Hadot (PHCI) – Ensino de Epicteto

PHCI

Já encontramos várias vezes, nas páginas anteriores, o nome de Epicteto, e isso não é de espantar, pois ele é evocado repetidamente nas Meditações. Marco Aurélio expressa sua gratidão a Rústico, seu mestre no estoicismo, por ter-lhe comunicado as anotações feitas nas aulas de Epicteto; além disso, ele cita explicitamente várias vezes textos deste último e o coloca no mesmo patamar dos maiores mestres aos olhos dos estoicos (VII,19,2): “Quantos homens, como Crisipo, como Sócrates, como Epicteto, a eternidade engoliu!”

Isso porque, de fato, Epicteto é então o grande filósofo. Toda a literatura do século II evoca sua figura e seu ensinamento, e até o fim da Antiguidade ele permanecerá um modelo para os filósofos. O escritor latino Aulo Gélio, que estudou em Atenas, evoca uma conversa a que assistiu nessa cidade: o retórico Herodes Ático citava um texto das Discursos de Epicteto, reunidos por Arriano. Ele nos informa também que, em outra conversa, o filósofo Favorino havia relatado diversas palavras do mestre. O próprio Aulo Gélio havia encontrado em um barco outro filósofo que, tirando de sua sacola de viagem as Discursos, havia-lhe lido uma passagem. E, em outros lugares nessas Noites Áticas de Aulo Gélio, encontram-se alusões a detalhes da vida de Epicteto: sua condição inicial de escravo, sua expulsão de Roma pelo imperador Domiciano e sua instalação em Nicópolis. Luciano, o escritor satírico que também viveu sob Marco Aurélio, conta que um admirador comprou por 3.000 dracmas “a lâmpada de argila do estoico Epicteto”. “Ele esperava, sem dúvida”, observa Luciano, “que, lendo à noite à luz dessa lâmpada, a sabedoria de Epicteto lhe viria imediatamente durante o sono e que ele se pareceria com aquele admirável ancião.” Galeno, o médico de Marco Aurélio, alude a um diálogo de Favorino de Arles dirigido contra Epicteto e que ele mesmo havia refutado. Mesmo cristãos, como Orígenes, que escreve no século III, falam com respeito desse filósofo.

Epicteto nasceu no século I d.C., em Hierápolis, na Frígia (Pammukale na atual Turquia). Na segunda metade do século, ele foi levado a Roma como escravo de um liberto de Nero, Epafrodito, de quem Epicteto fala várias vezes nas Discursos. Seu mestre permitiu-lhe seguir as aulas do filósofo estoico Musônio Rufo, que teve grande influência sobre ele, cujas palavras ele frequentemente relata em suas Discursos e descreve assim o ensinamento (III,23,29): “Cada um de nós, sentado ao lado dele, imaginava que suas faltas lhe haviam sido reveladas, tanto ele tocava com o dedo nosso estado atual, tanto ele punha sob os olhos de cada um suas misérias.” Liberto por Epafrodito, Epicteto abriu por sua vez uma escola de filosofia em Roma, mas foi expulso de Roma, com todos os filósofos, pelo imperador Domiciano em 93-94. Ele então se estabeleceu na costa grega, em Nicópolis, no Épiro, cidade que servia de porto de embarque para a Itália, e ali abriu uma nova escola de filosofia. O neoplatônico Simplício conta que ele era tão pobre que a casa onde vivia em Roma não precisava de fechadura, não contendo outro móvel além da esteira e da colcha sobre as quais dormia. O mesmo autor relata que ele havia adotado um órfão e levado consigo uma mulher para criá-lo. Mas ele nunca se casou. A data exata de sua morte não é conhecida.

