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hebreu / hebraico / hebrew

  

Elias Lipiner

O alfabeto hebraico é constituído, em regra, exclusivamente de consoantes. Para substituir as vogais das línguas modernas ajuntam-se às letras, em variadas posições, certos sinais chamados pontos vocálicos ou massoréticos, com o auxílio dos quais se forma a leitura e o sentido estável das palavras. Os textos hebraicos antigos, porém, e particularmente os canonizados, apresentam-se sem ostentar graficamente os pontos vocálicos, que são uma invenção técnica posterior. Tal ausência originária, tornou-os suscetíveis de apresentar um grande número de variedades semânticas, dando margem às mais variadas e estranhas interpretações, correspondentes às alternadas e arbitrárias formas de sua leitura.

Deve ter sido essa porta aberta para a arbitrariedade que sugeriu aos exegetas a possibilidade das mais variadas formas de leitura de um mesmo texto. Primeiro, porque o ajuntamento mental das vogais arbitrariamente feito dá ensejo a alterações relativas do significado do texto; e, segundo, porque, de maneira mais ampla, a consideração do texto independentemente das palavras cm que é dividido dá ensejo ao agrupamento e reagrupamento das letras de um mesmo texto em palavras que formam significados diferentes, ou mesmo contraditórios.

Face a tal emaranhado de vocábulos, sem separação entre eles e sem pontuação, à maneira do que sucedia em manuscritos de escribas e copistas da antiguidade, abrem-se novas perspectivas mentais ao pensamento utópico. Isto é devido à alternativa surgida para livrar-se do absolutismo teológico imposto pela interpretação literal da Lei canonizada. Vencido aos poucos o excessivo apego dos exegetas à leitura tradicionalista do texto sinaíta, suspende-se gradativamente o véu sutil sobre ele deitado, para a penetração cada vez mais ousada além do sentido literal. E, o que é mais importante: através da nova alternativa insinuam-se sutilmente a afinidade e a analogia reveladas entre um texto cujo sentido é imposto por seus pontos vocálicos e a ordem mundial vigente, na qual o homem se sente acorrentado a um sistema legal de restrições e proibições.

Essa surpreendente teoria da relatividade alfabética, criada, ou admitida e desenvolvida pelo autor do Livro da Imagem, permitiu-lhe ir muito além do texto tradicional, fingindo revelar segredos captados nos seus estratos profundos.

Além da aludida possibilidade semântica de interpretar o texto mediante a recomposição das letras que o formam, reescrevendo-se e refazendo-se o seu conteúdo, existe ainda a semântica de cada signo gráfico tomado isoladamente. As próprias letras do alfabeto, nas suas figuras em geral, bem como nos detalhes da composição geométrica destas últimas por ângulos, linhas e pontos, têm ensinamentos esotéricos cifrados. Cada uma é tomada como unidade metafísica, como partícula de divindade, admitindo variadas e aprofundadas interpretações de acordo com o lugar que ocupa na hierarquia alfabética, com sua estrutura geométrica e outros detalhes desta categoria. ["As letras do Alfabeto na criação do mundo"]