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Padres do Deserto / Pères du désert / Fathers of the Desert / Paradise of the Fathers

  

VIDE: FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DOS APOTEGMAS DOS PADRES DO DESERTO (PDF)

Jean Gouillard

A Philokalia   acolheu, além das "Exortações" do pseudo-Antão, o relato "muito útil" de um abade Filemão, que se buscaria em vão nas crônicas do deserto. O documento porta os sinais de fabricação e parece situar-se entre a era dos grandes Sinaítas e o renascimento hesicasta do século XIV. Imaginado para realçar a hesíquia e a oração de Jesus, ele é, por outro lado, negligenciável. O Thesaurus do Padre Poussines (Toulouse, 1684), que deriva de uma espécie de Philokalia avant la lettre, produziu outras peças inspiradas na mesma pia fraus, notadamente uma carta do pseudo-Crisóstomo sobre a oração de Jesus (P.G. t. 60, cc. 751s.) e diversos apotegmas.

Para não trair o espírito da Philokalia e sem tampouco desafiar demais a história, simplesmente extraímos na coleção Cotelier (P.G. t. 65, cc. 71s) alguns apotegmas traduzindo, com bastante fidelidade, a inspiração do deserto e atraindo os temas da futura oração do coração: solidão interior e exterior, sobriedade e vigilância, oração ininterrupta, lugar de Jesus... Acrescentam-se alguns textos que acompanham na P.G. t. 40, c. 1275, os Oito maus pensamentos de Evágrio. Vários, cuja antiguidade é certa, encontram-se em diferentes autores da Philokalia. Dois apotegmas pseudepigráficos da coleção Poussines fecham essa curta lista. [Seleção de Gouillard em Ecclesia

Marie Madeleine Davy

Foram os Padres do deserto que restabeleceram a ligação com o deserto bíblico, sofrendo contudo — não se poderia negar — a influência da filosofia grega, como sofreram também os Padres da Igreja. Os Padres do deserto são os precursores — no cristianismo — dos homens apaixonados pelo Absoluto que escolhem fugir do mundo a fim de pertencerem e se dedicarem somente a Deus, no silêncio da mente e do coração. Foi assim que os filhos do deserto se consagraram à hesychia, feita de silêncio, de quietude e de disponibilidade interior na solidão,

A necessidade de silêncio se afirma num contexto determinado. Mesmo o solitário não poderia escapar à história de seu tempo. Ora, a época dos Padres do deserto é significativa. Em 325, com o batismo do imperador Constantino, parecia esboçar-se um Estado pseudocristão ". Era uma ilusão! A verdadeira sociedade cristã não pertence ao terrestre; celeste por natureza, ela se refere ao corpo místico de Cristo. Fugir de um Estado que se considerava cristão, era maneira de recusar a idolatria. Por outro lado, o Egito era agitado por controvérsias religiosas e efervescência intelectual que continuavam as gnoses e os diversos movimentos saídos do neoplatonismo  , do pitagorismo e até do estoicismo. A tudo isso juntavam-se as correntes julgadas heterodoxas e heréticas que se defrontavam, contendiam e se combatiam. O ruído dos gritos e vociferações e a necessidade de justificar as próprias opções constituíam tumulto para os ouvidos dos silenciosos. Era, pois, aconselhável retirar-se do mundo, não só dos negócios e dos compromissos, da riqueza e do instalar-se na existência, mas também das discussões teológicas e filosóficas e dos embates intelectuais.

Os Padres do deserto nascidos no Oriente sentiam-se impelidos para as regiões desertas e também para as montanhas do Egito, da Palestina, da Síria e da Ásia Menor. Antão do Egito, nascido pelo ano 250, foi o pai dos eremitas, o modelo dos solitários e dos silenciosos que amavam o deserto, tanto do Oriente, como do Ocidente. A sua vida, escrita por Atanásio, bispo de Alexandria [1], segundo os procedimentos hagiográficos da época e traduzido várias vezes para o latim, estimulou as vocações ao eremitismo. Antão viveu primeiro num túmulo; depois procurava lugares sempre mais isolados, até o dia em que ouviu uma voz dizer-lhe que entrasse no deserto interior. Taumaturgo, pai espiritual, curava os corpos e as almas. Como a anacorese é favorável à saúde, morreu com mais de cem anos. [Excertos do livro "O Deserto Interior"]


Coletâneas e comentários na Internet:

[1Santo Atanásio, Vie et conduite de notre Père saint Antoine, trad. francesa de P. Benoit Lavaud, Ed. de Bellefontaine (col. Spiritualité orientale, n° 38), 1970.