Epicteto não escreveu nada. Só podemos ter uma ideia de seu ensinamento graças a Arriano de Nicomédia, um estadista que, em sua juventude, por volta de 108, havia seguido suas lições em Nicópolis, e que publicou as “notas” que havia tomado em suas aulas. Esse Arriano de Nicomédia é uma personalidade cativante. Sublinhemos desde já que seus contemporâneos o consideraram um filósofo. Inscrições dedicadas a ele em vida em Corinto e Atenas o designam por esse nome. O historiador Cássio Dio parece ter escrito uma “Vida de Arriano, o filósofo”. Efetivamente, Arriano deixou obras filosóficas. Já evocamos suas notas que relatam os Discursos ou Conversas de Epicteto. A isso devemos acrescentar uma pequena obra que teve uma importância ainda maior na história do pensamento ocidental, refiro-me ao que é chamado em português de Manual de Epicteto, em grego Encheiridion. A palavra Encheiridion (“aquilo que se tem à mão”) alude a uma exigência da vida filosófica estoica, exigência à qual Marco Aurélio quis responder ao redigir suas Meditações: ter “à mão”, em qualquer circunstância da vida, os princípios, os “dogmas”, as regras de vida, as fórmulas que lhe permitirão se colocar na boa disposição interior para agir bem ou para aceitar seu destino. O Manual é uma seleção de textos extraídos dos Discursos de Epicteto. É uma espécie de antologia das máximas mais marcantes, as mais capazes de iluminar o filósofo em sua ação. Parece que Arriano também escreveu uma obra sobre os fenômenos celestes, ou seja, sobre o que na Antiguidade se chamava meteorologia. Mas, na Antiguidade, um filósofo não era uma personagem que escrevia obras de filosofia, era alguém que levava uma vida de filósofo. Tudo leva a crer que Arriano, embora permanecendo um estadista, como Rústico, o mestre de Marco Aurélio, se esforçou para viver como filósofo. O fim de seu prefácio aos Discursos de Epicteto o sugere: ele quis, ao publicá-los, produzir em seus leitores o mesmo efeito que Epicteto falando aos seus ouvintes, elevá-los para o bem. Seu modelo era, aliás, aquele famoso discípulo de Sócrates, Xenofonte, que, ele também, teve uma carreira política e militar, assim como literária. Ele queria ser chamado de “novo Xenofonte”. Ele o imita em seu estilo, no assunto de suas obras: como Xenofonte, ele escreve um tratado de caça, mas sobretudo essas Conversas que são, de certa forma, as Memoráveis desse novo Sócrates que é Epicteto. Não se tratava certamente para ele apenas de um modelo literário, mas de um modelo de vida, o do filósofo em ação. Dois séculos depois, o filósofo Temístio elogiará precisamente Júnio Rústico e Arriano dizendo que eles abandonaram os livros e se colocaram a serviço do bem comum, não só como Catão e outros romanos, mas sobretudo como Xenofonte e o próprio Sócrates. Para Rústico e Arriano, continua Temístio, a filosofia não parou na tinta e na pena: eles não se contentaram em escrever sobre a coragem, e não se esquivaram do dever de servir aos interesses da cidade. Efetivamente, Arriano levou uma brilhante carreira de estadista: foi notadamente procônsul da província da Bética por volta de 123, cônsul sufecto em 129 ou 130, governador da Capadócia de 130 (ou 131) a 137 (ou 138); ele então repeliu, em 135, uma invasão dos Alanos, inspecionou as costas do Mar Negro e relatou essa viagem ao imperador Adriano.

Em seu prefácio, dirigido a seu amigo Lúcio Gélio, Arriano explica a maneira como reuniu as notas tomadas nas lições de Epicteto: “Eu não as redigi de maneira literária, como se poderia fazer para discursos desse tipo, e não as publiquei eu mesmo, já que precisamente não as redigi.” Na Antiguidade, em princípio, só se entregava ao público, seja por leitura pública, seja entregando o texto aos livreiros, obras cuidadosamente redigidas, segundo as regras de composição e estilo. “Mas tudo o que ouvi enquanto ele falava, tudo isso eu me esforcei para escrever, com as mesmas palavras que ele empregava, a fim de conservar para mim, para o futuro, ‘notas que me permitissem recordar’ (hypomnémata) de seu pensamento e de sua franqueza. Assim, como é natural, essas notas têm a aparência de uma conversa espontânea de homem para homem e de forma alguma de uma redação destinada a encontrar leitores mais tarde.” Arriano quer dizer que reproduziu o máximo possível a espontaneidade da exortação ou do diálogo, e ele explica assim por que usou de ponta a ponta da obra a linguagem popular (koiné) em vez de empregar o estilo literário, como em seus outros livros. E ele continua: “Não sei como notas, que se encontravam nesse estado, puderam cair no domínio público contra minha vontade e sem meu conhecimento.” Provavelmente aconteceu a Arriano o que também aconteceu ao médico Galeno. Notas de aula, comunicadas a amigos, foram, pouco a pouco, copiadas nos meios mais diversos e assim praticamente “publicadas”. “Para mim não é um problema, se eu for considerado inapto para redigir uma obra.” Aqui, Arriano se revela um bom aluno de Epicteto, ao desprezar a glória literária. “E quanto a Epicteto, também não é grande coisa, se é verdade que ele desprezava os discursos; pois quando falava, não desejava nada além de colocar em movimento para as coisas melhores os pensamentos de seus ouvintes. Se é a isso precisamente que esses discursos chegam, eles produzirão sem dúvida o efeito que devem produzir os discursos dos filósofos; caso contrário, que, ao menos, aqueles que os lerem saibam que, quando o próprio Epicteto os pronunciava, era necessário que aquele que os ouvia experimentasse o que esse homem queria que ele experimentasse. E se esses discursos não produzem esse efeito, talvez eu seja o responsável, talvez também seja necessário que assim seja?”

