Categoria: Sousa, Eudoro de
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Não obstante a fortuna que ganhou o pensamento implícito na fórmula «Do Mito ao Logos» (como se sabe, este é o título de um célebre trabalho de Wilhelm Nestle, que o mais sucintamente designava os primórdios do processo evolutivo do pensamento europeu), da mitologia para a filosofia, ainda ninguém conseguiu ver distintamente o caminho recto…
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Só para desentranhar todas as implicações destas poucas páginas da República (v. Republica-VI), necessário seria escrever um livro inteiro. Supondo que não nos tenhamos omitido de ler com a devida atenção nenhum dos mais importantes comentários que constam da bibliografia especializada, digamos, para começar, que só nos ocorre uma excepção (Fergusson) ao quase unânime parecer…
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(Eudoro de Sousa, “Horizonte e Complementaridade”) A filosofia, na Grécia, tem por certidão de nascimento um texto de Aristóteles repetidamente citado e minuciosamente comentado (Met., I, 3, 983 b 6 e segs.): «a maioria dos primeiros filósofos, acreditaram que os únicos princípios (arkhás) de todas as coisas (hápanta tà ónta) são os de índole material;…
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[DE SOUSA, Eudoro. Horizonte e Complementaridade. Sempre o mesmo acerca do mesmo. Lisboa, INCM, 2002, p. 98-99] 55. Por conseguinte, não é irrefutável a tese, segundo a qual a «Opinião dos Mortais» seria apenas um artifício dialéctico, e torna-se bastante verosímil que ela se situe no prolongamento da «Via da Verdade», como a verdade do…
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52. A terceira parte do poema de Parmênides não é, pois, artifício dialéctico, como a primeira não é artifício literário. A «Opinião dos Mortais» está intimamente ligada à «Via da Verdade» pela ideia de que o Ser só pode aparecer (ou «parecer a») com um mínimo de diferenciação. A correlação entre perceptibilidade, do lado do…
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[DE SOUSA, Eudoro. Horizonte e Complementaridade. Sempre o mesmo acerca do mesmo. Lisboa, INCM, 2002, p. 95-97] 53. A charneira da «Via da Verdade» e da «Opinião dos Mortais» encontra-se nos últimos versos do frg. 8. Aqui, mais do que em qualquer outra passagem, exuberantemente se confirma a verdade do que afirmávamos acima: qualquer tradução…
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[DE SOUSA, Eudoro. Horizonte e Complementaridade. Sempre o mesmo acerca do mesmo. Lisboa, INCM, 2002, p. 93-94] 51. A «Doxa» é a parte mais fragmentária do poema de Parmênides, o que parece dar razão aos intérpretes que formularam a hipótese de que essa última parte não passaria de um arranjo, mais ou menos hábil, das…
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Cremos que nem tão grande tenha sido a alteração semântica da palavra que invalide a interpretação de Cleve (The Giants of pre-sophistic Greek Philosophy, II, 352-353) da mesma palavra no frg. 28 de Empédocles: «The only meaningful interpretation of pampan apeíron is here ‘completely without limitations, withouth any borders’ — inside the Sphairos: if that…
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[DE SOUSA, Eudoro. Horizonte e Complementaridade. Sempre o mesmo acerca do mesmo. Lisboa, INCM, 2002, p. 90-93] 50. Quem, desprevenido de especulações, percorra a bibliografia de Parmênides, dos dois ou três últimos decênios, mas bem atento à diversidade das versões de alguns fragmentos em idiomas modernos, não poderá esquivar-se a uma impressão desconcertante. Com efeito,…
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80. Com esta maneira de interpretar a relação entre o frg. 26 e o frg. 30 (e 31), concorre o que acima (§ 76) ficou escrito sobre certa forma do pensamento arcaico dos Gregos: o «meio proporcional». No frg. 26, temos sono e vigília, como no frg. 1 e nos demais que citamos em cotejo,…
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79. O fogo, em Heráclito, não é uma cifra da codificação filosófica da «natureza»; pelo menos, não o é, exclusivamente: encontramo-lo em fragmentos que nos falam da morte e da alma. O fogo e a morte, com o sono e a vigília, constam do frg. 26, um dos mais exacerbadamente discutidos, e que trasladamos, primeiro,…
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Excertos de “Sempre o mesmo acerca do mesmo” De acordo com Heidegger, a atividade mais futurosa do pensar de hoje consistiria no reatamento do diálogo com os primeiros filósofos; V. que se empenhou nesta árdua tarefa, a qual pode ser descrita, nos termos do seu livro, como o defrontar-se da filosofia com sua origem e…
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É impossível decidir a questão de saber se alguma vez Platão leu Heráclito, ou se, tendo-o lido, não quis desentendê-lo, servindo qualquer propósito que ignoramos, pois é precisamente dele que nasce a falsa noção do panta rhei, que sabemo-lo hoje, não tem qualquer lugar nos escritos autênticos do próprio Efésio. Nem se pode invocar aqui…
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57. Em primeiro lugar, falemos acerca das interpretações que não se acham necessariamente apoiadas na leitura do texto, a) A viagem de Parmênides é única, e não reiterada: o optativo ikánoi («alcance»), última palavra do primeiro verso, não é obrigatoriamente um interactivo, b) Nem o é para baixo, para o interior da terra, nem para…
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Mas, com olhos desatentos a esse esquema (v. Pensadores Pré-Socráticos), bem poderia surgir uma dúvida fatal à interpretação doxográfica: bastaria perguntar, com afincado interesse em obter uma resposta satisfatória, se o problema mais importante para a escola de Mileto de algum modo se identifica com o de Aristóteles. Este, ao que mais provável parece, seria…
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Não nos move, nem de leve, o intuito de escrever uma história, ainda que parcelar, da filosofia grega. Mas, a fim de restabelecer o paralelismo (ou, talvez, a convergência) da codificação mítica e da codificação lógica do mistério do horizonte, que, vê-lo-emos em breve, Parmênides revelou o quanto pôde, há pelo menos dois nomes que…
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Não há que perder muitas palavras, no intuito de provar que entre o frg. 16 e o frg. 23 passava uma linha, dividindo uma parte negativa de uma parte positiva. O poema, ou o sector do poema, que teria por objecto «Deus e os deuses», preludiava, pela crítica ao politeísmo de Homero e Hesíodo, uma…
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A fulgurante exposição de Jaeger merece dois reparos. O primeiro é que só um excessivo entusiasmo pode responder pela relação direta entre Xenófanes e Aristóteles, quanto ao « motor imóvel » — cujos pré-requisitos nos parecem todos contidos na teoria aristotélica do movimento; acontece, apenas, que o Estagirita, como seu Mestre, tem de recorrer à…
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Pitágoras nada escreveu; o que tanto mais nos solicita a que sobre ele escrevamos nós, sempre com o perigo à vista de tomar a «sombra» pelo «filósofo». No estado atual dos nossos conhecimentos, e dos preceitos, ou antes, dos preconceitos mais ou menos ocultos que marcaram o rumo da pesquisa, parece desesperada a empresa de…
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Deixamos Heráclito para o fim, por duas razões que, de algum modo, sem sabermos por ora quais sejam, devem andar estreitamente correlacionadas. A primeira é que o filósofo não tem lugar na «história» da filosofia grega, se por tal entendemos o desenvolvimento do que se chama «filosofia», em qualquer direção bem definida a partir de…