====== François Chenique (Logique) – Dialética de Platão ====== //François Chenique. Elementos de Lógica Clássica (FCELC1) // Não se pode alcançar as Ideias senão pela dialética, ou seja, por uma arte raciocinada do diálogo, que evidencia a realidade única para além das múltiplas aparências, o modelo inteligível, para além dos exemplos sensíveis ((Para Platão, a dialética é um instrumento de realização espiritual; ela está além da dianoia (pensamento discursivo) e marca a passagem da dianoia para o nous (Intelecto puro); a dialética é, portanto, a ciência suprema. Entre as disciplinas que despertam o “olho da alma”, Platão destaca a matemática, a música e a ginástica, que constituem uma espécie de yoga platônico.)). O ponto culminante do platonismo é a dialética do conhecimento, que progride dos objetos e das imagens do mundo sensível para as noções matemáticas e, em seguida, para as Ideias do mundo inteligível ((Isso é análogo à tripla abstração que encontraremos mais adiante nos capítulos V e XVIII: abstração física, abstração matemática, abstração metafísica. Para Platão, a matemática é uma ciência hipotético-dedutiva: ela não se eleva, portanto, acima das hipóteses (cf. Rep. VI, 510-511 e, em particular, 510 c).)), um grau superior de conhecimento sendo sempre um grau superior de unidade ((Segundo a teoria dos transcendentais convertíveis ao Ser e situados acima de todos os gêneros, o Ser é uno, verdadeiro e bom; S. Tomás especifica que é nessa ordem que convém enumerar os transcendentais. Sobre os transcendentais, ver Gardeil, Metafísica, Cap. 3. Retomaremos os transcendentais no Cap. VI, seção 4.)). É por isso que a inteligência intuitiva (noûs), que atinge a unidade absoluta da Ideia, é superior à inteligência discursiva (dianoia), que procede das hipóteses às consequências por meio de múltiplos intermediários. O Bem é o princípio de toda existência e de todo conhecimento; ele está além mesmo das Ideias e, por isso, além do conhecimento. Essa dialética ascendente (synagoge) aplica-se às Ideias e à sua geração, mas o devir e o mutável, que contêm o não-ser, não podem ser objeto de ciência; eles nos são conhecidos apenas pela simples opinião (doxa). Nos últimos diálogos, Platão explica como as Ideias, que se definem pela unidade e pela pureza absolutas, podem comunicar-se entre si, com o mundo sensível e com a inteligência humana, problema no qual Parmênides havia tropeçado. Para explicar a ligação das Ideias entre si no discurso, Platão admite uma forma de realidade que não é o Mesmo (to tauton), nem o Contrário (to enantion), mas o Outro (to thateron) ((É no Sofista (255 b ... e) que Platão define o Outro como diferente do Ser e, assim, restabelece, contra Parmênides, uma existência relativa do não-ser (257 e). Para resolver o mesmo problema, Aristóteles estabelecerá a teoria do ato e da potência.)). O mundo sensível é então concebido como uma mistura de imutabilidade e mudança, como se tivesse sido realizado por um artífice, o Demiurgo ((O Demiurgo é o título do primeiro artigo conhecido de René Guénon, publicado em novembro de 1909 na revista La Gnose. Guénon tinha 23 anos e nunca renegou esse artigo fundamental, que estuda o difícil problema do Bem e do Mal. O artigo foi reimpresso sem alterações após sua morte no número de junho de 1951 dos Estudos Tradicionais.)), a partir de uma matéria informe, com base no modelo das Ideias. A dialética, portanto, evoluiu; ela tende a se tornar um método de classificação: enquanto a dialética ascendente tinha como termo o conhecimento intuitivo (synopse) das Ideias por meio de um procedimento (método) que sobe regularmente até o gênero supremo, que é o Uno ou o Ser ((Rep. VII, 518 ss. Lembremos que, para Platão, o Bem está acima de todos os gêneros; é o Princípio supremo, enquanto Aristóteles, e atrás dele grande parte da Idade Média cristã, colocará o Ser (to on) como Princípio primeiro e transcendente.)), a dialética descendente tenta, por uma divisão (diérese), explicar como o sensível participa do inteligível e como os gêneros se comunicam entre si. Graças ao Outro, uma Ideia pode ao mesmo tempo permanecer ela mesma e entrar em relação com o que não é ela, permitindo assim a formação de juízos segundo as regras da dialética. Platão funda, assim, a teoria do juízo que Aristóteles aperfeiçoará e englobará em sua teoria do raciocínio. Partindo de uma Ideia considerada como composta, a dialética reconstrói racionalmente a realidade por meio de uma divisão metódica e exaustiva. Esse procedimento sintético opera-se por meio de dicotomias sucessivas e chega, por eliminações renovadas, a uma definição ou, mais exatamente, a uma classificação. É essa divisão dicotômica que será mais tarde criticada por Aristóteles; ele a transformará e dela extrairá a teoria do silogismo clássico.