Agostinho da Silva – Utilidade
Silva2019
Aqui se põe uma questão prévia, que você terá de resolver: qual é o seu critério de utilidade? Sabemos, pela escassa experiência histórica e pela ainda mais reduzida experiência pessoal que é a nossa, que nem sempre o que se julga útil foi útil, que nem sempre o melhor gerou o melhor. O aparecimento de grandes chefes morais e religiosos significou, muitas vezes, para a humanidade, o início de duras tiranias; e perfeitos atos de banditismo, praticados com a pior gente do mundo, vieram a dar resultados que são inteiramente de outro plano. Na minha vida, o que foi bom em si veio a ter, muitas vezes, consequências nada benéficas; e o contrário. Examine a sua vida e veja se, mesmo nos poucos anos que já teve ao seu dispor, lhe não sucedeu exatamente o mesmo.
Só teríamos uma certeza de utilidade esperando até o fim do mundo, vendo o resultado final que se tenha atingido e averiguado em que medida cada ato histórico, isto é, cada ato preso, incrustado no tempo, terá contribuído para esse resultado. Mas nós não chegaremos até o fim dos tempos. E creio que, se chegássemos, veríamos desaparecer com o universo toda a distinção entre útil e inútil, ou entre favorável e prejudicial; o céu e o inferno estão em função de existência e de espaço; no dia em que tudo isso desaparecer ou no momento em que tudo isso se supere, no momento em que haja eternidade, nada foi útil ou prejudicial: tudo foi simplesmente; e ninguém julgará, e ninguém será condenado.
