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Harada (Eckhart) – indivíduo
quinta-feira 13 de outubro de 2022
Dentro dessa perspectiva o que significa substantia individua, o indivíduo ?
Indivíduo significa propriamente indivisível. A essa impossibilidade de dividir, opomos a divisibilidade, a possibilidade de dividir. E entendemos por dividir, partir, separar uma parte da outra, fazer em pedaços. Essa ação de dividir parte do que é aparentemente uno, em seus componentes, e se não forem componentes, em pedaços, até que não se possa mais dividir, pois se chegou ao último elemento nuclear, ao derradeiro “átomo” [1]. Aqui podemos logo perceber que esse modo de divisibilidade e indivisibilidade pertence ao modo de ser acima descrito como o primeiro equívoco. O segundo equívoco era de pensar que esse modo de ser físico-matemático fosse uma versão modernizada, cientificamente mais limpa do modo de ser físico-corporal, ainda subjetivo e antiquado da ordenação do ser no pensamento medieval, a esfera a mais elementar, a ínfima da substância composta coisal. Para os medievais, nessa esfera, no entanto, os entes subsistentes sem-vida, p. ex., pedra , possuem peso, tamanho, densidade etc., que podem ser medidos em números, “matematicamente”, mas aqui peso, tamanho, densidade não são no seu ser reduzidos à pura “quantidade” matemática a modo das ciências naturais físico-matemáticas, mas são tomados concretamente dentro da experiência de uso, a partir e dentro e a modo de uma existência artesanal [2]. Como é aqui, nessa perspectiva concreta da experiência do mundo circundante no uso e na vida, o que chamamos de gênero , espécie e indivíduo, p. ex. no mundo das pedras? A espécie pedra aparece sob a denominação de a pedra. E o indivíduo é denominado esta, aquela pedra. Aqui a pedra, a espécie é denominada universal . E esta pedra ou aquela pedra, o indivíduo é denominado singular. O relacionamento do universal para com o singular e vice-versa é bem diferente do do geral ou comum para com o individual ou particular. Trata-se de outro teor do ser. Aqui é preciso ser vista a diferença no teor do ser, portanto a diferença do sentido do ser operante em cada nível da intensificação do ser na escalada da ordenação dos entes no seu ser. Aqui, quanto mais elevado for o nível do teor do ser na dimensão a que pertence um ente , tanto maior é o teor da imensidão, profundidade e liberdade do seu ser, que aparece na densidade, envergadura e na qualificação do modo de ser de uma “totalidade”, denominada uno em se tratando do universo criado; e no “modo de ser” dentro da vida interna de Deus uno-e-trino de Um, por Eckhart , cuja vigência unitiva é oculta, retraída, mas se desvela como din âmica do intercâmbio das três pessoas divinas, acima designadas de incomunicáveis. Esse “modo de ser” da intensificação no ser se chama universalidade. Uni-versal significa vertido, virado, convergido ao uno ou ao Um e designa a intensidade do ser, e não generalidade em oposição a particularidade.
Ver online : Hermógenes Harada
[1] Se entendermos a realidade a partir e dentro da realização sob o sentido do ser do físico-matemático das ciências naturais modernas, a coisa entendida como quantidade e quantificações sempre é divisível infinitesimalmente. De tal sorte que na direção do máximo e do mínimo se abre total indeterminação em indefinido. Aqui não pode aparecer uma realidade e realização do tipo “totalidade”. Se nessa dimensão físico-matemático podemos de alguma forma pontualizar estaticamente o ente como algo, é porque delimitamos a extensão quantitativa, de aqui até aqui, e criamos a possibilidade de dentro desse trecho delimitado estabelecer medida válida em si, conforme a delimitação.
[2] Aqui a medição “métrica”, mesmo usando-se matemática, não significa que o sentido do ser dominante nesse uso dos números e da sua medição seja o do físico-matemático no sentido hodierno das ciências naturais. A medição concreta em números, operante no rigor de exatidão artesanal nas construções dos medievais, pode ser por assim dizer a experiência concreta pré-científica, no uso e na vida, a partir da qual incoativamente as ciências naturais físico-matemáticas podem grosso modo ter tirado provisoriamente os conceitos fundamentais da sua construção do saber como do seu “positum”. Mas na medida em que a construção se afasta desse início, pode ter sofrido uma modificação na intencionalidade, de tal sorte que o que vem à fala como medida destacada de exatidão objetiva físico-matemática se torna a medida básica de toda e qualquer objetividade e exatidão, da realidade como tal.