TEMA V – O Símbolo e suas Aplicações
A SIMBÓLICA DOS NÚMEROS
Definia Aristóteles o número como a multiplicidade medida pela unidade. Mas, neste sentido, logo se nota que o conceito aristotélico é meramente o quantitativo.
Em “Teoria do Conhecimento” estudamos, embora em linhas gerais, o conceito de número para os pitagóricos, que, sem dúvida alguma, foram e são os que melhor o estudaram.
No sentido pitagórico de grau de teleiôtes, grau da perfeição para os iniciados, o número não é apenas a medida do quantitativo pela unidade, mas é também a forma, como proporcionalidade intrínseca das coisas, e pode ser tomado, como realmente o é, sob diversas modalidades.
Naquela ocasião expusemos como Pitágoras concebia o número.
Sintetizando o que escrevemos então, podemos dizer, sobre o pensamento pitagórico, o que segue:
Como o número comumente não é mais do que uma expressão abstrata da quantidade, julgaram que dentro dessa concepção estivesse também a de Pitágoras.
Mas se Pitágoras via também assim o número, não o via apenas assim.
A palavra número vem do termo grego nomos, que significa regra, lei, ordem, mas Pitágoras usava a palavra arithmós, como número em sentido genérico.
A ordem é a relação entre um todo e as suas partes, e se considerarmos que onde há esta relação entre o todo e as partes, há uma certa coerência, vemos que a idéia de ordem se torna enriquecida.
Para Pitágoras o número é também esta ordem, esta coerência, que dá a fisionomia da tensão de um todo.
Na matemática posterior, já de nossa era, vemos que o número não é apenas quantidade, mas também relação, e também relação de relação, ou seja, função.
Para Pitágoras, o número encerra sempre o numeroso, porque o número exige uma relação, e em toda relação há exigência de mais de um. O Um não é número. O Um é o todo. O Absoluto é o Um. (Não se deve confundir com o um aritmético).
“A unidade é a oposição entre o limite e o ilimitado; a unidade serve de momento de tensão e de aproximação de dois gêneros de realidade.” E uma frase pitagórica.
Podemos formar qualquer acepção sobre a essência, mas, em todas elas, uma nota é indispensável: na essência está sempre o imprescindível para que uma coisa seja o que ela é.
Para uma coisa ser o que ela é, há de ter uma ordem, ou melhor uma relação das partes com o todo, uma certa coerência, diferente das outras para que ela possa ser o que ela é, e não o que as outras coisas são.
Não é essa ordem o número? Podemos dizer: todas as coisas têm o seu número (arithmós) ou a sua ordem, a sua essência, por isso todo conceito é número.
Para termos a vivência do seu pensamento, precisamos despojarmo-nos dessa concepção superficial de que número seja apenas aquilo que nos aponta o quantitativo. Não; o numero nos aponta, além do quantitativo, o qualitativo, o relacional, a modalidade, valores, e as outras categorias.
Assim arithmós (o número) era quantidade, relação, função, tensão, lei, ordem, regra.
“Todas as coisas conhecidas têm um número, porque sem ele não seria possível que nada fosse conhecido nem compreendido” (Filolao, frag. 4). Este fragmento de Filolao mostra-nos bem claro como os pitagóricos concebiam o arithmós.
Se considerarmos que os fatos que constituem o nosso mundo, e nesse conceito de fato devemos incluir todos os corpos e os fatos psíquicos, vemos que eles não constituem, todos, uma coerência, ou, para usarmos da nossa linguagem, tensões estáticas, paradas, inertes, mas, constituem tensões dinâmicas que se processam, que passam de um estado para outro, que tomam uma direção.
O número é, por isso, também, processo, ritmo, vetor, fluxo.
Os fatos, que constituem o mundo, apresentam-se ora semelhantes entre si, ora diferentes, como também nos mostram que, ora se completam, sem se repelirem, ora não.
Quando dois fatos opostos se colocam um em face do outro e formam uma relação, uma concordância, um ajustamento, como se constituíssem algo novo, eles se harmonizam.
Todos temos, através da música, uma experiência: da harmonia.
Via Pitágoras como o ponto ideal já revelado pela própria natureza, para todos os fatos, inclusive os do homem, a harmonia.
A harmonia é uma resultante do ajustamento de aspectos opostos. A harmonia só pode dar-se onde há oposições qualitativas. Dois iguais não se harmonizam, apenas se ajuntam. Para dar-se a harmonia é necessário que exista a diferença, a distinção.
0 nosso universo compõe-se de unidades diferentes e, quando elas se ajustam entre si, realizam a harmonia.
Na estética, propunha ele, não devíamos procurar apenas a harmonia da simetria, mas a harmonia dos opostos, em movimento (chiasma) e foi, através deste grande pensamento, que a arte grega, ao realizá-lo, conseguiu criar algo de novo no campo da estética, o que veio colaborar eficientemente para a eclosão do chamado “milagre grego.”
Observou Pitágoras, estudando a harmonia, que obedecidas certas relações, ela se verificava. Essas relações constituem os chamados “números de ouro”, de um papel importante em todas as artes e em seus períodos superiores.
Dessa forma, é a harmonia o ideal máximo dos pitagóricos, a qual consiste em ajustar os elementos diversos da natureza.
O arithmós é também harmonia.
Verificou Pitágoras que certas combinações obedientes a certos números, e em certas circunstâncias, são mais valiosas do que outras.
Desta forma os números são também valores, porque nos revelam valores, por possuírem eles, quando realizados, um poder capaz de efetuar algo benéfico ou maléfico.
Como os valores tanto podem ser positivos como opositivos, e como através dos números realizamos e atualizamos poderes imensos, como se vê na alavanca, cujos números permitem o aumento de forças, os números são também mágicos, cuja palavra encerra sempre a idéia de um poder maior que se pode despertar.
- Numero Pitagoras – A CONCEPÇÃO DO NÚMERO EM PITÁGORAS