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Evangelho de Marcos / EsMc / Markos / Mk / Mc

  

Miller

Segundo a análise empreendida no notável trabalho de Robert J. Miller, THE COMPLETE GOSPELS, dentro do projeto «SCHOLARS VERSION», o Evangelho de Marcos apresenta um relato vívido e poderoso da estória de Jesus. Logo de início vemos Jesus emergir no cenário público, batizado e vitorioso sobre Satã, mestre no entanto misterioso. Um defensor relutante dos doentes e dos possuídos pelos demônios, Jesus sustenta uma batalha contra os espíritos impuros alinhados contra ele e sua causa, «o império de Deus». Multidões são atraídas para seus feitos, formando coros de curiosos, por vezes simpáticos, mas frequentemente ameaçadores. O que atrai estas multidões é o sucesso rápido de Jesus como um curador pela fé e um exorcista extraordinário; logo, entretanto, Jesus vai confrontar estas multidões com um discurso estranho que tem muito a dizer.

O Evangelho de Marcos é geralmente considerado o evangelho escrito mais antigo. O documento ele mesmo não menciona seu autor, nem o lugar, tempo ou circunstâncias de sua origem, mas escolásticos inferiram que o evangelho foi composto nos tempos da Guerra romano-judaica (66-70), provavelmente na Síria que falava a língua grega então. As tentativas de conexão do autor anônimo com diferentes «Marcos» não passam de conjecturas sem provas.

Se Marcos é o primeiro dos evangelhos  , seus predecessores não seriam evangelistas, mas contadores de estórias, profetas, mestres, missionários ou organizadores de comunidades, que passaram memórias e estórias de Jesus. Marcos usou várias fontes para sua narrativa, provavelmente a crescente narrativa oral. É impossível até o momento identificas as fontes de Marcos.

A composição é vívida e usa um estilo de estória oral direta. O grego empregado é a língua informal de pessoas ordinárias da cultura mediterrânea no século I. Tudo no relato de Marcos parece acontecer «imediatamente» ou «logo», tradução do termo grego euthus, muito repetido em Marcos. Marcos gosta de usar o verbo no presente mesmo descrevendo eventos passados, dando mais vida as estórias, ao mesmo tempo um tom não culto. Muitas sentenças em Marcos começam com a palavra «E». Os detalhes das estórias são postergados até que seu relato esteja mais adiantado, afirmando assim o estilo oral, característico deste evangelho.

Durante a cópia e recópia deste evangelho, os escribas cristãos introduziram algumas grandes expansões no texto, sendo a mais famosa ao final da estória, falando das aparições de Jesus ressuscitado. A descoberta contestada, feita por Morton Smith, de uma correspondência de Clemente de Alexandria  , indicou a existência de uma versão alternativa de Marcos, que Clemente chama «Marcos mais espiritual» ou «Marcos místico».

Roberto Pla

O predomínio do oculto não é o habitual em Marcos e Mateus  , pois seus evangelhos, como ocorre com a maior parte dos escritos neo-testamentários que foram admitidos no cânon, costumam manter um bom equilíbrio na expressão simultânea das duas vertentes oculta e manifesta. Por isto, hoje em dia, depois de quase vinte séculos de leitura manifesta, não resulta fácil descobrir o “sinal” que permita estudar a exegese oculta.

É seguro que a obtenção de um equilíbrio expositivo segundo as vertentes manifesta e oculta exigiu dos primeiros autores cristãos a prática de uma consumada ciência hermenêutica, dificuldade que salvaram apoiados na tradição vetero-testamentária. Isto explica o elogio que o ancião Papias fez de Marcos ao dizer dele que foi um cuidadoso “hermeneuta” de Pedro.

Tal notícia demonstra que não se limitou Marcos a pôr por escrito as memórias de Pedro, senão que ademais, as “interpretou”, sem que isso significasse “descuido” ou “engano”. A bondade da interpretação supõe neste caso a capacidade de conciliar no relato evangélico a Sentido oculto - dupla vertente oculta e manifesta, parelhas e sem faltar à verdade em nenhum de seus lados. [breve 6750]