Não entraremos em detalhes nas discussões que este prefácio suscitou entre os historiadores. Alguns pensaram que Arriano nos preservou, em sua obra, as próprias palavras de Epicteto, capturadas por taquigrafia. Segundo outros, pelo contrário, Arriano, querendo imitar as Memoráveis de Xenofonte, teve, de fato, uma atividade de redação muito mais extensa do que ele diz na carta a Gélio e que ele frequentemente reconstituiu as palavras de Epicteto, sendo a forma literária muito mais refinada do que Arriano quer admitir. Seja como for, a menos que se suponha que Arriano fosse capaz de desenvolver ele mesmo um discurso filosófico original e atribuí-lo a Epicteto, somos obrigados a admitir que, em sua essência, a obra de Arriano tem uma relação estreita com o ensinamento vivo de Epicteto.

No entanto, não se deve pensar, como a maioria dos historiadores e comentaristas, que todo o ensinamento de Epicteto está contido nas Conversas redigidas por Arriano. Percebemos, de fato, ao lê-los, que há alusões a partes do curso que não foram relatadas por ele. Como bem demonstrou Souilhé, a parte mais importante do curso de Epicteto, como era o caso para todos os cursos de filósofos pelo menos a partir do século I d.C., era dedicada à leitura e à explicação dos textos dos fundadores da escola, ou seja, para os estoicos, Zenão e Crisipo. O mestre explicava esses textos, mas às vezes também era o papel dos ouvintes. Arriano não reproduziu absolutamente nada dessa parte técnica da atividade pedagógica de Epicteto. Mas ele às vezes fez alusão a ela. Ele relata assim uma cena onde um dos alunos de Epicteto está explicando um texto estoico relacionado ao problema lógico dos silogismos sob a direção de um aluno mais avançado (1,26,13); ele evoca da mesma forma Epicteto acordando pela manhã e pensando na maneira como ele dirigirá, durante sua aula, o exercício de explicação de texto (1,10,8).

Portanto, essa parte das aulas que consistia na “leitura”, que será a lectio da Idade Média, depois se tornará nossa “lição”, e que era então a parte essencial do ensino, está totalmente ausente das Discursos de Epicteto. Mas o que eles nos conservam é o que poderíamos chamar de parte não técnica do curso. Se, como dissemos, todos os cursos de filosofia comportavam, desde pelo menos o início do século I, uma parte essencial que era a explicação de texto, eles também podiam terminar com um momento de livre discussão entre os ouvintes e o filósofo. Escrevendo algumas dezenas de anos depois de Arriano, Aulo Gélio conta, a propósito de seu mestre platônico, que este frequentemente tinha o hábito, após a explicação de texto, após a lectio, de propor a seus ouvintes que o interrogassem sobre um tema de sua escolha. As Discursos redigidas por Arriano correspondem, portanto, a esses momentos mais descontraídos onde o mestre dialoga com seus ouvintes ou desenvolve algumas observações que julga úteis para a prática da vida filosófica.

Este ponto é muito importante de ressaltar, pois significa que não se pode esperar encontrar nas Discursos de Epicteto, redigidas por Arriano, exposições técnicas e sistemáticas do conjunto da doutrina estoica. Mas isso não significa que, na parte de seu curso dedicada ao ensino teórico, Epicteto não abordava, graças à explicação de texto, o sistema estoico em seu conjunto. Não se deve dizer que, das três partes da filosofia estoica, a física, a lógica e a ética, Epicteto ignora a física, ou seja, para uma certa parte dessa disciplina, a descrição dos fenômenos físicos. Pois não sabemos de forma alguma quais textos estoicos ele fazia ler durante suas aulas e a explicação que ele dava. Só se pode dizer que ele não evoca os problemas de física nas conversas com seus discípulos que nos foram conservadas. Parece, como vimos, que o próprio Arriano escreveu um livro sobre os cometas, obra que infelizmente está perdida. Se isso é verdade, isso sugere que ele havia sido iniciado por Epicteto no tratamento filosófico desse tipo de questão. A maneira como Fócio descreve o conteúdo da obra nos permite até ver como Arriano havia retido as lições de Epicteto, ou seja, o significado moral que se devia atribuir às pesquisas de física: “Arriano, que escreveu uma pequena obra sobre a natureza, a formação e o aparecimento dos cometas, se esforça para mostrar, em muitas discussões, que os aparecimentos desse tipo não pressagiam nada nem de bom nem de mau.” Seja como for, teremos que retornar à ideia que Epicteto tinha da divisão das três partes da filosofia. Digamos por enquanto que seria totalmente falso concluir, a partir do conteúdo atual das Discursos, que houve um empobrecimento do ensino teórico no estoicismo tardio. Em primeiro lugar, como dissemos, as Discursos nos relatam, e certamente de uma maneira muito fragmentada, apenas a parte do curso que, por definição, não é teórica e técnica. Em segundo lugar, elas são o eco apenas das palavras que Arriano ouviu durante um ou dois anos, durante sua estadia em Nicópolis. Ora, Epicteto ensinou por vinte e cinco ou trinta anos! Finalmente, não se deve esquecer que apenas os quatro primeiros livros da obra nos foram conservados. Um ou vários livros estão de fato perdidos: Aulo Gélio cita uma longa passagem do livro V. Pode-se vislumbrar também, graças a Marco Aurélio, a existência de textos que, por outro lado, nos são desconhecidos. Vê-se, portanto, que as Discursos, tal como nos chegaram, não nos permitem absolutamente formar uma ideia de tudo o que Epicteto disse, muito menos do que ele não teria dito.

