Logo diferentemente dos animais, o Homem é formado “leveza” (mais fraco que eles fisicamente sem dúvida, embora imortal) e por outro lado gratificado de um “sopro divino” antes de se tornar um “ser vivo”.
Modelado “leveza do pesadume”, quer dizer imortal por natureza, o Homem ainda não está acabado. Ele só o será verdadeiramente quando completado de sua “metade faltante”, a Mulher. Mas antes deverá superar outras etapas de sua formação, que paradoxalmente o relato do jardim do Éden, que não é cronológico, (...)
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Nothomb / Paul Nothomb
Paul Nothomb (1913-2006) é um extraordinário pensador belga, profundo conhecedor e pesquisador do que denominava "A Bíblia das Origens", a parte do Gênesis que vai da Criação ao Dilúvio: "cerca de um centésimo do Antigo Testamento , mas qualitativamente, para o homem de hoje em dia, a parte mais surpreendente, a mais rica e a mais atual".
Nothomb é Doutor em Estudos hebraicos e judaicos da Sorbonne, tendo nascido na Bélgica de família católica. Lutou na Guerra Civil Espanhola ao lado de André Malraux, sendo sucessivamente militante comunista, prisioneiro da Gestapo, excluído do partido comunista, romancista, operário, estudante de línguas orientais e professor de hebreu em Nanterre. Por muitos anos, até sua morte se dedicou ao estudo do que dizia ser "a única parte da Bíblia que não envelheceu".
Destaques:
Matérias
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Nothomb (HI:61-66) – "leveza do pesadume"
26 de outubro de 2022, por Cardoso de Castro -
Nothomb (HI:48-51) – A "Queda"
27 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroCom o suor do teu rosto comerás o pão, enquanto durar o teu retorno ao pesadume.
O que é chamado de “Queda” é, portanto, essencialmente uma queda no pesadume. Da leveza e despreocupação originais ao seu oposto. Muito simbólico a esse respeito aparece o comportamento atribuído ao casal humano imediatamente após a absorção do “fruto proibido”. O Homem e sua Mulher, até então “nus sem o menor embaraço” apressam-se em cobrir-se, a preocupar-se com roupas (3,7), afundando-se no medo e na mentira (3,10) e (...) -
Nothomb (TC:73-75) – Éden e árvores
25 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroO Jardim do Éden é definido como o “lugar” do Homem. Deus o plantou expressamente para ele e então fez crescer ali para ele “toda árvore comestível e agradável de se ver”.
O que costumamos chamar de “Queda” no Ocidente (termo que não aparece na Bíblia original) é o sentimento de perda definitiva de um estado de bem-aventurada inocência. Por culpa moral, segundo a tradição judaico-cristã, ou fatalidade biológica, segundo a psicanálise.
Mas o que por conveniência continuarei a chamar de "Queda" é algo bem (...) -
Nothomb (HI:31-36) – adama (pesadume)
16 de abril de 2018, por Cardoso de CastroEssa oposição entre jardim e adama é verificada ao longo da história. Nada entra no jardim em proveniência da adama que não tenha dela sido previamente separada, extraída, arrancada.
O relato do Jardim do Éden começa com um preâmbulo, que serve de transição com o relato da Criação em seis dias que o precede, e ao mesmo tempo parece começar tudo do zero. A transição é marcada nas primeiras frases por uma série de “erets” usados no mesmo sentido geral e com a mesma frequência que na primeira história:
O (...) -
Nothomb (TC:11-13) – Túnicas de Cego
29 de março de 2022, por Cardoso de CastroPaul Nothomb, como em seus trabalhos anteriores sobre o que denominou a Bíblia das Origens, ou seja, os nove primeiros capítulos do Gênesis, nos convida a uma outra leitura do início da Bíblia a partir do texto hebreu original. Sua abordagem séria e cuidadosa sobre as possibilidades de interpretação do texto hebreu, abala nossas concepções tradicionais, ao mesmo tempo que nos oferece uma nova visão e perspectiva sobre Deus, Mundo e Homem. Neste livro em especial faz uma exegese do capítulo 3 do (...)
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Nothomb (TC:195-199) – Dilúvio e Noé
25 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroO homem pode se desesperar do homem e não se priva disso, mas Deus não. Esta é a grande lição a ser aprendida com o dilúvio.
