Agamben (2022) – a obra de arte
Que a obra de arte seja outra coisa, diferente do que nela é simples coisa, é, por fim, óbvio demais, e é isso que os gregos exprimiam no conceito de alegoria : a obra de arte ἄλλο ἀγορεύει, comunica outra coisa, é outra em relação à matéria que a contém ]]. Mas há objetos – por exemplo, um bloco de pedra, uma gota d’água e, em geral, todas as coisas naturais – nas quais parece que a forma é determinada e quase apagada pela matéria, e outros – um vaso, uma enxada ou qualquer outro objeto produzido pelo homem – nos quais parece que é a forma que determina a matéria. O sonho do terror é a criação de obras que estejam no mundo como nele está o bloco de pedra ou a gota d’água, de um produto que exista segundo o estatuto da coisa. “Les chefs-d’oeuvre sont bêtes”, escrevia Flaubert, “ils ont la mine tranquille comme les productions mêmes de la nature, comme les grands animaux et les montagnes”] ; e Degas : “C’est plat comme la belle peinture” Citado em VALÉRY, Paul. Tel quel, I, 11 Uma análoga tendência para aquela que se poderia definir como a “platitude do absoluto” se reencontra na aspiração de Baudelaire em criar um lugar-comum : “Créer un poncif, c’est le génie. Je dois créer un poncif” (Fusées XX). ]]. (AgambenH)
