Schelling (PM) – Tao Te Ching
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Podemos considerar a doutrina de Lao-Tsé (Lao-Kium) sob uma perspectiva completamente diferente; ela é efetivamente especulativa num sentido totalmente distinto da moral política de Confúcio. Ambos (Confúcio e Lao-Tsé) foram contemporâneos, viveram no século VI antes de Cristo. Enquanto Confúcio se esforçava para reduzir toda teoria e sabedoria às bases antigas do Estado chinês, Lao-Tsé penetrava de maneira absolutamente incondicional e universal nas profundezas do ser.
De tudo o que Rémusat afirmou sobre Lao-Tsé e sua doutrina, nada se mostrou correto desde que seu livro — sobre o qual, eu mesmo, por exemplo, nunca havia realmente renunciado a formar uma opinião própria — nos foi tornado acessível graças aos esforços de Stanislas Julien, numa tradução francesa acompanhada de notas e comentários que ao mesmo tempo nos convencem da consciência do tradutor — compreensível não certamente por qualquer um, mas por quem penetrou ele mesmo nas profundezas da filosofia.
Ora, aparece então que a doutrina do Tao é tão perfeitamente imaginada e pensada no espírito do Extremo Oriente que não se descobre nela nenhum traço de sabedoria ocidental, nem mesmo do modo de pensar e da sabedoria — eu não diria greco-pitagórica — mas mesmo sírio-palestina ou apenas indiana. Tao não significa razão, como se traduziu até agora, nem doutrina do Tao significa doutrina racional. Tao significa porta, a doutrina do Tao a doutrina da grande porta sobre o ser, do não-ser (Nichtseyende), daquilo que simplesmente pode ser, pelo qual todo ser finito acede ao ser efetivo. (lembrem-se das fórmulas inteiramente semelhantes que usamos para a primeira potência.)
A grande arte ou a grande sabedoria da vida é reservar esse poder (Können) límpido que é um nada, mas ao mesmo tempo tudo. O Tao-Te-Ching gira inteiramente em torno de uma coisa: mostrar, por uma grande variedade de fórmulas muito engenhosas, esse grande poder (Macht) insuperável do não-ser (nicht Seyende). Lamento muito não poder descer às profundezas e aos detalhes, em parte porque o tempo me é limitado, em parte porque a exposição de um fenômeno puramente filosófico como a doutrina do Tao, ainda que do mais alto interesse, não entra no círculo de nossa presente pesquisa.
Uma única observação ainda: a doutrina do Tao não é um sistema acabado, que busca dar por exemplo a chave detalhada da gênese das coisas; ela é antes “explicação” de um princípio, mas em suas diversas formas, e da doutrina prática construída sobre esse princípio. Os adeptos do Tao são chamados Tao-Tsé, mas já se pode concluir da natureza da coisa que eles não são numerosos nem poderosos, e são considerados pelos adeptos prosaicos de Confúcio como extáticos, místicos, etc.
