Reconhecida, porém, a dificuldade subjacente a este processo de geração (γίγνεσθαι) que faz nascer a característica de «aptidão» no humano, não se pode excluir essa possibilidade. É possível, de fato, passar bem. Isto é, é possível deixar correr a vida que, resvalando, nos leva no seu curso mais ou menos desimpedido, que permite ser e estar de um modo bom. O ser humano pode, de fato, vir a estar sob a ação eficaz deste bem possibilitante (ἀγαθόν), «pelo menos por um determinado período de tempo» [Prot., 344b8]. O bem possibilitante (ἀγαθόν) traz à expressão a condição de possibilidade de dispormos da própria vida, de tal sorte que podemos enraizarmo-nos nela com segurança, quando se passa por um momento de boa qualidade de vida. Durante esse momento, parece-nos que podemos usufruir plenamente da vida, dispor dela, ter poder sobre ela. Ao longo de um dia, ou ao longo da nossa vida, podemos experimentar o passar a ser dessa disposição. Um encontro entre amigos que há já muito não se viam, a experiência, mesmo que só passageira, de um sucesso, a calma da manhã de um dia de Verão, a saúde e a força máxima com que se experimenta o próprio corpo, tudo isso produz a geração (γένεσις) de uma aptidão que irradia por toda a vida e nos faz passar por um bom momento. O que é difícil, no entanto, é «permanecer nessa disposição». Isto é, ficar sempre sob ação da presença desse bem que extravasa para além do tempo momentâneo em que ele demora a [138] surgir «é impossível e inumano» [1], sujeito que está às mais diversas circunstâncias que lhe podem ser adversas [Prot., 344c4]. [CaeiroArete:138-139]