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Olam

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Adin Steinsaltz  

O mundo físico onde vivemos, o universo que nos rodeia, observados objetivamente, são apenas uma parte de um sistema de mundos de uma vastidão inimaginável. A maioria desses mundos são espirituais em sua essência; são de uma ordem diferente do nosso mundo conhecido. O que não significa necessariamente que existam em algum outro lugar, mas que existem em dimensões diferentes do ser. Mais ainda, os diversos mundos interpenetram-se e interagem de modo tal, que podem ser considerados contrapartidas entre si, cada um refletindo ou projetando-se no de baixo ou no de cima, com todas as modificações, mudanças e inclusive distorções que são resultado dessa interação. A soma dessa troca infinitamente complexa de influências avançando e retrocedendo entre as diferentes esferas de ação é que abrange o mundo específico da realidade que experimentamos na nossa vida diária.

Ao falar de mundos superiores ou inferiores, não tenho a intenção de descrever uma relação física   real; porque no campo de ação do espiritual não há tal divisão, e as palavras "alto" e "baixo" referem-se somente ao lugar de qualquer mundo particular, na escada da causalidade. Chamar um mundo de mais alto, significa que ele é mais primário, mais básico em termos de estar mais próximo de uma fonte de influência primordial, enquanto um mundo inferior seria um mundo secundário — em certo sentido, uma cópia. Porém, a cópia não é apenas uma imitação e sim um sistema completo, com vida própria mais ou menos independente, sua própria variedade de experiências, características e propriedades.


MUNDO DA EMANAÇÃO

De fato, somente além do Mundo da Criação, no mundo da emanação, o mais alto dos mundos — que num certo sentido já não é um mundo real —, pode-se falar de uma clareza e transparência tão grandes, que nenhum ocultamento de nenhuma essência em absoluto é possível, e que consequentemente, as essências não exibem nenhuma individualidade separada. Somente no mundo da emanação, não há ocultamento da divindade revelada por nenhuma cerca ou tela que separe as coisas. É por isso que se pode dizer que o mundo da emanação não é mais um mundo, é D-us Ele Mesmo. O Mundo da Criação, com todas as suas excelências e pureza, ainda é uma existência independente com sua própria personalidade, seu "Eu" diferenciado do ser divino. A diferença entre o mundo da emanação e o Mundo da Criação, portanto, é maior que entre quaisquer outros dois níveis. É a fímbria da totalidade do sistema das existências independentes, cada uma dividida da outra por "telas", e além dela está a fonte de todo o ser, onde já não há mais dessas telas.

Uma representação arquetípica de uma "tela" é a cortina que divide o humanamente sagrado do Santo dos Santos - Sagrado dos Sagrados no Templo Sagrado. Porque o Templo Sagrado é, num certo sentido, um modelo simbólico de todo o sistema dos mundos. Então, uma tela é algo que age como barreira ao livre fluxo da abundância divina em toda a sua pureza; é aquilo que produz um certo obscurecimento e modificação de sua luz. Porque sempre que a luz divina passa através de níveis de planos que são transparentes, pode haver uma alteração de cor, ou de forma, ou da qualidade da revelação, mas a luz em si continua sendo essencialmente luz. Porém, o que acontece quando a luz bate numa tela? Apesar da luz poder ser visualizada no lado escuro da tela como resultado de uma "iluminação" do outro lado, a luz em si não penetra.

Esta ideia de uma tela é somente uma imagem para explicar a essência das diferenças entre todas as coisas. No mundo da emanação, na Divindade, não há tais barreiras e a unidade é completa. Para que um mundo exista separado de D-us, precisa haver uma contração da essência superior. Esta contração de sabedoria infinita, ou remoção de abundância divina, é portanto a base para a criação do universo; e a tela — que representa o ocultamento do Divino — é a base para fazer com que os mundos se manifestem como mundos separados. Estas são as imagens centrais da Gênesis: no começo havia ocultamento e remoção — "escuridão na face da profundeza". E dessa escuridão, resultado da existência da tela, o molde de um mundo, que será o mundo em si, pode ser gravado.


