Wunenburger2016
A estética ocidental das imagens visuais é dominada pelo paradigma da “mimese”, que subordina a beleza da representação – a produção manual humana de uma obra visível – à fidelidade ao modelo, à sua semelhança perfeita ou aproximada. A arte teria como função duplicar e multiplicar a representação do belo em si. Cada obra seria um desdobramento homólogo ou análogo de seu modelo para torná-lo acessível a uma pluralidade de olhares espectadores. Esse pensamento da imitação da natureza pela arte, em sentido estrito ou amplo, conduziu a uma doxologia estereotipada, frequentemente muito acadêmica, mesmo quando as práticas efetivas a desmentiam em grande parte. A busca do trompe-l’oeil pelos pintores, desde a antiguidade, serve nesse sentido tanto como ápice do gesto artístico engenhoso quanto como momento de sua abolição, pois a semelhança total faz desaparecer os próprios traços de uma nova criação. Na verdade, toda criação é menos repetição que variação, diferença, dessemelhança.
Hoje estamos habituados a matizar e pluralizar a ideia e o termo de “mimese” e imitação, incorporando a dimensão irredutível da diferença. A imitação artística já não é pensada como submissão ao Mesmo, mas como diferentes modos de representação, encenações de uma alteração. Mas talvez seja necessário ir ainda mais longe e desconstruir esse mito artístico, libertando a imagem da questão da semelhança com o modelo. Muitas abordagens contemporâneas, chamadas de desconstrução, não cessaram de promover o fim da transcendência dos modelos, a primazia das cópias e dos simulacros, numa espécie de inversão do platonismo. E, de fato, os próprios artistas talvez nunca tenham feito outra coisa senão deformar, transformar, metamorfosear pela imaginação a imagem perfeita ideal, assombrada pela semelhança.
O desejo da imagem artística se expressa, na verdade, por um certo iconoclasmo, entendido como distanciamento da imagem em relação ao modelo, por meio de procedimentos como estilização, tipificação, simbolização, mas também como aceitação ou mesmo busca, na obra, de uma falta, uma ausência, um desvio, uma morte – não para enfraquecer a imagem da obra de arte, mas, ao contrário, para conferir a essa alteração assumida as possibilidades de dar lugar, de dar vida a uma obra que funcione como realidade própria, até mesmo como super-realidade. Pois para que serviria duplicar o mundo sem renová-lo? Como dar corpo a um mundo em imagens que possa coexistir com o mundo tido como referente – ou mesmo competir com ele?
Mas, para abrir espaço a essa estética da diferença, será necessário, como faz a filosofia da desconstrução pós-moderna, sacrificar a essencialidade do belo, a substancialidade do referente invisível, e agir como se a obra dispusesse de uma autossuficiência autárquica e surgisse como pura imanência? Não seria possível encontrar outros caminhos, alimentados pela fenomenologia e pela hermenêutica, para pensar uma ontologia da imagem poética, capaz de introduzir uma negatividade na ontologia da imitação que não seja emancipação ou abolição de toda transcendência invisível?