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Reflexão sobre o possível, em Lavelle

(Reflexão sobre Lavelle, Gaboriau5)

À parte o primeiro parágrafo, que supõe Deus como conhecido, e que procede, portanto, de um método para nós inaceitável (porque globalmente ineficaz), todas as considerações que vêm em seguida — e que poderiam muito bem vir antes — são profundamente justificadas.

Os “possíveis”, no sentido lavelliano, não são o efeito da nadificação do ser: eles também pertencem ao domínio do ser (analogicamente). Anterioridade do ser (existência) sobre a essência: o possível é real de certa forma antes que sua realização “determine” exatamente a essência. (Cf. NIP 4, p. 183 ss.).

De certa forma, “a essência tem mais valor que a existência”: sim aos olhos da razão, porque ela é, de fato, em verdade, o valor que deve justificar a existência; é para ela que a existência tende, para adquiri-la ou fazê-la participar, mas a existência, como tal, nunca se reduz ao que ela é a cada vez. — Cf. aqui mesmo, carr. 26, p. 481.

A “má-fé” constitucional é a impossibilidade de jamais coincidir consigo mesmo, não identidade relativa de si a si, consciência de si como de um não-ato-puro. “Ambiguidade da consciência”, de ordem ontológica mais que moral, mas que abre a porta à possibilidade de uma duplicidade, de uma complicação, que a simplicidade do Ato-Puro exclui ontologicamente. “Deus”, já que é assim que o chamam, não conhece essa insatisfação de si: para nós, em contrapartida, que nunca somos bem o que somos, precisamente por causa dessa não identidade absoluta, o ser-que-sou-atualmente avizinha-se, num único e mesmo sujeito, com o dever-e-poder-ser-outro.

A relação de mim a ti e a ele (ou ela). Em Sartre, é simples: a dialética é a de dominante a dominado, de mestre a escravo. Oscilação entre um “eu” que considera o outro como objeto, e um eu que, por sua vez, sabendo que o outro também pode dizer “eu”, sente que se encontra rebaixado à categoria de objeto, ou de instrumento à disposição. Penetrante análise do que se “pratica” de fato, na existência de muitos: o outro utilizado, enquanto apraz ao eu servir-se dele, depois rejeitado como um despojo ou um farrapo, no momento mesmo em que esse farrapo humano o encara por sua vez com um olhar que o relega à categoria de objeto. Outra interpretação, a de Lavelle: a relação entre humanos (entre mim e ti) deve ser — dado o que é “cada um” — de uma dialética onde se estabelece entre os sujeitos a comunicação iniciada primeiro no nível dos objetos — para ir “finalmente” ao nível do “ser”. Assim, quem não ama “metafisicamente” não ama realmente. Essa maneira de amar — por superação na linha da “razão” — ele porque é ele, ela porque é ela, tem apenas uma relação distante com uma maneira de amar desarrazoadamente.

Nascido do desejo idólatra, decepcionado por seu objeto, o desespero vem do fato de não se ter sabido tomar o caminho do sujeito, em direção ao Sujeito Supremo — do qual se trata no fundo em toda parte, e cuja “revelação não se interrompe” jamais. Ele vem sobretudo da morte que humilha cada um.

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