Praxis (Castoriadis)
Castoriadis1975
Chamamos de praxis este fazer no qual o outro ou os outros são visados como seres autônomos e considerados como o agente essencial do desenvolvimento de sua própria autonomia. A verdadeira política, a verdadeira pedagogia, a verdadeira medicina, na medida em que algum dia existiram, pertencem à praxis.
Existe na praxis um por fazer, mas esse por fazer é específico: é precisamente o desenvolvimento da autonomia do outro ou dos outros (o que não é o caso das relações simplesmente pessoais, como a amizade ou o amor, onde esta autonomia é reconhecida porém seu desenvolvimento não é colocado como um objetivo à parte, porque essas relações não têm finalidade exterior à própria relação). Poderíamos dizer que para a praxis a autonomia do outro ou dos outros é, ao mesmo tempo, o fim e o meio; a praxis é aquilo que visa o desenvolvimento da autonomia como fim e utiliza para este fim a autonomia como meio. Essa maneira de falar é cômoda, porque facilmente compreensível. Mas ela é, rigorosamente falando, um abuso de linguagem, e os termos fim e meio são absolutamente inadequados neste contexto. A praxis não pode ser reduzida a um esquema de fins e de meios. O esquema do fim e dos meios pertence precisamente à atividade técnica, pois esta tem relação com um verdadeiro fim, um fim que é um fim, um fim finito e definido que pode ser estabelecido como um resultado necessário ou provável, em vista do qual a escolha dos meios se reduz a uma questão de cálculo mais ou menos exato; com este fim, os meios não têm nenhuma relação interna, simplesmente uma relação de causa e efeito ].
Mas na praxis a autonomia dos outros não é um fim, ela é, sem jogo de palavras, um começo, tudo o que quisermos, menos um fim; ela não é finita, não se deixa definir por um estado ou características quaisquer. Existe relação interna entre o que é visado (o desenvolvimento da autonomia) e aquilo por que ele é visado (o exercício desta autonomia), são dois momentos de um processo; finalmente, desenvolvendo-se num contexto concreto que a condiciona e devendo levar em consideração a rede complexa de relações causais que percorrem seu domínio, a praxis jamais pode reduzir a escolha de sua maneira de operar a um simples cálculo; não que este fosse muito complicado, mas porque, por definição, deixaria escapar o fator principal — a autonomia.
