Byung-Chul Han (2023) – A Terra não é nenhum “recurso”

Em vista das ameaçadoras catástrofes naturais, a “proteção ao meio ambiente” é um conceito muito precário. É necessária uma relação radicalmente transformada com a natureza. A Terra não é nenhum “recurso” com que teríamos de lidar de modo mais “sustentável”. Antes, temos de assimilar o significado originário de preservar. Heidegger o compreende novamente a partir da inatividade, do deixar-ser: “O verdadeiro preservar […] ocorre quando retornamos algo à sua própria essência […]. O traço fundamental do habitar é esse preservar” (GA7:143). Em alemão, a palavra preservar, schonen, é derivada da palavra belo, schön. O preservar se refere ao belo. A Terra é bela. Dela parte o imperativo de preservá-la, de devolver-lhe sua dignidade.

Sem dúvida, uma ação decidida é necessária a fim de suspender as consequências catastróficas da intervenção humana na natureza. Mas, se a causa desse mal ameaçador foi o agir humano absolutamente estabelecido que se apoderou sem nenhuma consideração da Terra e a explorou, então é preciso empreender uma correção na própria ação humana. Por isso, é necessário elevar a parte contemplativa da ação; ou seja, cuidar para aprimorar a ação com a reflexão.

A obrigação de atividade, produção e desempenho leva à falta de ar. O ser humano se sufoca em seu próprio fazer. Só na reflexão as coisas se tornam “espaçosas, arejadas em torno do ser humano” (GA52:75). Nos Cadernos negros de Heidegger, encontra-se um dito muito digno de nota: “O ser é o éter no qual o ser humano respira, sem o qual ele seria rebaixado a mero gado e todo seu fazer seria degradado a uma simples criação de gado” (GA94:232). Heidegger formula, aqui, uma biopolítica da historicidade do ser. O esquecimento do ser, como reflexão faltante, tira-nos a respiração. Ele degrada o ser humano a um animal laborans. Dessa perspectiva, a inatividade ganha um significado político. A política da reflexão tem de abolir aquelas coações que adestram o ser humano de modo a torná-lo um animal útil e de trabalho.

O jovem Heidegger é, como Arendt, animado por um pathos da ação. Para ele, a inatividade contemplativa ainda é completamente estranha. Ele descobre, de fato, o “estar-lançado” da existência humana, mas é ofuscado pela “determinação” para a ação. Também disposições como medo ou tédio, que, na verdade, inibem a ação, são interpretadas por ele como convocações ao agir. A assim chamada “virada”, na qual ele se distancia de seu pensamento de juventude, marca a passagem do agir para o ser. (ByungVC)