O heroico é mudo
(FRER:95)
Pois aí está o distintivo do Si, o selo de sua grandeza como o estigma de sua fraqueza: ele se cala. O herói trágico só possui uma linguagem que o corresponde perfeitamente: o silêncio, precisamente. Assim é desde o início. O trágico forjou, por essa mesma razão, a forma estética do drama que permite representar o silêncio. Na poesia narrativa, o silêncio é a regra, enquanto a poesia dramática só conhece a palavra, e apenas então o silêncio se torna eloquente. Ao se calar, o herói rompe os laços que o ligam a Deus e ao mundo e se arranca das paisagens da personalidade, que pela palavra traça seus limites e se individualiza frente aos outros, para se erguer na solidão gelada do Si. Pois o Si nada sabe além de si mesmo, ele é simplesmente solitário. Como manifestaria em si mesmo sua solidão, esse desafio rígido, senão se calando? E é exatamente isso que ele faz nas tragédias de Ésquilo, como os contemporâneos já haviam notado. O heroico é mudo. Se os grandes silêncios dos personagens de Ésquilo, que duram um ato, não aparecem mais entre seus sucessores, esse ganho em “naturalidade” é pago com uma maior perda de força trágica. Pois não é de forma alguma verdade que os heróis mudos de Ésquilo encontrariam em Sófocles e Eurípides a linguagem de seu Si trágico. Eles não aprendem a falar, apenas a discutir. Então, é essa arte de disputar no diálogo dramático que invade tudo e que hoje nos lança seu sopro desesperadamente gélido: em incontáveis voltas e desvios, expõe-se o conteúdo da situação trágica de tal modo que se entenda, roubando assim o olhar do que é propriamente trágico, o Si que desafia além de todas as situações, até que um desses monólogos líricos, aos quais a presença do coro nunca deixa de dar oportunidade, coloque novamente o trágico no centro. A enorme importância dessas partes líricas e musicais na economia do conjunto dramático reside precisamente no fato de que os atenienses não encontraram no registro propriamente dramático, no diálogo, a forma para expressar o heroico e o trágico. Pois o heroico é vontade, e o diálogo ático é, para usar a expressão do mais antigo teórico, o próprio Aristóteles, “dianoético” — debate pertencente ao intelecto.