MUNDO DA CRIAÇÃO

Imediatamente acima do mundo da formação está o mundo denominado o "mundo da criação" que, como os outros, inclui muitos campos de ação, níveis e mansões diferentes. E exatamente como o mundo da formação está composto de uma multidão de seres espirituais cuja essência é puro sentimento e emoção, o mundo da criação é um mundo de mente pura. Esta qualidade mental do mundo da criação não é uma essência meramente intelectual, mas se expressa como o poder e a capacidade de captar coisas com uma compreensão autêntica, interior; é, em outras palavras, a mente como criador, assim como aquela que registra e absorve o conhecimento.

Um dos outros nomes para o mundo da criação é "mundo do trono", extraído da Visão de Ezequiel do divino "trono da glória". Não obstante, no todo, esse aspecto do Divino que é revelado aos profetas é o mundo que está diretamente acima do mundo da criação, conhecido como o "Mundo da Emanação". Esta é a fonte da qual D-us se faz conhecer por alguns poucos, enquanto que o mundo da criação é Seu assento ou Seu trono, do qual, como está escrito, "a terra é o Seu escabelo". Outrossim, o Trono ou Carruagem Divina é meio através do qual a divina abundância desce às criaturas e coisas do nosso mundo, e faz contacto com os muitos sistemas complexos de todos os mundos. De modo que o mundo da criação também é o cruzamento da existência. É o ponto focal no qual a abundância que sobe dos mundos inferiores e a abundância que desce dos mundos superiores se encontram e entram numa espécie de relacionamento mútuo. Portanto, uma compreensão do "caminho da Carruagem" — ou seja, uma compreensão da maneira como funciona o Divino Trono da Glória — é o maior segredo da doutrina esotérica. E, além deste segredo, um ser humano — até um homem de visão ou um que tenha uma revelação —, pode receber apenas impressões incertas dessas essências, pois elas estão estruturalmente além da compreensão humana. Porque o mundo da criação é um mundo que o homem foi capaz de atingir somente no ponto mais alto do seu desenvolvimento, demonstrando dessa forma que parte de sua alma pertence ao campo de ação especial. Assim é para que alguém entenda o segredo da Carruagem, ele tem de estar parado no exato ponto focal da intersecção de mundos diferentes. Nesta intersecção, ele recebe conhecimento de toda a existência e transformação, passada, presente e futura, e está consciente do Divino como causa primordial e acionadora de todas as forças que agem, vindo de todas as direções. Obviamente, é impossível para o homem tal como ele é conseguir essa compreensão completamente; não obstante, até mesmo um discernimento parcial da carruagem lhe proporciona um sentido do que está acontecendo em todos os mundos.

No mundo da criação, também, há mansões — ou seja, lugares no sentido metafísico, esferas do ser dentro das quais há um certo ritmo medido do tempo, de uma forma ou de outra, com relação entre passado, presente e futuro, entre causa e efeito, e onde há almas e criaturas que pertencem especificamente a este mundo. Essas criaturas do mundo da criação, as almas que vivem nele, são os anjos superiores, chamados "serafins". Como os anjos do mundo da formação, os serafins são essências abstratas singulares, não passíveis de mudança. Mas, enquanto os anjos do mundo da formação são incorporações de emoção pura, aqueles do mundo da criação são essências de inteligência pura. Os serafins são anjos que manifestam os níveis superiores da mente. Também refletem as diferenças entre os diversos planos da consciência e compreensão, um aspecto particular da mente. Por último, cada uma dessas criaturas do mundo da criação também serve de anjo-mensageiro, recebendo a abundância dos seres angélicos e das almas do mundo da formação, e elevando-as até um nível mais alto, no mundo da criação e além, até alturas infinitas.