Deus não tem ilusões sobre Noé. Ou talvez tenha? Ele “anda com os deuses”, digamos com ídolos, como Enoque (isso não é necessariamente pejorativo). Ele é, portanto, um homem piedoso e até “justo” segundo o texto, mas este acrescenta “na sua geração” o que relativiza o louvor, porque diante de Deus e mesmo diante dos ídolos esta geração é totalmente corrupta. Deus anuncia a Noé que vai (...) -
Nothomb (Ça:31-37) – Zoot = Isso - Essa-aí - Outro
25 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroO casal "Adão e sua mulher" não faz lembrar o Adão senão pelo Adão citado, depois da separação do elemento "mulher" (Outro, Outro Adão) que o constituía. [Nothomb]
“Não é bom que o ser humano esteja só para ele” (Gn 2,18). A fórmula “o ser humano” (em hebreu heyot haadam) não aparece em nenhuma parte da Bíblia, e me parece significar aqui que reúne todas as facetas possíveis do homem, desde o Adão original até o indivíduo da condição humana para afirmar que o “eu” não pode se passar do “tu”. Que o “tu” ou o (...) -
Nothomb (Ça:38-47) – Adão - Eva - Serpente - Árvores - Éden
25 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroA serpente do Paraíso é introduzida no relato sem outro preâmbulo que seu qualificativo, idêntico àquele atribuído no versículo precedente ao casal híbrido. [Nothomb]
A serpente do Paraíso é introduzida no relato sem outro preâmbulo que seu qualificativo, idêntico àquele atribuído no versículo precedente ao casal híbrido [ish e isha]. Astuta, maliciosa (aroum em hebreu). Como o Adão e sua mulher “fazia malícia”, se cria astuciosa em suas adivinhações. Seu nome significa “adivinhar”. Ela não figura o (...) -
Nothomb (HI:94-99) – Serpente do Jardim do Éden
27 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroContrariamente ao que deixa entender a tradução corrente, o texto não diz que é uma criatura de Deus. Deve-se ler (Gen 3,1): “A serpente era mais astuta que todos os animais que YHWH tinha feito” e não “o mais astuto de todos os animais selvagens...”.
A figura mitológica da serpente do relato do Jardim do Éden deu lugar a muitas especulações. Que representa este animal falante? Satã, o Adversário, o Espírito do Mal, o anjo Samael? Contrariamente ao que deixa entender a tradução corrente, o texto não diz (...) -
Nothomb (HI:37-45) – "és pó..." (hb. afar)
26 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroYHWH Deus formou o Homem pó da terra. [Gn 2,7]
“Pois és pó e ao pó retornarás” (Gn 3,19). Esta é a única profecia que ninguém duvida. A única palavra da Bíblia que é unânime entre ateus, agnósticos e crentes. Quer o atribuamos à inspiração divina ou à sabedoria mais profana, quem sonharia em discutir sua lúgubre evidência, em negar a inevitável decomposição a que toda carne está condenada? Chegamos a esquecer que aparece esta palavra, não no livro Provérbios, mas no Gênesis. Que não foi pronunciado como uma (...) -
Nothomb (HI:67-78) – Bem e Mal
27 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroDeus não conhece qualquer abstração (e o Bem e o Mal, como a totalidade, são abstrações, entidades, que o homem absolutiza) pois as abstração não existem na realidade. Deus conhece o coração do homem, o coração de cada homem, Deus conhece o passado, Deus conhece o futuro — e ainda estes conhecimentos não prevalecem contra seu todo-poder de mudar os corações e as vidas, e de fazer mesmo que o passado cesse de ter sido, ou que o futuro seja diferente do que ele previu — se ele o quer.
tradução resumida
"O (...) -
Nothomb (TC:64-67) – o conceber bíblico do "humano"
24 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroOs dois textos começam praticamente pela mesma fórmula, que parece anunciar um mesmo propósito. “E Deus Criou o Homem” no relato dos Seis dias, “e YHWH Deus concebeu o Homem” no relato do Jardim do Éden.
Procedamos agora como as inscrições bilíngues, tal a pedra da Roseta que permitiu a Champollion decifrar da língua desconhecida as palavras que têm uma chance de se corresponder. Como se trata aqui de uma mesma língua que se exprime em duas linguagens diferentes, é mais fácil, enquanto encontra-se nos (...) -
Nothomb (HI:157-165) – “Ame o outro. Ele é como você”
26 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroCuriosamente o verbo “amar” tem em hebreu um campo semântico tão vasto quanto em português. Em hebreu como em francês, pode-se amar tanto Deus como uma mulher ou uma coisa inanimada. É o contexto que dita se se trata de amor no sentido forte ou no sentido fraco. Somente, quando se traduz ao inglês o célebre versículo: “Amarás teu próximo como ti mesmo”, é sempre o verbo inglês “love” que é empregado, e não “like”. E também assim se entende em português: no sentido forte. Em hebreu, pelo contrário, (...)
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Nothomb (TC:21-25) – Imortalidade
29 de março de 2022, por Cardoso de CastroPara a Bíblia das Origens, portanto, a imortalidade precede a morte que o Homem, e não Deus, introduziu no mundo. É capital. É decisivo. Se se pensa ao contrário, em todo caso assim penso, é impossível “crer em Deus” pelo menos em um Deus “bom” como aquele do qual nos falam judeus e cristãos.
