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Argumentações normalmente seguem padrões; isto é, há certas coisas que nós usualmente fazemos quando argumentamos e outras que não fazemos. O fato de que, pelo menos em parte, conceitualizamos sistematicamente argumentos em termos de batalha influencia tanto a forma que os argumentos tomam, quanto a maneira como falamos sobre o que fazemos quando argumentamos. Porque o conceito metafórico é sistemático, a linguagem usada para falarmos sobre aquele aspecto do conceito é sistemática.
Vimos, por meio da metáfora ARGUMENTAÇÃO É GUERRA, que expressões provenientes do vocabulário de guerra, como, por exemplo, atacar uma posição, indefensável, estratégia, nova linha de ataque, vencer, ganhar terreno etc., formam uma maneira sistemática de expressar os aspectos bélicos do ato de argumentar. Não é por acaso que tais expressões significam o que significam quando as usamos para falarmos sobre a argumentação. Uma parcela da rede conceitual de guerra caracteriza parcialmente o conceito de argumentação, e a língua segue essa caracterização. Uma vez que expressões metafóricas em nossa língua são ligadas a conceitos metafóricos de uma maneira sistemática, podemos usar expressões metafóricas linguísticas para estudar a natureza de conceitos metafóricos e, dessa forma, compreender a natureza metafórica de nossas atividades.
Para se ter uma ideia de como expressões metafóricas na linguagem cotidiana podem iluminar a natureza metafórica dos conceitos que estruturam nossas atividades cotidianas, examinemos como o conceito TEMPO É DINHEIRO manifesta-se no português (inglês) contemporâneo.
Você está desperdiçando meu tempo. Você está me fazendo perder tempo. (You are wasting my time.)
Esta coisa (engenhosa) vai te poupar horas. (This gadget will save you hours.)
Eu não tenho tempo para te dar. / Eu não tenho tempo para você. (I don’t have the time to give you.)
Como você gasta seu tempo hoje em dia. Como você usa o seu tempo hoje em dia? (How do you spend your time these days?)
Aquele pneu furado me custou uma hora. / Aquele pneu furado me tomou uma hora. (That flat tire cost me an hour.)
Tenho investido muito tempo nela. (I’ve invested a lot of time in her.)
Eu não tenho tempo para perder com isto. (I don’t have enough time to spare with this.)
O seu tempo está se esgotando. (You’re running out of lime.)
Você deve calcular bem o seu tempo. Você deve administrar bem o seu tempo. (You need to budget your time.)
Reserve algum tempo para o pingue-pongue. (Put aside some time for ping-pong.)
Isso vale o seu tempo?/ Isso vale a pena? (Is that worth you while!)
Você tem muito tempo disponível! (Do you have much time left!)
Ele está vivendo com tempo emprestado. / Ele está vivendo de gorjeta. (He’s living on borrowed time.)
Você não usa seu tempo lucrativamente. Você não aproveita bem o seu tempo. (You don’t use your time profitably.)
Eu perdi muito tempo quando fiquei doente. (I lost a lot of time when I got sick.)
Obrigado pelo seu tempo./ Obrigado pelo tempo dispensado. (Thank you for your time.)
Tempo em nossa cultura é um bem valioso. É um recurso limitado que usamos para alcançar nossos objetivos. Devido à forma pela qual o conceito de trabalho se desenvolveu na cultura ocidental moderna, em que o trabalho é normalmente associado ao tempo que toma, e ele é quantificado com precisão, tornou-se hábito pagar as pessoas pela hora, semana, mês ou ano. Em nossa cultura, TEMPO É DINHEIRO de muitas formas: unidades de chamadas telefônicas, pagamento por hora, taxas diárias de hotel, orçamentos anuais, juros sobre empréstimos e pagamento de dívida para com a sociedade através do “tempo de serviço”. Essas práticas são relativamente novas na história da humanidade e não existem em todas as culturas. Elas surgiram nas modernas sociedades industrializadas e estruturam profundamente nossas atividades cotidianas básicas. Pelo fato de que agimos como se o tempo fosse um bem valioso – um recurso limitado, como o dinheiro – nós o concebemos dessa forma. Logo, compreendemos e experienciamos o tempo como algo que pode ser gasto, desperdiçado, orçado, bem ou mal investido, poupado ou liquidado.
TEMPO É DINHEIRO, TEMPO É UM RECURSO LIMITADO e TEMPO É UM BEM VALIOSO são todos conceitos metafóricos. Eles são metafóricos uma vez que estamos usando nossas experiências cotidianas com dinheiro, com recursos limitados e bens valiosos para conceitualizar o tempo. Essa maneira de conceber o tempo não se impõe de forma alguma como uma necessidade a todos os seres humanos; ela está ligada à nossa cultura. Há culturas em que o tempo não é pensado desse modo.
Os conceitos metafóricos TEMPO É DINHEIRO, TEMPO É UM RECURSO e TEMPO É UM BEM VALIOSO formam um único sistema baseado em subcategorização, uma vez que, na nossa sociedade, o dinheiro é um recurso limitado, e recursos limitados são bens valiosos. Essas relações de subcategorização caracterizam relações de implicação entre as metáforas. TEMPO É DINHEIRO implica TEMPO É UM RECURSO LIMITADO, que, por sua vez, implica TEMPO É UM BEM VALIOSO.
Estamos adotando a prática de usar o conceito metafórico mais específico, neste caso, TEMPO É DINHEIRO, para caracterizar o sistema como um todo. Entre as expressões listadas acima, referentes à metáfora TEMPO É DINHEIRO, algumas se referem especificamente a dinheiro (gastar; investir, orçar, lucrar, custar), outras a recursos limitados (usar, esgotar, ter suficiente de, usar tudo), e outras ainda a bens valiosos (ter, dar, perder, agradecer pelo bem recebido). Esse é um exemplo de como as implicações metafóricas podem caracterizar um sistema coerente de conceitos metafóricos e um sistema coerente de expressões metafóricas correspondente a esses conceitos.