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Popper

  

SIR KARL RAIMUND POPPER (1902-1994)

Karl Popper, que vimos Imre Lakatos qualificar como racionalista - em contraste com Kuhn   -, cedo se singularizou ao afirmar que é inútil buscar critérios da verdade científica, porque não existem critérios da verdade:

"[...] a ausência de um critério da verdade não torna a noção de verdade insignificante, assim como a ausência de um critério da saúde não torna insignificante a noção de saúde. Um homem doente pode buscar a saúde mesmo que dela não possua o critério. Um homem que erra pode buscar a verdade mesmo que dela não possua o critério." (Popper, A sociedade aberta..., v. 2, Add.l)

Os popperianos têm em comum o caráter corrosivo e, frequentemente, provocante de suas intervenções em filosofia da ciência e, ao mesmo tempo, a necessidade em que se viram de filosofar em uma língua (o inglês) diferente de sua língua materna. São libertários porque pensam que a obrigação cardeal do pesquisador é usar sua liberdade intelectual; são moralistas porque fazem disso uma obrigação. Lakatos representa assim a posição popperiana:

"O que distingue Popper é, essencialmente, que ele apreendeu tudo o que implica o desabamento da teoria científica mais bem corroborada de todos os tempos: a mecânica e a teoria da gravitação de Newton. Para Popper, a virtude não consiste na atenção prestada para evitar erros, mas na determinação brutal com que estes são eliminados. Audácia das conjecturas, por um lado, austeridade das refutações, por outro: essa é sua receita. A honestidade intelectual não consiste em tentar entrincheirar-se em sua posição ou em assentá-la, provando-a (ou "probabilizando-a"); ela consiste, ao contrário, em especificar com precisão em que condições aceitaríamos abandoná-la. Os marxistas ou os freudianos engajados se recusam a especificar tais condições: isso marca sua desonestidade intelectual. Talvez a crença (beliej) seja uma fraqueza biológica, infelizmente inevitável, a ser mantida sob o controle da crítica: mas, para Popper, o compromisso (commitment) é um verdadeiro crime." (Lakatos, The Methodology..., I, § 1, "Science: Reason or Religion")

O falibilismo popperiano é a tese de que "todas as proposições das ciências são teóricas e incuravelmente falíveis" (Lakatos, 1986, § 2), de que elas não podem ser nem provadas nem refutadas de maneira conclusiva. Lakatos entreteve-se fazendo a distinção entre três Popper: o Popper0 seria uma invenção de Ayer, o Popper1 seria um refutacionista (ou "falsificacionista") ingênuo, o Popper2 seria um refutacionista sofisticado, o "verdadeiro" Popper seria uma mistura de 1 e 2 (ibid., p. 134). Vimos que, para Popper, a história da ciência não é, como em Kuhn, a história de algumas revoluções teóricas entre longos períodos de ciência normal: é a revolução permanente. A tarefa da comunidade científica é inventar conjecturas - os programas de pesquisa têm um interesse heurístico - e suprimir entre essas conjecturas as que não resistem à prova dos fatos. Por um lado como por outro ela dá prova de liberdade: liberdade positiva (criadora) na produção de hipóteses, liberdade-independência (desprendimento) no abandono das hipóteses errôneas. [Daniel Andler, Anne Fagot-Largeault e Bertrand Saint-Sernin, Filosofia da Ciência]

LÉXICO DE FILOSOFIA

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CITAÇÕES

... não importa quantos exemplos de cisnes brancos possamos ter observado, isso não justifica a conclusão de que todos os cisnes são brancos.

... A resposta para esse problema é: como implícito por Hume  , certamente não somos justificados em raciocinar de uma instância para a verdade da lei correspondente. Mas, para esse resultado negativo, um segundo resultado, igualmente negativo, pode ser acrescentado: somos justificados ao raciocinar de uma contra-instância à falsidade da lei universal correspondente (ou seja, de qualquer lei da qual seja uma contra-instância). Ou, em outras palavras, de um ponto de vista puramente lógico, a aceitação de uma contra-instância a "Todos os cisnes são brancos" implica a falsidade da lei "Todos os cisnes são brancos" - essa lei, ou seja, cuja contra-instância aceitamos. A indução é logicamente inválida; mas refutação ou falsificação é uma maneira logicamente válida de argumentar de uma única contra-instância para - ou melhor, contra - a lei correspondente. Isso mostra que continuo concordando com o resultado lógico negativo de Hume; mas estendo-o. Essa situação lógica é completamente independente de qualquer questão de, na prática, aceitarmos uma única contra-instância - por exemplo, um cisne negro solitário - em refutação de uma lei até agora altamente bem-sucedida. Não sugiro que ficaríamos necessariamente tão facilmente satisfeitos; podemos muito bem suspeitar que o espécime preto diante de nós não era um cisne ". (The Logic of Scientific Discovery, Ch. 1 "A Survey of Some Fundamental Problems", Section I: The Problem of Induction p. 27)

Sempre que uma teoria lhe parecer a única possível, tome isso como um sinal de que você não entendeu a teoria nem o problema que ela pretendia resolver. (Conhecimento Objetivo)

Nenhum argumento racional terá um efeito racional sobre um homem que não deseja adotar uma atitude racional. (Open Society and its Enemies, Vol. 2, Ch. 24 "Oracular Philosophy and the Revolt against Reason")

... a tentativa de fazer o céu na terra invariavelmente produz inferno. Isso leva à intolerância. Isso leva a guerras religiosas e à salvação de almas através da inquisição. E acredito, é baseado em um completo mal-entendido de nossos deveres morais. É nosso dever ajudar aqueles que precisam de ajuda; mas não é nosso dever fazer os outros felizes, pois isso não depende de nós e, com muita frequência, significaria invasão da privacidade daqueles em relação aos quais temos intenções tão amáveis. (ibid.)

Não há história da humanidade, há apenas um número indefinido de histórias de todos os tipos de aspectos da vida humana. E uma delas é a história do poder político. Isso é elevado à história do mundo. Mas isso, eu sustento, é uma ofensa contra toda concepção decente da humanidade. É dificilmente melhor do que tratar a história de fraude ou assalto ou envenenamento como história da humanidade. Para a história do poder, a política nada mais é do que a história do crime internacional e do assassinato em massa (inclusive é verdade, algumas das tentativas de suprimi-los). Essa história é ensinada nas escolas e alguns dos maiores criminosos são louvados como heróis. (Open Society and its Enemies, Vol 2, Ch. 25 "Has History any Meaning?")