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Cassirer: A CRISE NO CONHECIMENTO DO HOMEM SOBRE SI MESMO (2)

quarta-feira 23 de março de 2022, por Cardoso de Castro

  

Em certo sentido, essa primeira resposta sempre permaneceu a resposta clássica. O problema socrático e o método socrático jamais poderão ser esquecidos ou suprimidos. Por intermédio do pensamento platônico deixou sua marca (VIDE NOTA ABAIXO) em todo o desenvolvimento futuro da civilização. Não existe, talvez, meio mais seguro nem mais rápido de nos convencermos da profunda unidade e da perfeita continuidade do pensamento filosófico antigo do que o confronto desses primeiros estádios da filosofia grega com um dos últimos e mais nobres produtos da cultura greco-romana, o livro Para Si Mesmo, escrito pelo Imperador Marco Aurélio   Antonino. A primeira vista, a comparação pode parecer arbitrária, pois Marco Aurélio não era um pensador original, nem seguia um método rigorosamente lógico. Êle mesmo dá graças aos deuses porque, quando veio a interessar-se por filosofia, não se converteu em escritor filosófico nem em solucionador de silogismos (Marcus Aurelius Antoninus, Ad se ipsum - eis eauton, Livro I, par. 8; na maioria dos trechos seguintes cito a versão inglesa de C. R. Haines, The Communings with Himself of Marcus Aurelius Antoninus - Cambridge, Mass., Harvard University Press, 1916 -, Loeb Classical Library). Mas Sócrates   e Marco Aurélio têm em comum a convicção de que, para descobrirmos a verdadeira natureza ou essência do homem precisamos, antes de tudo, separar do seu ser todas as características externas e incidentais.

NOTA: Nas páginas seguintes não tentarei apresentar um apanhado Ao desenvolvimento histórico da filosofia antropológica. Escolherei tão-somente uns poucos estádios típicos, a fim de ilustrar a linha geral de pensamento. A história da filosofia do homem ainda é um desiderato. Ao passo que a história da metafísica, da filosofia natural, do pensamento ético e científico foi estudada em todos os seus pormenores, ainda estamos no princípio. Durante o último século, a importância deste problema foi sentida cada vez mais intensamente. Wilhelm Dilthey   concentrou todos os esforços em sua solução. Mas, embora rica e sugestiva, a obra de Dilthey permaneceu incompleta. Um de seus discípulos, Bernhardt Groethuysen, apresentou excelente descrição do desenvolvimento geral da filosofia antropológica. Infelizmente, porém, sua descrição termina antes da passagem derradeira e decisiva — a de nossa era moderna. Veja B. Groethuysen, "Philosophische Anthropologie", Handbuch der Philosophie (Munique e Berlim, 1931), III, 1-207. Ver também seu artigo "Para uma Filosofia Antropológica", Filosofia e História, Ensaios apresentados a Ernst Cassirer   (Oxford, Clarendon Press, 1936), pp. 77-89.

Não digais que seja de homem nenhuma dessas coisas que não lhe pertencem como homem. Não podem ser afirmadas de um homem; a natureza do homem não as garante; elas não são consumações daquela natureza. Consequentemente, nem o fim por que vive o homem está colocado nessas coisas, nem o que conduz à perfeição do fim, a saber, o Bem. Além disso, se algumas dessas coisas pertencessem a um homem, não lhe caberia desprezá-las nem se opor a elas,... mas sendo tudo como é, quanto mais puder libertar-se,... dessas e de outras coisas com equanimidade, tanto melhor será o homem (Marcus Aurelius, op. cit,, Livro V, par. 15).

Tudo o que acontece ao homem, vindo de fora, é irrito e nulo. Sua essência não depende de circunstâncias externas; depende exclusivamente do valor que ele dá a si mesmo. Riquezas, posição, distinção social e até a saúde ou os dotes intelectuais — tudo isso se torna indiferente (adiaphonon). Só tem importância a tendência, a atitude interior da alma; e esse princípio interior não pode ser perturbado. "O que não pode tornar o próprio homem pior do que antes também não pode piorar-lhe a vida, nem prejudicá-la, quer venha de fora quer de dentro" (Idem, Livro IV, par. 8).