A ascendência do mundo da criação sobre o Mundo da Formação não é apenas uma questão da superioridade da mente e da consciência sobre as emoções; também radica no fato do mundo da criação em si ser um mundo "superior": no sentido que os diversos mundos caracterizam-se como mais altos ou mais baixos em relação ao grau de sua transparência à luz divina, que é sua própria luz e substância. Ao descer no sistema dos mundos, a materialidade torna-se ainda maior: em outras palavras, os seres dos mundos mais baixos sentem sua existência independente com maior intensidade que os seres dos mais altos; estão mais conscientes de serem seres individuais separados. E esta consciência de sua individualidade bloqueia a abundância divina e ao mesmo tempo obscurece a verdadeira essência imutável que está latente sob a personalidade individual. Resumindo, quanto mais baixo o mundo, mais ele está permeado pelo sentido do "Eu", e consequentemente, mais ele está sujeito ao obscurecimento da essência divina. Não obstante, pode-se dizer que todos os mundos — e de fato, quaisquer campos de ação do ser separados — existem somente em virtude do fato de que D-us se esconde. Porque quando a divina abundância é manifestada em sua plenitude total, não há espaço para a existência de nada mais. Um mundo pode existir somente como resultado do ocultamente do seu Criador. À medida que se desce dos mundos superiores para os inferiores, a cada novo nível de descida, a separação, a independência do mundo dele torna-se mais acentuada e enfática, enquanto que a abundância divina se torna mais oculta. Logo, as criaturas do Mundo da Ação podem atingir (como de fato os homens o fazem) uma condição na qual estão não somente inconscientes da divina abundância que dá a vida, mas onde também podem chegar a repudiar sua existência totalmente. Por outro lado, à medida que se ascende a Cadeia do Ser - escada do ser, os mundos tornam-se cada vez mais claros e transparentes à divina abundância.

Se no nosso mundo precisamos de uma introspecção profética ou abertura da fé para distinguir a divina abundância em toda a sua variedade de formas e em todos os seus níveis, nos mundos superiores tudo é mais lúcido e oferece menos resistência à abundância divina. De modo que estando acima dos outros dois mundos — da ação e da formação — o mundo da criação também é mais translucidamente transparente, suas criaturas têm um conhecimento mais pleno da maneira pela qual seu mundo está sendo criado constantemente como uma ou outra manifestação da abundância divina. Ao mesmo tempo, como o mundo da criação ainda é um mundo separado, suas criaturas e almas têm suas próprias naturezas individuais. De fato, podem perceber a luz divina, e podem aceitar totalmente seu domínio em tudo. Não obstante, ao sentirem-se separadas da sua luz, reconhecem sua existência independente. O que equivale a dizer que até o serafim anseia poderosamente aproximar-se do Divino, pois apesar de encontrar-se tão por cima do que qualquer pessoa possa captar, e apesar de ser a incorporação da compreensão e da inteligência superior, está consciente de ser uma realidade ainda desconectada do Divino.


MUNDO DA FORMAÇÃO

Pode-se dizer que o mundo da formação seja, em essência, um Sentimento - mundo de sentimento. É um mundo cuja substância principal, ou tipo de experiência, é a emoção de um tipo ou de outro, e no qual tais emoções são os elementos que determinam seus padrões. Os seres vivos nesse mundo são manifestações conscientes de impulso - impulsos particulares — impulsos para realizar um ou outro ato ou reação - reagir de uma ou de outra maneira — ou o poder de ação - levar à prática um incentivo, realizar, cumprir a tendência de uma inclinação ou de uma inspiração. As criaturas vivas do mundo da formação, os entes - seres que funcionam nele como nós funcionamos no mundo da ação, são chamadas, de modo geral, "anjos".

