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quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Perenialistas
Ananda Coomaraswamy  : Coomaraswamy Filosofia - DA PERTINÊNCIA DA FILOSOFIA

Não é necessário nenhum argumento para demonstrar o que a sabedoria humana, o racionalismo, a nossa filosofia II entendem por imortalidade, não uma vida eterna na terra, e sim uma persistência da consciência - percepção consciente, da memória e do indivíduo - caráter do indivíduo, como ocorre diariamente conosco depois do intervalo de sono - sono noturno, que se assemelha à morte. A sabedoria humana - sabedoria racional adota uma dessas duas posições. Começa argumentando que não temos experiência do funcionamento da consciência - percepção consciente nem concebemos o que é, fora das bases físicas reais em que o funcionamento parece se apoiar, se é que de fato a percepção consciente em si pode ser algo mais que uma função da matéria em movimento, isto é, uma função da existência física; consequentemente não concebe a possibilidade de nada mais que a imortalidade na história, por exemplo na memória de outros seres mortais. Neste sentido, também pode ser postulada a possibilidade de uma espécie de ressurreição, como ocorre quando a memória é refrescada pela descoberta de provas documentais da existência de algum indivíduo ou pessoa cujo nome havia sido esquecido há milhares de anos. Ou a sabedoria humana pode sustentar, de forma certa ou errada, que foram encontradas provas da "sobrevivência da personalidade", por exemplo em comunicações com o outro mundo, de um tipo tal que prova (por referências a fatos que o observador não conhecia, mas foram verificados depois, ou por "manifestações" de um tipo qualquer) uma continuidade de memória e uma persistência do caráter individual no morto que supostamente está em comunicação com o observador. Se nesse caso alguém tentar racionalizar a prova aceita desse modo, outros podem argumentar que pode haver outros tipos de matéria diferentes e mais sutis do que as que são perceptíveis pelos sentidos físicos de que dispomos hoje e essas outras modalidades de matéria podem muito bem servir de suppositum da consciência funcionando em outros planos de ser - planos de existência.

É fácil ver que não se pode estabelecer nenhuma diferença intelectual nem espiritual entre essas duas interpretações racionalistas, havendo uma única diferença entre elas no que se refere à quantidade ou espécie de tempo em que a continuidade do caráter e da consciência do indivíduo pode ser mantida num espaço dimensionado e numa base material, em princípio sem mudar em nada as teorias da "quarta dimensão" ou da "matéria sutil". As duas interpretações racionalistas são rejeitadas in toto tanto pela religião como pela metafísica.

Não que a possibilidade de uma persistência indefinida da consciência do indivíduo em planos de ser - planos de existência variados ou indefinidamente numerosos e em vários modos temporais possa ser de modo nenhum negada na religião ou na metafísica (supõe-se antes que mesmo agora a consciência do indivíduo funcione em níveis que não são os da nossa experiência terrestre do momento) [1]; o fato é que, estritamente falando, uma persistência nesses modos de existir não é uma imortalidade, tomando como imortalidade a imutabilidade de existir sem desenvolvimento nem mudanças e completamente desprovida de novidades, ao passo que a que se supõe subsistir fora das contingências, como por exemplo a alma, forma ou princípio numenal (nama) do indivíduo, segundo o qual ela é o que é, tem de ser distinguida igualmente do corpo sutil e do grosseiro (sukshma e sthula sarira), que também são mundo fenomenal - fenomenais (rupa) pelo fato de serem completamente intelectuais e imateriais [2].


Observações

[1"Mesmo nós próprios, experimentando mentalmente o gosto de alguma coisa eterna, não estamos neste mundo" (Santo Agostinho em De Trin. IV.20).

[2Portanto, incapaz de ‘prova’, quer o fenômeno aduzido seja ‘científico’, quer ‘espiritualista’.