Sabemos, pelo primeiro livro das Meditações (cap. 7), que Marco Aurélio conheceu Epicteto graças a Júnio Rústico, que lhe ensinou a doutrina estoica antes de se tornar um de seus conselheiros. Marco Aurélio nos diz que Rústico lhe comunicou seu exemplar pessoal dos hypomnémata de Epicteto (ou seja, das anotações feitas em suas aulas). Pode-se interpretar essa afirmação de duas maneiras. Pode-se pensar, em primeiro lugar, que se trata de um exemplar da obra de Arriano. Vimos que, na carta a Lúcio Gélio, da qual falamos acima, o próprio Arriano apresentava sua obra como hypomnémata, anotações que serviam de auxílio à memória. Essa carta dirigida a Lúcio Gélio foi escrita provavelmente após a morte de Epicteto, por volta de 125-130. O livro foi provavelmente difundido por volta de 130. Aulo Gélio nos conta que, no ano em que estudava em Atenas, por volta de 140, ele assistiu a uma discussão durante a qual o famoso bilionário Herodes Ático havia trazido da biblioteca um exemplar do que Aulo Gélio chama de dissertationes de Epicteto organizadas (digestae) por Arriano. Ele conta também que, navegando de Cassiopeia para Brindisi, ele havia encontrado um filósofo que tinha essa obra em sua sacola de viagem, e mais precisamente ainda que este lhe havia lido uma passagem do livro V, agora desaparecido. Marco Aurélio pôde, portanto, ler graças a Rústico um exemplar das Discursos redigidas por Arriano, e um exemplar mais completo do que o que conhecem nossas edições de hoje.

Pode-se considerar outra hipótese, que foi proposta por Farquharson. As anotações que Rústico comunicou a Marco Aurélio seriam as próprias anotações de Rústico, tomadas durante as aulas de Epicteto. Do ponto de vista cronológico, se admitirmos que Epicteto morreu por volta de 125-130 d.C., e que Rústico nasceu no início do século II (como se pode supor por seu cursus oficial), é perfeitamente possível que ele tenha sido aluno de Epicteto por volta de 120. Além disso, é dificilmente concebível que um exemplar das Discursos de Epicteto redigidas por Arriano não tenha existido em Roma por volta de 145-146, na época em que Marco Aurélio se converteu à filosofia, já que a obra era difundida na Grécia por volta de 140. Ora, Marco Aurélio apresenta esse presente de Rústico como algo excepcional. Pode-se, portanto, perguntar se não se trata das próprias anotações de Rústico. Se assim fosse, essas anotações de Rústico poderiam revelar a Marco Aurélio um Epicteto diferente do de Arriano. Pois Epicteto certamente não proferia as mesmas palavras, todos os anos, a seus ouvintes.

De qualquer forma, é quase certo que Marco Aurélio leu a obra de Arriano, pois existem nas Meditações várias citações literais que dela provêm.

Mas, quer Marco Aurélio tenha lido apenas as Discursos redigidas por Arriano, quer tenha lido também as anotações de Rústico, uma coisa é certa: ele conhecia mais textos relacionados às aulas de Epicteto do que nós conhecemos. Não possuímos, de fato, senão uma parte da obra de Arriano e, além disso, as anotações de Rústico, se existiram, poderiam ter-lhe revelado outros ensinamentos de Epicteto que aqueles que Arriano havia relatado. Graças a Marco Aurélio, teremos que repetir, temos acesso a alguns fragmentos de Epicteto que são desconhecidos por outros meios.

,