O campo de ação dos anjos, o mundo da formação, é um sistema geral de essência - essências não físicas, a maioria delas bastante simples e consistentes em seu ser. Cada anjo tem um caráter bem definido, que se manifesta pela maneira como funciona em nosso mundo. Por isso, dizemos que um anjo pode efetuar somente uma missão, porque a essência de um anjo está além dos aspectos múltiplos do homem. A essência particular de um anjo pode ser determinada em termos de coisas diferentes e formas separadas, mas ela permanece uma coisa singular em si mesma, como uma simples força da natureza. Porque apesar do anjo ser um ente - ser que possui uma consciência - consciência divina, sua essência e função específicas não são alteradas por ela, assim como as forças físicas no mundo são específicas e únicas em seu modo de funcionamento, e não estão constantemente mudando as suas essências. Por conseguinte, assim como há anjos sagrados, fabricados e criados pelo sistema sagrado, também há anjos destrutivos, chamados "diabo - diabos" ou "demônio - demônios", que são as emanação - emanações da relação do homem com esses aspectos da realidade que são o oposto da santidade. Aqui, também, as ação - ações do homem e seus modo de ser - modos de existência, em todas as suas formas, criam anjos, mas anjos de outro tipo, de outro nível e de uma realidade diferente. Esses são anjos hostis que podem formar parte de um mundo inferior, ou até mesmo de um mundo superior, mais espiritual — este último, porque apesar de não pertencerem ao santidade - reino da santidade, como em todos os mundos - mundos e sistemas do ser, há uma interpenetração e influência mútua entre o sagrado e o profano - não sagrado.


MUNDO DA AÇÃO

O mundo onde vivemos habitualmente, com tudo o que ele engloba, é chamado de "mundo da ação"; e ele inclui o mundo da nossa apreensão sensual e não sensual. Mas este mundo da ação em si mesmo não é tudo da mesma essência e da mesma qualidade. A parte inferior do mundo da ação é o que se conhece como o "mundo da natureza física", e dos processos mais ou menos mecânicos — ou seja, o mundo onde a lei natural prevalece; acima deste mundo de natureza física há outra parte do mesmo mundo, que podemos chamar de "mundo da ação espiritual". O que é comum a esses dois campos de ação do mundo da ação é o homem, a criatura humana situada de tal modo entre eles, que participa de ambos. Formando parte do sistema físico do universo, o homem está subordinado às leis físicas, químicas e biológicas da natureza, enquanto que do ponto de vista de sua consciência, mesmo quando esta consciência está totalmente ocupada com assuntos de uma ordem inferior, o homem pertence ao mundo espiritual, o mundo das ideias. Com certeza, essas ideias do mundo da ação estão quase completamente ligadas ao mundo material, crescendo dele e avançando, porém nunca saindo dele realmente; e isto é tão verdadeiro para as alturas da filosofia de maior alcance e mais abrangente, quanto para os processos do pensamento da pessoa ignorante, o selvagem primitivo, ou a criança.

Portanto, todo aspecto da existência humana é composto de matéria e espírito. E ao mesmo tempo, no mundo da ação, o espiritual está subordinado ao material, de acordo com o fato que as leis da natureza determinam, a face e forma de todas as coisas, e servem como pontos focais para todos os processos. Neste mundo, o espírito pode aparecer e desempenhar a sua função somente sobre a base sólida dos funcionamentos do que chamamos as "forças da natureza". Em outras palavras, não importando o quanto ele possa ser abstrato ou estar divorciado da assim chamada realidade, o pensamento continua pertencendo ao mundo da ação.

No entanto, o mundo da ação é apenas um mundo num sistema geral de quatro dimensões fundamentais do ser, ou quatro mundos diferentes, cada um com seu próprio cosmos de essências variadas. Esses quatro mundos foram chamados, na ordem do superior ao inferior, "emanação", "criação", "formação" e "ação". Assim, o mundo diretamente acima de nós é o Mundo da Formação. Para entender a diferença, primeiro precisamos compreender alguns fatores comuns aos quatro mundos. Esses fatores eram conhecidos tradicionalmente como "mundo", "ano" e "alma"; hoje em dia, os chamaríamos "espaço", "tempo" e "si mesmo" (experiência do próprio ser). Cada mundo é diferenciado dos outros pela maneira como esses três fatores de manifestam nele. Por exemplo, no nosso mundo, o lugar físico é um elemento externo necessário para a existência das coisas; é o fundo contra o qual todos os objetos se deslocam e todas as criaturas funcionam. Nos mundos superiores, e também no mundo da ação espiritual, o que é análogo ao espaço no mundo da ação física é chamado de "mansão". É a estrutura dentro da qual diversas formas e seres convergem e se relacionam. Talvez possamos compará-lo com esses sistemas completos — conhecidos na matemática como "grupos" ou "campos" — em cada um dos quais todas as partes unitárias estão relacionadas de uma maneira definida com as outras partes, e com o todo. Esses sistemas podem estar habitados ou totalmente cheios, ou podem estar relativamente espalhados ou vazios. Seja qual for o caso, tal sistema de existências relacionadas constitui um "lugar" no abstrato — uma "mansão" nos mundos superiores.

