁLISE DO TEMA DA ANALOGIA
- Duns Scot Analogia – A POSIÇÃO ESCOTISTA ANTE A UNIVOCIDADE E A ANALOGIA
- Estamos aqui numa univocitas secundum nomen ac rationem, que é uma univocidade de quarto grau, a menor para os escotistas.[↩]