A exigência da interrogação de si mesmo aparece, portanto, não só no estoicismo mas, também, na concepção de Sócrates, como privilégio do homem e sua obrigação fundamental (Idem, Livro III, par. 6.). Mas esta obrigação é agora compreendida num sentido mais amplo; seus antecedentes não são apenas morais senão também universais e metafísicos. "Nunca deixes de fazer a ti mesmo esta pergunta e a te reperguntares assim: Que relação tenho eu com esta parte de mim que denominam a Razão governante (to hegemonikon)?" (Idem, Livro V, par. 11) Quem vive em harmonia com seu próprio eu, o seu daemon, vive em harmonia com o universo; pois tanto a ordem universal quanto a ordem pessoal não são mais do que expressões e manifestações diferentes de um princípio fundamental comum. O homem demonstra seu poder inerente de crítica, de julgamento e de discernimento ao conceber que, nessa correlação, o Eu, e não o Universo, representa o papel principal. Depois que o Eu conquista sua forma interior, essa forma permanece inalterável e imperturbável. "Depois de formada, a esfera continua redonda e autêntica" (Idem, Livro VIII, par. 41). Esta, por assim dizer, é a última palavra da filosofia grega — uma palavra que, mais uma vez, encerra e explica o espírito em que foi originalmente concebida. Esse espírito foi um espírito de julgamento, de discernimento crítico entre o Ser e o Não-Ser, entre a verdade e a ilusão, entre o bem e o mal. A vida em si mesma é mutável e flutuante, mas o verdadeiro valor da vida deve ser buscado numa ordem eterna, que não admite mudança. Não está no mundo de nossos sentidos, e é só pelo poder de nosso juízo que podemos compreender essa ordem. O juízo é o poder central do homem, a fonte comum da verdade e da moral. Pois é a única coisa em que o homem depende inteiramente de si mesmo; é livre, autônomo, auto-suficiente (Cfr. idem, Livro V, par. 14).

"Não te aflijas", diz Marco Aurélio, não sejas muito ansioso, mas sê teu próprio amo e olha para a vida como um homem, como ser humano, como cidadão, como criatura mortal. (...) As coisas não tocam a alma, porque são externas e permanecem imóveis, mas a nossa perturbação vem apenas daquele juízo que formamos em nós mesmos. Todas estas coisas, que vês, mudam imediatamente, e já não serão; e tem sempre em mente o número das mudanças que já presenciaste. O Universo — mutação, a Vida — afirmação. [NOTA: Livro IV, par. 3. O termo "afirmação" ou "julgamento" me parece uma expressão muito mais adequada do pensamento de Marco Aurélio do que "opinião", que encontro em todas as versões inglesas que consultei. "Opinião" (a platônica doxa) contém um elemento de incerteza e de mudança não pretendido por Marco Aurélio. Como termos equivalentes a opolepssis encontramos em Marco Aurélio krisis, krima, diakrisis. Cf. Livro III, par. 2; VI, par. 52; VIII, pars. 28, 47.]

