LKCE
Temos alguma relutância em abordar essa questão, pois, para respondê-la adequadamente, seria necessário discutir toda a extraordinariamente prolífica literatura filosófica que se esforça para impor este ou aquele conteúdo a essa palavra nebulosa — o “panteísmo”. Tal discussão poderia facilmente assumir, na presente obra, as proporções de um tumor monstruoso. Por isso, remetendo o leitor a outro livro onde tentamos abordar pelo menos parte da questão, nos limitaremos a breves observações, dado que é difícil silenciar sobre esse problema controverso ao interpretar Silesius.
A resposta depende, obviamente, da definição do termo “panteísmo”. Essa definição não é arbitrária na medida em que queremos que essa palavra sirva como um instrumento que permita aos historiadores identificar e organizar de forma inteligível uma categoria de fenômenos previamente distinguida e suficientemente importante para merecê-lo. Por essa razão, rejeitamos a categoria “panteísmo” definida de tal forma que ela abranja as doutrinas que identificam Deus com o mundo visível e, consequentemente, que não permita, por exemplo, qualificar como panteístas aqueles que, mesmo dando à natureza o nome de Deus, distinguem entre um Deus in se e um Deus expresso nas coisas (atitude de Alexandre Koyré, formulada em seu estudo sobre Sebastian Franck). Um panteísmo assim compreendido diferencia pontos de vista que têm em comum apenas uma certa convenção terminológica, ou seja, o emprego do termo “Deus” para designar o conjunto das coisas. Por seu conteúdo, essas atitudes não diferem do materialismo tout court (chamar o mundo de “Deus” é o mesmo que simplesmente negar Deus), e não há razão para reservar-lhes uma denominação rica em associações de ideias históricas.
Também não identificamos o panteísmo com o misticismo, mesmo com essa variedade de misticismo heterodoxo que crê na transformação ontológica total da alma em Deus. Essa crença pode, de fato, ser associada — em doutrinas tanto dualistas quanto gnósticas ou maniqueístas em sua gênese — a uma dicotomia radical do mundo das coisas e do mundo divino, sendo o primeiro exclusivamente uma realidade negativa em relação a Deus, sua limitação, e não sua expressão ou manifestação. Não apenas, então, o sentido do conceito “panteísmo” estaria em flagrante desacordo com a etimologia da palavra e seu uso histórico, mas, além disso, a palavra em si seria inútil, visto que já nos acostumamos a organizar esse fenômeno com a ajuda de outros termos.
A categoria “panteísmo” é necessária para captarmos uma certa afinidade, que se pode intuir, entre doutrinas declaradamente opostas — a saber, doutrinas naturalistas e doutrinas espiritualistas — que pressupõem a presença de uma dependência existencial necessária, ligando em dupla reciprocidade e intencionalmente o absoluto indivisível e o conjunto de coisas finitas diferenciadas. (Evito recorrer a expressões como “presença imanente” ou “interioridade”, uma vez que a alusão que contêm à relação espacial de “inclusão” cria uma aparência enganosa de inteligibilidade; na verdade, não se sabe absolutamente do que se trata e qual deve ser o segundo membro da metáfora).
Sublinho as palavras que merecem atenção. A fé panteísta, portanto, pressupõe, em primeiro lugar, que o Ser absoluto não é composto de partes, que não é tributário do tempo e que é único (eventualmente, seus elementos, por exemplo as ideias, só poderão ser distinguidos em virtude de uma distinctio rationis). Em segundo lugar, que o mundo das coisas é de alguma forma dependente dele quanto ao seu ser (seja ele não a reunião de suas epifanias reais nem sua emanação, mas apenas o produto das tendências do espírito humano a tudo decompor). Em terceiro lugar, ela supõe que o absoluto confere uma espécie de unidade orgânica a todo o conjunto dos objetos, seja de tal forma que os faz emanar dele, com o propósito de autorrealização — como seu espelho ou sua emanação negativa, mas necessária —, seja de tal forma que os anima de um movimento dotado de finalidade, à imagem das enteléquias. Ela supõe, em quarto lugar, que o absoluto não relativizado, isto é, considerado de forma totalmente independente de suas ligações com as coisas, é idêntico ao nada.
Além da distinção real, nas doutrinas panteístas, entre a versão naturalista (Deus como “alma” do mundo material, como princípio vital, etc.: a “linhagem” Bernardino Telesio-Giordano Bruno) e a versão espiritualista (a materialidade como ilusão ou, antes, como fase da deidade tendendo à sua supressão), é possível, obviamente, fazer dentro do fenômeno “panteísmo” diversas divisões que se cruzarão, em função das diversas interpretações dos pontos enumerados acima. Assim, ao princípio da finalidade da livre criação, opõe-se uma visão da deidade absolutamente determinada em suas ações (o que, aliás, é uma diferenciação entre um panteísmo que atribui ao absoluto um certo grau de personalização, e outro onde, de Deus, subsiste apenas uma “razão impessoal”). Da mesma forma, à interpretação estática das ligações entre Deus e o mundo (a diferenciação das coisas como produto da percepção especificamente humana, a identidade de todo ser com o Ser primordial), opõe-se uma interpretação dialética (a realidade como a autolimitação livremente querida por Deus que, pela criação — a saber, pela alma humana finita —, realiza seu autoconhecimento).
No entanto, o que está invariavelmente presente nas doutrinas panteístas é a convicção de que o absoluto fora das coisas só é acessível ao conhecimento negativo e que, se as coisas não são suas “partes” (mas ou limitações, modos, ou ainda as formas nas quais se revela sua força criadora), ele também não é, por sua parte, um criador — um artesão ou um mago — que chama à vida, ex nihilo, criaturas dotadas de um ser autônomo e possuindo uma substância. Em vez disso, é através das coisas, ou seja, por meio dos espíritos humanos, que ele realiza, de alguma forma, um ato de autorreflexão e se volta para si (mesmo na interpretação “estática” que acabamos de evocar, esse tema está presente; é assim, por exemplo, que o amor do homem por Deus, na doutrina de Spinoza, é o amor de Deus em si mesmo dirigido para si).