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complementaridade

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

43. Esforçamo-nos por mostrar que «diabólico» e «simbólico», como promotores de separação e união, são termos bastante sugestivos do que sucede quando se passa de um para outro horizonte, mas não tanto quanto a «complementaridade», para descrever ou simplesmente aludir ao que a ambos une ao Além-Horizonte Extremo, deixando intacto e intangível o Separado ou o Absoluto e Secreto. A complementaridade dizia: qualquer dualidade, aquém-horizonte, não se reduz a insuperável e irremediável dualismo, pois, no Além-Horizonte, está o vértice do triângulo, cuja base é o próprio binário de termos contrários e contraditórios, aquém-horizonte. Nesse vértice, eles coincidem. Mas, como o Além-Horizonte sempre, de algum modo, sugere o além-vida, corríamos o risco de nos perdermos do valor da vida, por de mais conceder à verdade do khorismos [chorismos] platônico, prenunciado por Parmênides  . E, assim pensando, relegamos Heráclito   para o final do drama histórico da filosofia clássica (cf. Horizonte e Complementaridade). E, assim pensando, relegamos Heráclito para o final do drama histórico da filosofia clássica (cf. Horizonte e Complementaridade). Talvez o tenhamos mal-entendido, por querer, isto é, por querer que ele tivesse dito o que nós queríamos que ele dissesse. Mas não estou assim tão certo disso. A propósito do fragmento 30 do Efésio (veja § 78, final), escrevemos: «ou o fogo representa o Um, como ‘continuamente vivo’, diante de um cíclico aluminar-se e apagar-se de sucessivos Kósmoi [v. kosmos], ou o Um é absorvido na unidade dos contrários que são o fogo e o mundo». Os termos em que foi redigido o segundo membro da alternativa — abstraindo da questão da imanência e da transcendência — entram, sem esforço, na área semântica do simbólico: fogo e mundo constituir-se-iam como «símbolo», enquanto «coisa» (mundo) acrescido do [131] seu «ser-origem» (fogo). Mas, apesar disso, ainda subsiste a separação, o extremo limite-liminar do Ser Originário de todo o ser-origem, bem considerando o significado da primeira alternativa, se, para o lado da transcendência, apartamos o mesmo Fogo, identificando-o com o «Um-Coisa Sábia», heterónimo heraclítico, entre os outros que são o Indiferenciado de Anaximandro  , o Ser de Parmênides, o Noûs de Anaxágoras  , o Caos-Noite de Hesíodo  , tudo heteronímia do Deus que reside além e acima de todos os deuses. Entretanto, fixemos a nossa atenção no símbolo Fogo-Mundo: trata-se, evidentemente, do que poderia chamar-se de Macro-símbolo, do único Macro-símbolo, posto que, maior, nenhum pode existir no mundo. Os outros, que no horizonte do trans-objetivo existem, nascem das tantas unidades dos contrários, a que o Efésio se refere tão repetidamente que não podemos deixar de ver, na repetição insistente, o intuito de bem profundamente nos levar à convicção de que essas unidades simbólicas são verídicas repetições do Macro-símbolo. Porém, não o esqueçamos, o Lógos [v. logos], que nos ensina a unidade dos contrários, só fala para os que abriram, vivendo na Grande Vigília, um acesso ao trans-objetivo, aos que vivem em disponibilidade irrestrita. Aquém deste horizonte, já não há pares de contrários. Nada se opõe a nada; de modo que em qualquer «posto» se possa ver o «oposto». Aqui, tudo está fragmentado em «coisas», nenhuma coisa se opõe a outra, daquela maneira. A diabólica vigília é sono, diante da Grande Vigília simbólica. Por conseguinte, também no horizonte do objetivo-coisístico não poderia surgir nem um arremedo de «complementaridade». Eis, portanto, como todos os caminhos nos levam ao Purgatório trans-objetivo, que de tal maneira purga a objetivação coisífica das «coisas» que, desvestidas elas de suas envolturas «coisificantes», apresentam em seu cerne nudificado o ponto onde se insere o que lhes falta para que se volvam em símbolos. [EudoroMito:131-132]


LÉXICO: complementaridade