O maior mérito desta concepção estóica do homem reside no fato de que ela dá ao homem, ao mesmo tempo, um profundo sentimento de sua harmonia com a natureza e de sua independência moral da natureza. Na mente do filósofo estóico estas asserções não entram em conflito, são correlativas. 0 homem se encontra em perfeito equilíbrio com o universo, e sabe que este equilíbrio não deve ser perturbado por nenhuma força externa. Tal é o caráter dual da "impassibilidade" (ataraxia) estóica. A teoria estóica revelou-se uma das mais vigorosas forças formadoras da cultura antiga. Mas, de repente, viu-se em presença de uma força nova, até então desconhecida. O conflito com a nova força abalou, até seus fundamentos, o ideal clássico do homem. As teorias estóica e cristã sobre o homem não são necessariamente hostis: trabalham conjuntamente na história das ideias e, não raro, as encontramos em estreita conexão no mesmo pensador. Entretanto, existe sempre um ponto em que os ideais cristão e estóico se mostram irreconciliáveis. A afirmada independência absoluta do homem, que na teoria estóica era considerada virtude fundamental, transformou-se, na teoria cristã, em seu vício e erro fundamentais. Enquanto nele perseverar, o homem não terá caminho possível para a salvação. A luta entre os dois conceitos antagônicos perdurou por muitos séculos e, no início da época moderna, na era da Renascença e no século XVII — ainda sentimos toda sua força (Sobre uma narrativa minuciosa consulte Cassirer, Descartes  , Estocolmo, 1939, pp. 215 e seguintes).

Aqui podemos entender um dos traços mais característicos da filosofia antropológica, que não é, como outros ramos da investigação filosófica, um lento e contínuo desenvolvimento de ideias gerais. Até na história da lógica, da metafísica e da filosofia natural encontramos as mais acerbas oposições. História que pode ser descrita, em termos hegelianos, como um processo dialético em que cada tese é seguida por sua antítese. Não obstante, existe uma coerência interior, uma ordem lógica, clara, que liga as diferentes etapas do processo dialético. A filosofia antropológica, por outro lado, apresenta um caráter totalmente diverso. Se quisermos apreender-lhe o significado e sua verdadeira importância, precisamos escolher não o estilo épico de descrição, mas o dramático. Pois defrontamos, não um pacífico desenvolvimento de conceitos e teorias, senão um embate entre forças espirituais em conflito. A história da filosofia antropológica está cheia das mais profundas paixões e emoções humanas. Não se ocupa de um problema teórico isolado, por mais geral que seja seu âmbito; nela está em jogo todo o destino do homem, clamando por uma decisão final. Este caráter do problema encontrou sua expressão mais clara na obra de Agostinho, que se situa na fronteira entre duas épocas. Vivendo no quarto século da era cristã, cresceu na tradição filosófica grega e foi sobretudo o sistema neoplatônico que marcou toda sua filosofia. Por outro lado, porém, é o pioneiro do pensamento medieval; é o fundador da filosofia medieval e da dogmática cristã. Nas Confissões podemos seguir, passo a passo, seu caminhar da filosofia grega para a revelação cristã. De acordo com ele, toda a filosofia anterior ao advento de Cristo estava sujeita a um erro fundamental e se achava infestada por uma mesma heresia. O poder da razão era exaltado como o mais alto poder do homem. Mas o que o homem nunca poderia saber, enquanto não fosse iluminado por uma revelação divina especial, é que a própria razão é uma das coisas mais discutíveis e ambíguas do mundo. A razão não pode mostrar-nos o caminho para a claridade, a verdade e a sabedoria. Ela mesma é obscura em seu significado e sua origem está envolta em mistério — mistério que só a revelação cristã é capaz de solucionar! Para Agostinho, a razão não tem uma natureza simples e única, senão dupla e dividida. O homem foi criado à imagem de Deus; e no estado original, em que se viu, ao sair das mãos de Deus, era igual ao seu arquétipo. Porém, tudo se perdeu pela queda de Adão. A partir desse momento se obscureceu todo o poder original da razão, que, sozinha, entregue às suas próprias faculdades, jamais encontrará o caminho de volta. Não pode reconstruir-se nem retornar, por suas próprias forças, à pura essência anterior. Esta reforma só será possível, pela ajuda sobrenatural e poder da graça divina. É a nova antropologia, no entender de Agostinho, a que se mantém em todos os grandes sistemas de pensamento medieval. Mesmo Tomás de Aquino, discípulo de Aristóteles, que volta às fontes da filosofia grega, não se atreve a desviar-se deste dogma fundamental. Concede à razão humana um poder muito maior do que Agostinho; mas está convencido de que a razão não pode utilizar-se corretamente desses poderes se não for guiada e iluminada pela graça de Deus. Aqui chegamos a uma completa inversão de todos os valores sustentados pela filosofia grega. O que outrora parecia ser o mais alto privilégio do homem revela-se agora o seu perigo e tentação; o que constituía seu orgulho, agora se converte em sua mais profunda humilhação. O preceito estóico, segundo o qual o homem precisa obedecer e reverenciar seu princípio interior, o daemon que traz consigo, agora se reputa perigosa idolatria.

