Alleau (2001) – simbólica e tipologia

Numa obra importante e que constitui uma introdução à «arquetipologia geral» e, por isso mesmo, uma das bases do desenvolvimento futuro da ciência dos símbolos, Les structures anthropologiques de l’imaginaire, Gilbert Durand alude à «extrema confusão» que reina na «terminologia demasiado rica» da simbólica geral: «Sinais, imagens, símbolos, alegorias, emblemas, arquétipos, figuras, ilustrações, esquemas, representações esquemáticas, diagramas e sinepsias são termos indiferentemente usados pelos analistas do imaginário. Tanto Sartre como Dumas ou Jung dedicam várias páginas à tarefa de precisar o vocabulário que utilizam. É também o que vamos tentar fazer»1.

Gilbert Durand deixa de lado tudo o que não se relaciona com a semiologia pura. Quando utiliza a palavra «sinal», fá-lo com um sentido muito geral e sem pretender atribuir-lhe o seu sentido exato de «algoritmo arbitrário», de «sinal contingente dum significado». Também não se serve do termo «emblema», embora Dumas admita que os emblemas possam atingir a vida simbólica 2. Da mesma forma, G. Durand põe de lado a alegoria, «símbolo arrefecido», como observa Hegel (Estética, I, p. 165), «semântica ressequida em semiologia e que apenas tem um valor de sinal convencional e académico».

Tal exclusão explica-se, com efeito, na perspectiva «tipológica» de G. Durand. Mais importante, parece ser o «esquema», «generalização dinâmica e afetiva da imagem», o «símbolo funcional» de Piaget, o «símbolo motor» de Bachelard. Efetivamente, são os esquemas que formam «a mola dinâmica e estruturada da imaginação». Os «arquétipos» constituem «as substantificações dos esquemas». Sartre observara já que o «esquema» surge como o «presentificador» dos gestos e dos impulsos inconscientes. Jung «substantificou» esta noção inspirada em Jacob Burckhardt e transformou-a no sinônimo de «imagem primordial», de «engrama», de «imagem original», de «arquétipo». A «imagem primordial», segundo Jung, deve estar incontestavelmente relacionada com certos processos perceptíveis da natureza que se reproduzem sem cessar e estão sempre em atividade, mas, por outro lado, é também indubitável que ela se reporta «a certas condições interiores da vida do espírito e de vida em geral» 3. G. Durand sublinha o papel essencial dos arquétipos que «constituem o ponto de junção entre o imaginário e os processos racionais»4.

No entanto, os «arquétipos» estão igualmente ligados a imagens diferenciadas culturalmente pelos grupos sociais e pelas civilizações. Pode-se admitir a existência arcaica duma «metalurgia sagrada», cuja descoberta foi comum à humanidade nas suas relações com a natureza, tal como a do fogo. No entanto, não se trata neste caso duma «imagem original», mas duma experiência concreta primordial que, num estado ulterior, forneceu a matéria para uma elaboração muito complexa de imagens e de símbolos cujo sistema variou não apenas consoante as diversas áreas da civilização, mas também no interior de cada uma delas, conforme as épocas e as dominantes culturais. Assim, não há um simbolismo, mas vários simbolismos alquímicos, embora a sua base experimental arcaica tenha sido inicialmente a mesma. Eis porque as alquimias chinesa, indiana, grega, árabe e medieval exigem outros tantos especialistas em cada um destes domínios culturais, a fim de interpretarem as formas distintas de simbolização que cada uma utiliza.

Nestas condições, quando Jung fala de «arquétipos» alquímicos, a que alquimia e a que época se refere? Se isso se relaciona com imagens «ligadas a certos processos perceptíveis da natureza que se reproduzem sem cessar e estão sempre ativos», estas imagens foram modificadas pelo processo histórico da cultura e duma forma tão constante e profunda que não podem ser consideradas como «modelos» originais e «imutáveis» das condições interiores da vida do espírito.

Em contrapartida, podemos aceitar a ideia dum arcaísmo do psiquismo humano, pois nem a biologia nem a psicologia desmentem esta hipótese experimentalmente verificável. Na condição de não esquecer, no entanto, que não há imagem do primordial a este nível, pois o primordial não pode ser representado nem sequer imaginado: pode apenas ser vivido na sua opacidade compacta em que a imagem não está ainda diferenciada do objeto, em que uma equivale ao outro e em que a incapacidade de imaginar é precisamente um dos sinais clínicos da regressão psíquica. Se existisse um «imaginário original típico», este fenômeno patológico não se produziria.

Podemos constatar, evidentemente, que o símbolo parece perder a sua polivalência, por exemplo, quando o «arquétipo» da roda se transforma em símbolo cruci-forme, pois transforma-se no sinal do «sintema» duma operação abstrata de soma ou de multiplicação, de sentido unívoco e convencional. Tendo ficado impressionado com este processo de redução da polivalência inicial, pensei, em primeiro lugar, que o ponto de partida da simbólica geral era o «tipo» e que o termo dessa degradação crescente era o «sintema»5, porque, tal como os outros especialistas, eu tinha tendência para «substantificar» o «esquema» ou o tipo «primordial», ou seja, para o considerar como um «modelo» ou um «pattern» determinado pela sua estrutura2.

Parece-me agora que não atribuímos a importância suficiente ao fato de tais estruturas corresponderem a operações e à própria lógica da analogia, como às suas origens experimentais arcaicas, ao passo que, em contrapartida, concentrámos todos os nossos meios analíticos sobre consequências e resultados, sobre formas e produtos, atribuindo-lhes um poder próprio e interno de determinação. No entanto, donde provém o isomorfismo dos esquemas, dos arquétipos, dos símbolos, no seio dos sistemas místicos, se não do poder permanente da analogia?

(AlleauCS)

  1. Presses Universitaires de France, Paris, 1960, p. 51[]
  2. Dumas, Nouveau Traité de Psychologie, p. 268. « Ob. cit., p. 51.[]
  3. Jung, Types psycho., pp. 387, 454 sq. Citado por G. Durand, p. 52.[]
  4. Ob. cit, p. 53.[]
  5. Cfr. De la nature du symbole, pp. 17 e 38, Paris, 1958.[]