Seja lá o que for que eu sou (Marco Aurélio)

Sorabji, 2006

Marco Aurélio usa a frase que Aristóteles às vezes utiliza para a matéria de uma coisa, “seja lá o que for que é tal e tal”, e fala como se, separado da mente governante, ele fosse apenas essa matéria, ou seja, carne e sopro. Na verdade, é completamente errado supor que algo seja apenas sua matéria. A forma ou organização faz toda a diferença, como Aristóteles sempre insistiu, ou então todos nós escreveríamos como Shakespeares, já que todos podemos produzir as letras do alfabeto. Marco não despreza a mente governante, mas também não lhe oferece libertação imortal do corpo. Ele apenas recomenda que se imagine e se acolha o eventual fim de sua escravidão ao corpo depreciado.

Marco Aurélio, Meditações 2.2:

Este “seja lá o que for que eu sou” (ho tipote eimi) é pedaços de carne e um pouco de pneuma e a parte governante. Despreze os pedaços de carne: sangue coagulado, fragmentos de ossos e uma teia, uma rede de tendões, pequenas veias, artérias. Considere também que tipo de coisa é o pneuma: uma corrente de ar, nem sempre a mesma, expelida e engolida novamente a cada hora. Então, em terceiro lugar, está a parte governante. Ponha de lado seus livros. Não se deixe mais levar. Não é concedido. Mas, como se já estivesse morrendo, pense nisto: você está velho. Não permita que esta parte controladora seja mais uma escrava. Não permita que os tendões a puxem com desejos egoístas. Não permita que seja perturbada pelo que foi determinado ou está presente, ou que suspeite do futuro.

,