O tempo também tem um valor diferente nos outros mundos. No campo de ação da nossa experiência, o tempo é medido pelo movimento de objetos físicos no espaço. O "ano", como ele é chamado abstratamente, constitui o exato processo da mudança; é a passagem de uma coisa para outra, de forma para forma, e também inclui dentro de si o conceito da causalidade, como o que mantém toda a transição de forma para forma, dentro dos limites da lei. De fato, ao ascender na ordem dos mundos, este sistema de tempo torna-se cada vez mais abstrato e cada vez menos representativo de algo que conhecemos como tempo, no mundo físico; torna-se não mais do que a essência mais pura da mudança, ou até mesmo a possibilidade da mudança potencial.

Por último, o que chamamos de "alma" é, na dimensão física, a totalidade das criaturas vivas funcionando nas dimensões do tempo e do espaço deste mundo. Apesar de serem uma parte essencial deste mundo, elas são diferenciadas do fundo geral pela sua autoconsciência e conhecimento deste mundo. De modo similar, no mundo superior, as almas são essências conscientes de si mesmas, agindo dentro da estrutura da mansão e do ano do seu mundo.


Temos de lembrar que todo o nosso mundo material é apenas uma parte de um sistema de mundos maior; tudo o que acontece e se oferece à nossa apreensão também está ligado ao que está acima e abaixo do nosso mundo.

O que equivale a dizer que as essências não físicas de outros mundos são projetadas em nosso mundo material, ajustando-se aos seus limites e ao seu tempo e espaço físico. Então, apesar dos limites do nosso mundo material, os mundos superiores estão presentes nele, e podem até ser diferenciados, de uma forma ou de outra. De fato, todo detalhe do mundo material é um tipo de projeção de uma realidade não física que escolheu revelar-se fisicamente, desse modo particular.

Nessa visão do mundo, tem de haver uma dupla distorção. Primeiro, a distorção que resulta da projeção de algo não físico sobre uma realidade física: como em essência esses dois são tão diferentes, é impossível que alguma coisa no nosso mundo seja uma réplica completa de uma realidade não física. Depois, está a distorção que resulta do fato de que nosso mundo já não está no seu estágio inicial de pureza e saúde primitivas. As diversas criaturas deste mundo fazem o que têm de fazer, o melhor que podem, por conseguinte efetuando certas mudanças na estrutura do mundo — as mudanças e distorções mais ambiciosas, logicamente, sendo aquelas que resultam das ações do homem.

Em virtude deste livre-arbítrio e da capacidade de impor sua vontade sobre outras criaturas no mundo material, o homem é — até um certo grau — independente das forças dos outros mundos, superiores e inferiores. Consequentemente, os pensamentos e as ações do homem, especialmente seus pecados e seus erros, podem perturbar as formas mais simples da natureza e o mundo pode até afetar a realidade de outros mundos.

