(CamusMS)
Examinarei apenas o tema da “intenção”, que virou moda com Husserl e os fenomenólogos. Já o mencionamos aqui. Originariamente, o método husserliano nega o procedimento clássico da razão. Vamos repetir. Pensar não é unificar, tornar familiar a aparência sob a fisionomia de um grande princípio. Pensar é reaprender a ver, dirigir a consciência, fazer de cada imagem um lugar privilegiado. Em outras palavras, a fenomenologia se recusa a explicar o mundo: quer apenas ser uma descrição do vivido. Ela se encontra com o pensamento absurdo em sua afirmação inicial de que não existe a verdade, mas somente verdades. Desde o vento da tarde até essa mão sobre o meu ombro, cada coisa tem a sua verdade. É a consciência que a aclara, pela atenção que lhe presta. A consciência não forma o objeto de seu conhecimento, ela somente o fixa, ela é o ato de atenção e, para retomar uma imagem bergsoniana, se assemelha ao aparelho de projeção que se fixa subitamente sobre uma imagem. A diferença é que não há cenário, mas uma ilustração sucessiva e inconsequente. Nessa lanterna mágica, todas as imagens são privilegiadas. A consciência mantém sob suspeita, na experiência, os objetos de sua atenção. Graças ao seu milagre, ela os isola. Eles se veem desde então fora de todos os julgamentos. É essa “intenção” que caracteriza a consciência. Mas a palavra não envolve nenhuma ideia de finalidade. É usada no sentido de “direção”: só tem valor topográfico.
À primeira vista, fica parecendo que nada disso contraria o espírito absurdo. Essa aparente modéstia do pensamento que se limita a descrever e que se recusa a explicar, essa disciplina voluntária de que procede, paradoxalmente, o enriquecimento profundo da experiência e o renascimento do mundo em sua prolixidade, eis que temos aí procedimentos absurdos. Pelo menos à primeira vista. Pois os métodos de pensamento, neste caso como em outros, se revestem sempre de dois aspectos, um psicológico e o outro metafísico. Por isso eles escondem duas verdades. Se o tema da intencionalidade só pretende ilustrar uma atitude psicológica pela qual o real seria esgotado em vez de ser explicado, nada o separa, de fato, do espírito absurdo. Ele se dispõe a arrolar o que não pode transcender. Afirma apenas que, na ausência de todo princípio de unidade, o pensamento ainda pode encontrar sua alegria em descrever e em compreender em cada face da experiência. A verdade de que se trata, então, para cada uma dessas faces, é de ordem psicológica. Apenas testemunha o “interesse” que a realidade pode apresentar. É um modo de despertar um mundo sonolento e de trazê-lo vivo ao espírito. Mas, se quisermos estender e fundamentar racionalmente essa noção de verdade, se pretendermos descobrir assim a “essência” de cada objeto do conhecimento, restituímos sua profundidade à experiência. Para um espírito absurdo, isso é incompreensível. Ora, é essa oscilação da modéstia à segurança que é sensível na atitude intencional e esse reflexo do pensamento fenomenológico ilustrará melhor do que qualquer outra coisa o raciocínio absurdo.
Porque Husserl fala também de “essências extratemporais” que a intenção atualiza e se tem a impressão de ouvir Platão. Não se explicam todas as coisas por uma só, mas por todas. Não vejo aí diferença. Certamente, essas ideias ou essências que a consciência “efetua” ao fim de cada descrição ainda não se pretende que sejam modelos perfeitos. Mas afirma-se que elas estão diretamente presentes em todo dado da percepção. Não há mais uma única ideia que explique tudo, mas uma infinidade de essências que dão um sentido a um infinidade de objetos. O mundo se imobiliza, mas se esclarece. O realismo platônico se torna intuitivo, mas ainda é realismo. Kierkegaard mergulhava no seu Deus, Parmênides precipitava o pensamento no Um. Mas aqui o pensamento se lança em um politeísmo abstrato. E mais: as alucinações e as ficções fazem igualmente parte das “essências extratemporais”. No novo mundo das ideias a categoria de centauro colabora com aquela, bem mais modesta, de metropolitano.