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blondel:blondel-1928-cogito-equivoco

Blondel (1928) – Cogito equívoco

(Blondel1928)

Ao constatar que, por outro lado, se apegavam à sensação ou ao próprio Cogito equívoco, como se fossem realidades cortadas a faca e estabilizadas, eu não podia deixar de ver nisso um pseudo-concreto, abstrações artificialmente solidificadas: de modo que toda a nossa psicologia e toda a nossa metafísica me pareciam estar mal fundamentadas, baseadas em entidades tomadas como coisas, ou em coisas tomadas como seres. E quando lia em Ravaisson que «Descartes viu a realidade como que a nu», eu sentia dolorosamente o quanto essa visão é insuficiente, o quanto essa realidade é mutilada. Era algo artificial, e eu queria o vivo. (Itinéraire philosophique, 41-42)

Ousarei declarar que, apesar de esforços seculares e de prodígios parciais de engenhosidade feliz (…), a análise filosófica do pensamento permaneceu, em sua essência, no ponto em que estava a química pseudo-ontológica de Tales, Anaxímenes e Heráclito, quando discutiam sobre os princípios do mundo e os elementos da natureza: a água (que é uma síntese), o ar (que é uma mistura), o fogo (que não é um elemento, nem, a rigor, um corpo). Durante mais de dois milênios, exaurimo-nos em pesquisas nesse beco sem saída, fora do qual as falsas invenções sucessivas, como a do flogistico, não nos fizeram avançar um passo. Pois bem, em muitos aspectos, a filosofia do Cogito (assim como a dos átomos, a do positivismo ou a da relatividade, às quais, no entanto, ela pretende se opor e remediar), persiste em tal impasse; e, apesar de múltiplas tentativas de «elementar a ciência do espírito», como diziam os contemporâneos dos ideólogos no século XVIII, essa pretensa ciência do pensamento, esse psicologismo ou essa ideografia ainda está no estágio de artifícios nocionais tomados como princípios reais, generalidades inoperantes que nem mesmo são explicativas, abstrações engenhosamente arranjadas em fórmulas e sistemas, como soluções rotuladas na oficina de um alquimista.

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