Seria impraticável continuar descrevendo aqui o caráter desta nova antropologia, analisar-lhe os motivos fundamentais e acompanhar-lhe o desenvolvimento. Mas, para compreender seu sentido podemos optar por um caminho diferente e mais curto. No princípio dos tempos modernos surgiu um pensador que deu a esta antropologia novo impulso e esplendor. Na obra de Pascal   encontrou ela sua última e, talvez, mais notável expressão. Pascal estava preparado para esta tarefa como nenhum outro escritor. Possuía um dom incomparável de elucidar as questões mais obscuras, de condensar e concentrar sistemas complexos e dispersos de pensamento. Nada parece impenetrável ao seu pensamento e à lucidez de seu estilo. Nele se unem todas as vantagens da literatura e da filosofia modernas, embora as utilize como armas contra o espírito moderno, o espírito de Descartes e sua filosofia. A primeira vista, Pascal parece aceitar todas as pressuposições do cartesianismo e da ciência moderna. Nada há na natureza capaz de resistir ao esforço da razão científica, pois nada existe que possa resistir à geometria. Foi curioso acontecimento na história das ideias que um dos maiores e mais profundos geômetras se convertesse em paladino extemporâneo da antropologia filosófica da Idade Média. Aos dezesseis anos, Pascal escreveu o tratado sobre seções cônicas, que abriu novo campo, rico e fecundo, ao pensamento geométrico. Não era ele apenas grande geômetra, mas filósofo; e, assim, não se contentava em absorver-se com problemas geométricos, desejando também compreender o verdadeiro uso, a extensão e os limites da geometria. Deste modo, viu-se levado a estabelecer a distinção fundamental entre o "espírito geométrico" e o "espírito agudo ou sutil". O espírito geométrico sobressai em todos os assuntos suscetíveis de uma análise perfeita — que podem ser divididos até seus primeiros elementos. (NOTA: Sobre a distinção entre l’esprit géométrique e l’esprit de finesse, compare o tratado de Pascal "De l’esprit géométrique" e Pensées de Pascal, editados por Charles Louandre, Paris, 1858, cap. IX, p. 231; nos trechos que se seguem cito a tradução inglesa de O. W. Wight, Nova Iorque, 1861) Parte de certos axiomas, extraindo deles inferências cuja verdade pode ser demonstrada por regras lógicas universais. A vantagem deste espírito consiste na clareza de seus princípios e na necessidade de suas deduções. Mas nem todos os objetos admitem tal tratamento. Existem coisas que, pela sua sutileza e infinita variedade, desafiam todas as tentativas de análise lógica. E se há alguma coisa no mundo que precisamos tratar desta segunda maneira, é o espírito do homem. O que caracteriza o homem é a riqueza e a sutileza, a variedade e a versatilidade de sua natureza. Por isto mesmo, a matemática nunca poderá vir a ser o instrumento de uma verdadeira doutrina do homem, de uma antropologia filosófica. É ridículo falar do homem como se se tratasse de uma proposição geométrica. Uma filosofia moral em termos de um sistema de geometria — uma Ethica more geométrico demonstrata — é para o espírito de Pascal um absurdo, um sonho filosófico. Nem a lógica ou a metafísica tradicionais estão em melhor posição para compreender e resolver o enigma do homem. Sua primeira e suprema lei é o princípio de contradição. O pensamento racional, o pensamento lógico e metafísico, só pode compreender os objetos que estão livres da contradição e possuem uma natureza e verdade coerentes. Entretanto, é precisamente esta homogeneidade que nunca encontramos no homem. Não é lícito ao filósofo construir um homem artificial; cumpre-lhe descrever um homem verdadeiro. Todas as chamadas definições do homem não serão mais do que mera especulação, enquanto não se basearem em nossa experiência sobre ele, dela tendo a confirmação. Não há outro caminho para se conhecer o homem a não ser o de compreender-lhe a vida e seu procedimento. Mas o que encontramos aqui desafia toda tentativa de inclusão numa fórmula única e simples. A contradição é o próprio elemento da existência humana. 0 homem não tem "natureza" — não é simples e homogêneo. É uma estranha mistura de ser e não-ser. Seu lugar fica entre estes dois pólos opostos.

