(Experience, Emerson1844)
Se descrevi a vida como um fluxo de humores, devo agora acrescentar que há em nós algo que não muda e que hierarquiza todas as sensações e estados de espírito. A consciência em cada homem é uma escala móvel, que ora o identifica com a Causa Primordial, ora com a carne de seu corpo — vida acima da vida, em graus infinitos. O sentimento de onde brota determina a dignidade de qualquer ato, e a questão nunca é o que você fez ou deixou de fazer, mas sob qual comando você agiu ou se conteve.
Fortuna, Minerva, Musa, Espírito Santo — esses são nomes curiosos, estreitos demais para abarcar essa substância ilimitada. O intelecto perplexo ainda deve se ajoelhar diante dessa causa que se recusa a ser nomeada — causa inefável, que todo gênio refinado tentou representar por algum símbolo enfático: Tales pela água, Anaxímenes pelo ar, Anaxágoras pelo pensamento (Nous), Zoroastro pelo fogo, Jesus e os modernos pelo amor. E a metáfora de cada um se tornou uma religião nacional. O chinês Mêncio não foi menos bem-sucedido em sua generalização: “Compreendo plenamente a linguagem”, disse ele, “e nutro bem meu vigor vasto e fluente.” — “Pergunto: o que você chama de vigor vasto e fluente?” — indagou seu interlocutor. “A explicação”, respondeu Mêncio, “é difícil. Esse vigor é supremamente grande e inflexível no mais alto grau. Nutra-o corretamente, sem feri-lo, e ele preencherá o vazio entre o céu e a terra. Esse vigor harmoniza-se com a justiça e a razão, e não deixa fome.”
Em nossa escrita mais rigorosa, damos a essa generalização o nome de Ser — e assim confessamos que chegamos tão longe quanto possível. Basta, para a alegria do universo, que não tenhamos alcançado um muro, mas oceanos intermináveis. Nossa vida parece menos presente do que prospectiva; não para os afazeres em que se esgota, mas como um indício desse vigor vasto e fluente. A maior parte da vida parece mero anúncio de faculdades; a informação nos é dada para não nos vendermos barato — pois somos grandiosos. Assim, em detalhes, nossa grandeza está sempre numa tendência ou direção, não numa ação. Cabe a nós acreditar na regra, não na exceção. É assim que se distingue o nobre do ignóbil.
Ao aceitarmos a orientação dos sentimentos, não é o que cremos sobre a imortalidade da alma ou coisas do gênero que importa, mas o impulso universal de crer — esse é o fato material principal na história do globo. Descreveremos essa causa como aquela que age diretamente? O espírito não é impotente nem carece de órgãos mediadores. Tem poderes abundantes e efeitos diretos. Sou explicado sem explicar, sou sentido sem agir, e até onde não estou. Por isso, todas as pessoas justas se satisfazem com seu próprio louvor. Recusam-se a se explicar e contentam-se em deixar que novas ações cumpram esse papel. Acreditam que nos comunicamos sem palavras e além delas, e que nenhuma ação correta nossa deixa de afetar nossos amigos, por mais distantes que estejam — pois a influência da ação não se mede em milhas.
Por que me afligiria se uma circunstância impedisse minha presença onde era esperado? Se não estou na reunião, minha presença onde estou deve ser tão útil à comunidade da amizade e da sabedoria quanto seria no outro lugar. Exerço a mesma qualidade de poder em todos os lugares. Assim avança o poderoso Ideal à nossa frente — nunca se soube que ele recuasse. Ninguém jamais teve uma experiência que o saciasse, pois seu bem sempre anuncia um melhor. Avante e avante!
Em momentos de libertação, sabemos que um novo quadro da vida e do dever já é possível; os elementos de uma doutrina da vida que transcenderá qualquer registro escrito já existem em muitas mentes ao seu redor. A nova declaração incluirá tanto os ceticismos quanto as fé da sociedade, e das descrenças surgirá um credo. Pois os ceticismos não são gratuitos ou sem lei — são limitações da afirmação, e a nova filosofia deve absorvê-los e fazer afirmações além deles, assim como deve incluir as crenças mais antigas.