Agostinho da Silva – deve ser a felicidade um critério?
Silva2019
E em primeiro lugar: deve ser a felicidade um critério? Para mim, só é questão a felicidade própria, acho que a dos outros deve ser sempre um critério. Sempre? Se Beethoven, para compor a sua música, se Dante, para escrever a sua poesia, se Tolstói para viver a sua vida, mais bela, mais dramática do que os livros, tiveram de esmagar felicidade à sua volta, se, como creio, uma coisa se não podia ter feito sem a outra, que valeu mais? Devia também ter sido critério para eles a felicidade dos outros? Se um artista tem uma obra dentro em si, deve sacrificar os outros ou a obra? Nenhum artista, é claro, hesitaria na resposta: a obra nunca se sacrifica. Os artistas, querido Amigo, são uma espécie de lobisomens: obedecem a um fadário, não podem deixar de sacrificar os outros em vez da obra; o que não é, nos melhores, pequeno elemento para que sofram.