O Éden deve ser confirmado? A palavra, antes de significar “delícias” em hebraico, significava “estepe” em acadiano ou no antigo sul da Arábia? Um certo crítico, sempre ávido por “desmitologizar”, afirma isso. O (...) -
Nothomb (TC:43-54) – "Criar", verbo unicamente divino
26 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroO Criar da sequência inicial concerne o conjunto do processo que vai descrever o “Relato dos Seis Dias” e não sua primeira etapa, assim como “os céus e a terra” designa o mundo ainda em projeto — trata-se a princípio de um título ou como sugere Rachi, de uma proposição subordinada, que se deveria traduzir: “Quando Deus começou a Criar o mundo”.
Para distinguir notadamente o “criar” divino, Nothomb sempre que utiliza este verbo o faz com a primeira letra maiúscula, denotando uma obra exclusiva do Criador, (...) -
Nothomb (SR:193-196) – Por que só há árvores no Paraíso?
25 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroEm suma, a árvore, todas as árvores do jardim, mas mais explicitamente as duas com nome, representam o mundo que só existe através do cérebro humano em sua integridade ou não. Em particular a Árvore da Onisciência antes de sua amputação, é o mundo de Adão, e depois, o nosso.
Esqueçam a abundante iconografia imaginando o paraíso terrestre com a vegetação luxuriante e variada que parece se impor neste lugar de delícias. O relato do Gênesis o ignora e mesmo de erva não fala senão negativamente. Para (...) -
Nothomb (TC:59-64) Jardim do Éden
25 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroCertamente o relato do Jardim do Éden vai mais longe e ainda mais profundo sobre o que o Relato dos Seis Dias denomina a Criação do Homem. Posto que junta o episódio da “Queda”, que nos ensina o que o Homem efetivamente “fez” da obra de Deus, a ele confiada, e de sua liberdade, com todas as consequências que dela sofremos na “condição humana”.
O mais antigo, o mais completo e o mais importante dos relatos que compõem a Bíblia das Origens, o relato dito do Jardim do Éden ignora o verbo “Criar”. O que (...) -
Nothomb (TC:162-166) – Enoque
24 de julho de 2022, por Cardoso de CastroA lenda judia, que na era inter-testamentária fez de Enoque o herói de um apocalipse, representou seu desaparecimento como uma ascensão, à maneira daquela de Elias, sobre um carro de fogo.
Um evadido salva a honra do Homem de entre os resignados. Na genealogia sethista, Enoque não é o filho de Caim mas o bis-bis-neto de Seth. Ele tem quatro gerações antes dele. Sua notícia biográfica começa como aquela de seus ancestrais. Mas no anúncio de seu filho mais velho, se adiciona uma informação que não (...) -
Nothomb (HI:45-48) – Jardim do Éden
27 de outubro de 2022, por Cardoso de Castro“Pó formado”, o Homem escapa por sua primeira natureza, e antes mesmo de se tornar um ser vivo pelo sopro divino, do pesadume dos “terra a terra”, de quem tem “pés no chão”.
O relato do Jardim do Éden nos parece alegórico, pois para perceber suas revelações imediatas hoje, devemos decodificá-las em nossa linguagem nocional, totalmente estranha à linguagem concreta da Bíblia. Transposição que, somada a muitas traduções ruins, não é isenta de riscos. A célebre árvore “do Bem e do Mal” é apenas o exemplo mais (...) -
Nothomb (TC:75-81) – Árvore do Conhecimento
25 de outubro de 2022, por Cardoso de CastroEste código que tem ar complicado, tão inutilmente complicado na tradução e mesmo no original, onde se reúnem quatro palavras principais, “árvore”, “conhecer”, “bom” e “mau” estas últimas ainda mais em conjunto no sentido de “em tudo”, designa nada menos e nada mais — mas é incomensurável — que a Realidade.
Mas o outro código? A outra “árvore” que está no meio do jardim, o que ela designa? É menos claro. É um código muito elaborado, e de longe o principal dos dois, pois é em torno dele que se desenrolará a fase (...)
Notas
- Bíblia das Origens
- Nothomb (Ça:C8) – Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal
- Nothomb (HI:51-52) – Caim e Abel
- Nothomb (HI:52-54) – Jó
- Nothomb (HI:58-59) – “Pó e Cinza”
- Nothomb (RBC) – Relato dos Seis Dias (Gen I)
- Nothomb (TC:146-148) – Caim (Gen 4)
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,1 – No princípio...
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,10 – terra e mares
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,11 – o verdurar da terra
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,12 – brota verdura de erva semeando
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,13 – Terceiro dia
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,14 – haja luzes no céu...
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,15 – as luminárias no céu
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,16 – os dois grandes luminares
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,17 – luminares para clarear sobre a terra
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,18 – governo do dia e da noite
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,19 – quarto dia
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,2 – Tohu-Bohu
- Relato dos Seis Dias: Gn 1,20 – peixes e pássaros