Gnosticismo  
Werner Foerster  : GNOSIS

O que significa «ouro na lama» como simples imagem do pensamento gnóstico? Primeiro, dá expressão à distinção entre o ouro e o que o cerca. Isto significa que aquilo que responde ao «chamado», o «Eu» do homem, o «si mesmo» ou o que se queira chamá-lo, pertence a outra esfera daquela do mundo que cerca este «Eu».

A lama é aquela do mundo: primeiro que tudo o corpo, que com seus desejo - desejos sensuais atrai o homem para baixo e aprisiona o «Eu». «Dentro de ti está um nobre escravo, a quem deves sua liberdade». Assim frequentemente ouvimos no gnosticismo a admoestação para liberar a si mesmo das «paixões». No Mandeísmo ouvimos frequentemente sobre o «corpo fétido» e expressões similares, e no Tratado VII do Corpus Hermeticum   é dito: «Primeiro deves deixar a vestimenta que usas, o ignorância - manto de ignorância, a concupiscência - fundação da concupiscência, os corrupção - grilhões da corrupção, a muralha negra, a morte viva, o cadáver visível, o túmulo que carregas contigo, o ladrão que está em ti». Tudo isto aplica-se ao corpo. Faz lembrar Platão, que em um ponto chama Eros um tirano que morde a humanidade. Mas Platão não falaria sobre o corpo humano como aqui, e a insistência em celibato, que a conclusão lógica que o gnosticismo conduz, seria impossível para o filósofo ateniense. Além do mais há o fato que deste tema básico de hostilidade ao corpo o gnosticismo deriva não somente asceticismo mas também seu oposto, libertinismo, no qual o homem demonstra desprezo pelo corpo e satisfaz seus desejos porque fundamentalmente não são sua preocupação. De fato, chega ao ponto de uma seita gnóstica propôr que o homem deveria realizar todos os atos maléficos em sua vida, ou não seria salvo (Carpocrates). Se adicionarmos que há no gnosticismo representantes de uma ética respeitável, mas que todos estes grupos — ascetas, libertinos, e advogados de um alto padrão ético — ainda são «gnósticos», então pode ser visto que com esta hostilidade ao corpo ainda não apreendemos exatamente o núcleo central do gnosticismo.