Portanto, este mundo já não é uma réplica ou uma projeção verdadeira dos mundos superiores. Somente no seu estado original, o do Jardim do Éden, ele estava estruturado como uma duplicação mais ou menos perfeita do mundo físico e dos mundos espirituais. Desde então todos os mundos, e o nosso mundo em particular, tornaram-se cada vez mais distorcidos, e grande parte da essência original mudou de várias maneiras. Somente aquelas pessoas que conhecem o segredo da existência no universo podem saber a medida na qual a duplicação entre os mundos ainda existe, e podem perceber a analogia essencial entre o mundo físico e os mundos espirituais. Podem descobrir os caminhos ocultos na realidade concreta do mundo que leva aos mundos superiores, e podem decifrar em tudo o que é apreendido como real, os símbolos e modelos de um mundo superior, guiando-nos, passo a passo, até o próprio pináculo e fonte de todos os níveis.

E do mesmo modo que todos os mundos se refletem, em certo grau, no mundo físico onde vivemos, assim também, em medida ainda maior — de fato, em princípio até as alturas máximas da revelação divina — a imagem interior dos mundos é refletida na imagem do homem. Com certeza, todas as criaturas do mundo, as grandes e as pequenas, constituem cópias e símbolos de aspectos nas existências dos mundos superiores, mas no homem também estão refletidas as relações entre diversos aspectos da existência. Logo, o homem é, por um lado, uma parte da criação geral do mundo, e por outro lado, como possuidor do atributo especial do livre-arbítrio, ele é a única expressão concreta da realidade divina nos mundos. Porque todos os outros mundos são ordenados de acordo com as leis fixas de causa e efeito, sejam de natureza física ou não física. Somente o homem pode mudar voluntariamente a estrutura em certa medida, e ativar os "círculos viciosos" de várias maneiras.

Portanto, somente o homem é a expressão da vontade criativa no mundo. Em virtude da faísca que é a sua alma, o homem manifesta a divina abundância que existe em todos os mundos, até suas alturas mais sublimes. De modo que toda imagem do homem está, em certo sentido, na imagem de Deus. O que equivale a dizer que o homem é tanto a projeção da divina abundância criativa na realidade física, quanto a forma divina revelada aos mundos superiores, como ela aparece em nosso mundo.

Sem dúvida, a representação divina no homem está longe de ser completa; nem o corpo nem a alma do homem expressam fielmente a essência suprema. E no entanto o homem, em todos os seus aspectos espirituais e físicos, deve ser visto como uma ordem simbólica orientada para a ordem da soberania no mundo, a ordem das dez Sefirot do Mundo da Emanação. [STEINSALTZ, Adin. A Rosa de Treze Pétalas. Maayanot, 1992]


Isaïe Tishby

A doutrina da Cabala   tal qual constituída através dos séculos, comporta uma concepção cosmológica segundo a qual a existência inteira, do topo das Sephiroth superiores à terra, é formada como um edifício de quatro andares, do qual cada compartimento constitui um mundo completo e especial. Estes quatro mundo são: Emanação, Criação, Formação e Fazimento.

A opinião mais admitida, a respeito destes mundos é a seguinte:

  • A Emanação é a região das Sephiroth.
  • A Criação comporta o Trono Glorioso, os Sete Palácios e as entidades superiores da Carruagem Divina.
  • A Formação comporta os Anjos cujo chefe é Metatron.
  • O Mundo da Ação - Mundo do Fazimento é o cosmos material no qual residem as milícias dos céus, os humanos e as cascas.

No Zohar   pouco se fala destes mundos diretamente, e muito pouco de sua ordem e composição. Nos escritos dos filósofos judeus encontramos dois gêneros de mundos: os partidários do neoplatonismo   admitem a disposição cosmológica platônica — o mundo da inteligência (das ideias), o mundo psíquico e o mundo natural, tendo os três mundos regiões espirituais superiores que são mediadoras entre a Divindade e este mundo aqui, e que contêm as raízes dos diferentes seres do cosmos inferior.

Os filósofos aristotélicos falam do mundo superior, do mundo mediano e do mundo inferior, nos quais se encontram os Anjos (as inteligências distintas), as esferas astrais e a terra. A teoria de Aristóteles se encontra em grande parte nos primeiros cabalistas. [Excertos de "La Kabbale"]