Só existe, portanto, uma forma de abordarmos o segredo da natureza humana: a religião. Ela nos mostra que existe dualidade no homem — o homem antes e depois da queda; estava destinado à mais alta glória, mas foi destronado. Com a queda perdeu o poder e perverteram-se-lhe a razão e a vontade. Compreendida em seu sentido filosófico, no sentido de Sócrates, Epicteto   e Marco Aurélio, a máxima clássica "Conhece-te a ti mesmo" é, portanto, não só ineficaz mas também enganosa e errônea. O homem não pode confiar em si mesmo nem ouvir de si para si. Tem que guardar silêncio próprio a fim de ouvir uma voz superior e mais verdadeira. "Que será feito, então, de ti, ó homem! que indagas qual é tua verdadeira condição por meio de tua razão natural?. . . Conhece, pois, homem soberbo, que paradoxo és para ti mesmo. Humilha-te, razão impotente; emudece, natureza imbecil; aprende que o homem sobrepuja infinitamente o homem, e ouve de teu amo tua verdadeira condição, que ignoras. Ouve a Deus" (Pensées, cap. X, seç. 1).

O que aqui se expõe não pretende ser uma solução teórica do problema do homem. A religião não pode oferecê-la, e tem sido sempre acusada, por seus adversários, de obscura e incompreensível. Mas a censura se converte no mais alto louvor quando consideramos seu verdadeiro objetivo. A religião não pode ser clara e racional; conta-nos uma história obscura e sombria: a história do pecado e da queda do homem. Revela um fato para o qual não há explicação racional possível. Não podemos explicar o pecado do homem, pois não foi produzido nem exigido por nenhuma causa natural. Nem podemos explicar sua salvação, dependente de um ato inescrutável da graça divina. É dada e negada livremente; não há ação nem mérito humano que possam merecê-la. A religião, portanto, nunca pretende esclarecer o mistério do homem, apenas o confirma e aprofunda. O Deus de que ela fala é um Deus absconditus, um Deus oculto; por isso, até sua imagem, o homem, não pode deixar de ser mistério. O homem é também um homo absconditus. A religião não é "teoria" de Deus e do homem e das suas relações mútuas. A única resposta que recebemos da religião é que é vontade de Deus ocultar-se. "Então, estando Deus oculto, nenhuma religião que não nos diga que Deus está oculto é verdadeira; e nenhuma religião que não ofereça razão para isto é instrutiva. A nossa faz tudo isto: Vere tu es Deus absconditus (Idem, cap. XII, seç. 5). ... Pois a natureza é tal que, em toda a parte, indica um Deus perdido, tanto no homem quanto fora do homem" (Idem, cap. XIII, seç. 3). Por conseguinte, a religião, por assim dizer, é uma lógica do absurdo; pois só assim consegue entender a absurdeza, a contradição interior, o ser quimérico do homem. "Nada, por certo, nos impressiona tão rudemente quanto esta doutrina; e, todavia, sem este mistério, o mais incompreensível de todos, somos incompreensíveis para nós mesmos. O nó de nossa condição se retorce e remoinha nesse abismo; de sorte que o homem é mais inconcebível sem este mistério que este mistério é inconcebível para o homem" (Idem, cap. X, seç. 1).


Ver online : Ernst Cassirer