GMarcel1967
Uma observação preliminar parece impor-se aqui: na verdade, é o espetáculo da caducidade dos seres individuais que pode incitar o pensamento, por uma espécie de extrapolação temerária, a passar ao limite e proclamar que o ser não é, ou seja, que não há nada que possa ser afirmado como indestrutível ou eterno. Nessa perspectiva, não se poderia, portanto, manter a realidade dos seres individuais; é ela, ao contrário, que é primeiramente negada e como que engolida. Mas a questão é saber se é legítimo partir assim da não-realidade dos seres individuais.
Pergunta-se se essa posição inicial não implica um postulado que a reflexão é obrigada a explicitar. Esse postulado poderia, em suma, ser formulado da seguinte maneira: o que perece visivelmente participa da natureza das sombras e das nuvens; ora, estas não podem ser senão aparências, aparências na superfície de… Mas de quê? Será preciso admitir que não passam de modalidades efêmeras e ilusórias de uma realidade da qual, ao contrário, somos obrigados a proclamar o caráter substancial? Aqui, vê-se, contrariamente ao que parecíamos chamados a afirmar há pouco, a não-realidade dos seres individuais teria como contrapartida a realidade do ser em si. Mas é fácil perceber que o pensamento está de certo modo condenado a oscilar indefinidamente entre essas duas interpretações que, em última análise, talvez só sejam distintas nominalmente. Quero dizer com isso que o que, num caso, é tratado como ser pode [76] muito bem ser qualificado como não-ser. Isso se verifica, aliás, em muitos místicos e filósofos e, para tomar um exemplo bem contemporâneo, alguns comentadores de Heidegger puderam afirmar, com certa aparência de razão, que o que ele hoje chama “o ser” assemelha-se estranhamente ao que, em seus primeiros escritos, ele chamava de “o nada”. Sem assumir completamente essa observação, que guarda um caráter um tanto arriscado, direi pelo menos que essa hesitação provavelmente se deve a uma maneira bastante defeituosa de colocar o problema – teremos, sem dúvida, que compreendê-lo cada vez mais claramente.
O sentido da palavra “perecer”, quando se trata de um ser individual apreendido em sua qualidade de ser – ou seja, amado, pois essa designação não é separável do ato de amor –, esse sentido, repito, está longe de ser claro; é preciso ir além: há fortes razões para pensar que, aqui, esse verbo não pode de modo algum ser empregado se designa o fato de uma nuvem se dissipar ou de uma chama se extinguir. Esses são processos físicos suscetíveis de serem descritos na linguagem do conhecimento objetivo, mas que não podem intervir na ordem ontológica, se é verdade, como não cessamos de repetir desde o início desta segunda série, que o ontológico está ligado à intersubjetividade.