Archambault (1941) – Blondel, o objeto da metafísica
Archambault1941
Quando, graças às percepções dos nossos sentidos, aos mecanismos do instinto, aos ensinamentos da experiência, interpretados por uma reflexão elementar, conseguimos, de um jeito ou de outro, conquistar nosso pequeno lugar no universo; — quando as diversas ciências nos deram um primeiro conhecimento da natureza, das suas leis, dos meios de que dispomos para colocá-la a nosso serviço; — quando até mesmo as reações da nossa sensibilidade e os pressentimentos da nossa consciência nos fizeram vislumbrar, por trás das coisas, o mundo superior do verdadeiro, do belo e do bem; — duas questões permanecem sem resposta, pois ainda não encontramos a possibilidade de resolvê-las: — Tudo isso se conecta e onde? Como esse conjunto de dados pode receber uma forma de organização e unidade? — O que fazemos no meio desse universo de objetos, nós, sujeitos pensantes, sensíveis e atuantes? Que destino nos espera? Como devemos e podemos corresponder a esse destino? A filosofia — e a metafísica é como a parte propriamente filosófica dela — é uma tentativa de resposta a essas duas questões. Tradicionalmente, de fato, seu esforço apresenta esse duplo aspecto (P. d. d. II, p. 226-249; P. II, p. 188 e seg.; A. I, p. 283-284):
1° UMA TENTATIVA DE EXPLICAÇÃO TOTAL.
Por um lado, uma síntese racional, uma tentativa de explicação total. A filosofia começa onde, em vez de se prender a dados parciais, a problemas particulares, o pensamento lida com o princípio do qual tudo depende, com o problema central que comanda todos os outros.
2° UMA RESPOSTA AO PROBLEMA DO DESTINO.
Por outro lado, uma resposta ao problema do destino e uma contribuição para sua realização efetiva, por meio de uma luz e uma força novas proporcionadas à alma, permitindo uma condução da vida mais lúcida e corajosa. Segundo a etimologia, como para a voz popular, o filósofo é o sábio, aquele que pratica a sabedoria por si mesmo e ajuda os outros a praticá-la. Nunca essas duas preocupações — uma propriamente intelectual, a outra mais moral e espiritual — aparecem completamente separadas. Elas tendem a se unir como matéria e forma. Entre todos, é típico o caso de Spinoza, vertendo «a ciência ética da salvação em um conteúdo geometricamente racional». Na realidade, porém, não é fácil associá-las de maneira coerente, e poucas doutrinas conseguiram fazê-lo perfeitamente — umas se apegando a definições e conexões de conceitos que não deixam muito espaço para a experiência pessoal e pretendem reger de cima a prática por meio de teorias concebidas fora dela; — outras se limitando a observações, ou mesmo a exortações, que carecem da sanção de uma justificação racional rigorosa. Primeira manifestação de uma dualidade, de uma fissura que encontraremos ao longo do desenvolvimento do pensamento: retrospectiva e prospecção; conhecimento racional e conhecimento real; verdade impessoal e salvação humana. Sem esperar tapar o buraco, é preciso tentar aproximar as bordas. Isso pode nos levar a praticar simultaneamente: — uma metafísica ascendente que, a partir das nossas experiências e inquietações humanas, tais como se apresentam à observação comum do psicólogo e do moralista, nos conduz pouco a pouco ao objeto próprio para nos iluminar e nos apaziguar; — uma metafísica descendente que se esforça para conquistar diretamente esse objeto, por meio de procedimentos tecnicamente definidos, a fim de nos fornecer imediatamente um centro de perspectiva, um princípio de orientação e explicação. Essa distinção aparece particularmente clara entre o segundo e o primeiro volume de A Ação em sua redação definitiva — um dedicado a «especificar a natureza essencial da ação», o outro a «examinar o exercício ou recolher a lição da ação efetiva» (A. I, p. 26-27, 292).
