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participação

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Todavia, a essa condição [de questionamento "o que é?"] junta-se frequentemente uma outra, que constitui simultaneamente uma determinação suplementar do saber por que se demanda. Tal é a exigência, explícita no Cármides  , quase expressa no Lísis, e tácita nos restantes textos, de que o que procura participe já da natureza daquilo mesmo que procura.

A este respeito, diz Sócrates no Cármides:

«O melhor modo de examinar o assunto parece-me ser o seguinte. É evidente que, se a σωφροσύνη está presente em ti, tens dela uma certa noção. É com efeito necessário que, estando de algum modo em ti, se de facto o está, ela te forneça uma certa percepção, a partir da qual possas ter uma opinião sobre o que é e de que modo é a σωφροσύνη» (158e-159a).

E novamente, mais à frente:

«Então, prestando ainda mais atenção e olhando de novo para ti mesmo, quando tiveres apreendido o que a presença da σωφροσύνη te faz e como lhe é possível realizar tal efeito, todas estas condições estando reunidas, diz-me perfeita e corajosamente o que ela é, no seu aparecer em ti» (160de).

Do mesmo modo, no Lísis sugere-se em todos os momentos cruciais, i. e., em todos os momentos em que se dá início a uma discussão (207c, 207d, 212a), e de novo no fim, perante a aporia com que termina o diálogo (223b), a necessidade de uma prévia experiência, por parte dos interlocutores, daquilo que todos discutem.

Repare-se particularmente nas duas últimas ocasiões. Em 212a, declarando surpreendentemente a sua inexperiência nas coisas do amor, Sócrates compara-se deste modo a Menexeno  :

«Mas eu estou tão longe desse bem precioso [i. e., da amizade] que nem sequer conheço [οἶδα] nenhum modo de alguém se tornar amigo de outrem, coisa que te quero perguntar a ti, que tens a experiência disso.»

E a culminar o diálogo:

«Os que se vão embora dirão que nós julgávamos ser amigos uns dos outros — e eu próprio me coloco entre vós —, mas nem sequer fomos capazes de descobrir que coisa é o amigo [ὅ τι ἔστιν ὁ φίλος]».

Ainda na mesma ordem de ideias, noutros diálogos em que se não explicita esta exigência de uma participação antecipada do que busca no buscado, nem por isso ela deixa de estar presente, como uma suposição, irônica ou não; assim com os corajosos generais Laques   e Nícias, junto dos quais Sócrates se informa sobre a coragem, e com o piedoso Êutifron, a quem o filósofo pede esclarecimento sobre o que é a piedade.

Estas duas características da pesquisa socrática pela excelência — a que seria necessário acrescentar uma terceira, qual é a consideração de que a capacidade de explicitar discursivamente o que se sabe constitui, ela mesma, um acompanhante essencial do saber [Cf. em especial: Alc. I, 111c; La., 190c, 194c; Chrm., 159a.] — encontram-se, no entanto, articuladas e a sua articulação corresponde à própria relação que a questão «o que é» mantém, no estado de coisas real, com a experiência vivida. [MesquitaPlatão:47-49]


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