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divino

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Já utilizamos várias vezes os termos “divino” e “Deus” no decurso da exposição do pensamento platônico. É chegado agora o momento de determinar o sentido próprio da teologia platônica.

Alguém já disse que Platão foi o fundador da teologia ocidental. Essa afirmação é correta, sob a condição de ser entendida em determinado sentido. A “segunda navegação”, ou seja, a descoberta do supra-sensível, devia proporcionar a Platão, pela primeira vez, a possibilidade de encarar o divino precisamente na perspectiva do supra-sensível, como, de resto, fará toda concepção posterior e evoluída do divino. Tanto isso é verdade que, hoje, consideramos como fundamentalmente equivalente crer no divino e crer no supra-sensível. Sob esse aspecto, Platão é indubitavelmente o criador da teologia ocidental, na medida em que descobriu a categoria do imaterial, à luz da qual o divino é pensável.

Entretanto, cabe acrescentar imediatamente que Platão, embora tenha conquistado o novo plano do supra-sensível e sobre ele tenha implantado a questão teológica, repropõe a visão de que o divino é estruturalmente múltiplo, que é um elemento constantemente presente em toda a filosofia e na mentalidade grega de que o divino é estruturalmente múltiplo.

Na teologia platônica, porém, devemos distinguir entre o “divino” impessoal, por um lado, e Deus e os deuses pessoais, por outro lado. Divino é o mundo das Ideias em todos os seus planos. Divina é a Ideia do Bem, mas não é Deus-pessoa. Assim, no ponto mais alto da hierarquia do inteligível encontra-se um Ente divino (impessoal) e não um Deus (pessoal), assim como as Ideias são Entes divinos impessoais e não Deuses pessoais.

Ao contrário, quem apresenta características de pessoa, isto é, de Deus, é o Demiurgo, que conhece e quer. Ele, entretanto, situa-se hierarquicamente em posição inferior ao mundo das Ideias, uma vez que não apenas não o cria mas dele depende. O Demiurgo não cria nem mesmo a chora ou matéria da qual o mundo é constituído, pois ela preexiste ao mundo. Assim, o Demiurgo é “plasmador” ou “artífice” do mundo e não seu criador. Deuses criados pelo Demiurgo são também os astros, concebidos como inteligentes e animados. Platão parece manter até mesmo algumas divindades do antigo politeísmo tradicional. Divina é a alma do mundo, divinas são as almas das estrelas e as almas humans, ao lado das quais deveiH ser arrolados também os demônios protetores, que ele acolhe da tradição, e os demônios mediadores, cujo exemplo mais típico é Eros.

Como se observa, o politeísmo se revela como algo estrutural exatamente no mais teológico dos pensadores da Grécia. Nesse aspecto, Aristóteles conseguiría dar um passo adiante ao inverter os termos da hierarquia e antepor ao divino impessoal um Deus munido das características de pessoa. Entretanto, nem mesmo Aristóteles como nenhum outro grego, saberia elevar-se a uma visão monoteísta, que o Ocidente só iria conhecer através dos textos da Bíblia. [REALE-HF1]