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mundo visível / mundo invisível / mundo da manifestação / mundo do mistério / mundo sutil / mundo intermediário / mundo imaginal / mundus imaginalis / alam al-mithal / al-alam al mithali / alam / Mundo do Fato / Olam ha-Asiyah / Asiah / olam
Roberto Pla
Com sua concepção vertical do mundo, uma escala que vai desde os céus de acima às mansões subterrâneas, sem deixar de passar pela terra , a exegese manifesta colaborou para que se desenvolvesse em muitos a ideia de que há vários mundos: este, no qual estamos e conhecemos e o outro: a dualidade .
No entanto, segundo a exegese oculta , o mundo é uma totalidade que se dá por interpenetração não dual. Isto significa que se pode encontrar o mundo invisível, espalhado e uno no todo, no mundo visível, porque só há um único mundo.
Esta unidade de ser o mundo visível e o invisível um só mundo, foi explicada no quarto evangelho quando se que diz que a Palavra, a luz verdadeira (invisível) “estava no mundo” (desde o princípio) e “o mundo (visível) foi feito por ela, e o mundo (o habitante do mundo), o homem ) não a conheceu”.
No entanto, o invisível (a luz verdadeira, a Palavra), é o substrato no qual se apoia o mundo visível e invisível, e por isso se disse que Deus deu ao mundo a seu filho único — o substrato — “para que todo o que creia nele não pereça, para que o mundo se salve por ele”.
Ainda mais. Quando no mesmo evangelho joanico se diz depois que havia chegado a hora de “passar deste mundo ao Pai”, não se quer dizer com isto que há dois mundos (o mundo invisível e o visível) mas o Pai, senão que o Pai é a essência, também total e também interpenetrada, como Primeiro Reino, no mundo único.
O evangelho usa em muitas ocasiões formas simplificadas de linguagem que há que interpretar. Assim quando Jesus disse a seus discípulos: “Não sois do mundo, porque eu ao elegê-los os saquei do mundo”, não quis dizer que havia sacado a seus discípulos do mundo visível (material) e do mundo invisível (sensível ), para levá-los ao substrato do mundo (inteligível), senão que por haver renunciado estes discípulos ao mundo, por obra do conhecimento e do amor que o excede, estavam desde então no mundo sem ser do mundo, tal como está a luz verdadeira no mundo, ainda que a ele, à luz, o mundo não a conhece. [Evangelho de Tomé - Logion 110]
Schaya
O Universo corporal, englobando as "sete terras", é denominado o "Mundo do Fato", Olam ha-Asiyah; ele é condicionado pelo tempo, o espaço, os elementos materiais e do ponto de vista microcósmico, pela percepção sensorial. As sete terras representam tantos estados de nosso nosso Universo; elas são descritas como "sete regiões" hierarquicamente "superpostas e todas povoadas"; uma delas, a "terra superior" é a nossa, à qual as seis outras se assemelham, sem alcançar a perfeição; da mesma maneira, seus habitantes só possuem a forma humana de maneira incompleta e desequilibrada. Por outro lado, as sete sephiroth construtivas — também denominadas os "sete dias da criação" principial — se manifestam no tempo pelo septenários seguintes: os sete dias da semana; os sete anos formando um ciclo sabático; os "sete vezes sete anos" indo de um "Jubileu" a outro; os sete mil anos representando um grande ciclo de existência; e os "sete vezes sete mil anos" alcançando o quinquagésimo milênio, o "Grande Jubileu", onde o mundo é reintegrado no Princípio divino. Enfim, as sete sephiroth construtivas determinam as seis direções do espaço e seu centro espiritual, denominado o "Santo dos Santos". [SchayaC ]
Michel Chodkiewicz
Para Balyani , "los dos mundos... están desprovistos de realidad". "Al igual que es necesario que El sea, es necesario que lo que es ‘otro que El’ no sea". A la objeción que podría hacérsele: "Tú afirmas a Alá y niegas la realidad de toda cosa, ¿qué son entonces las cosas que vemos?", replica en estos términos: "Las palabras se dirigen a quien no ve nada fuera de Alá. Aquél que ve algo fuera de Alá, a ese no tenemos nada que responderle, y nada que preguntarle". De diversas maneras, la noción de irrealidad radical del mundo — e incluso de los dos mundos: ‘alam al-shahada, el mundo de la manifestación y ‘alam al-ghayb, el mundo del misterio — está constantemente presente en nuestro texto. Que sea el eje de la enseñanza de Balyani está confirmado además por la anécdota relatada por Jami cuando el discípulo exclama: "¡Tú has dicho que no existe sino Dios!" [Excertos da versão espanhola da introdução de Epître sur l’unicité absolue]
Henry Corbin
O mundo imaginal é, em uma palavra, o mundo mesmo, alcançado em sua indivisão, anteriormente a nossas abordagens fraccionantes, simplificantes, o mundo em sua glória primeira, onde se situam as visões, onde o real se transfigura. Sua reconquista, nos diz Corbin , é «a questão e o lugar do combate dos javanmardan». Na ordem imaginal, por essência unitária, o corpo não é mais o oposto do espírito. Seu estado é, ele também, intermediário, sutil . O corpo imaginal (jism mithali) é o corpo absolutamente próprio, o corpo concreto e singular, de certo modo tornado espiritual. É certamente corpo, mas renovado, conduzido a uma nova juventude — corpo auroral, aberto à riqueza indivisível do mundo criado. Como imergido em um real doravante unitário, onde os conceitos antagonistas de «espírito» e de «matéria» não têm mais curso. No mundo imaginal pode se operar o encontro esperado do homem e de seu «Anjo » (v. HOMEM ANJO), do Eu e de seu Outro. Não do Eu e de um Tu sempre separador, mas do Eu próprio e de um Outro que permanece um Eu, de um «Eu na segunda pessoa» que é sua verdadeira essência. Pois o «Anjo» é como a plenitude do mundo imaginal, sua dimensão acabada, vinda a termo. Mas isso para cada um de nós, deve-se insistir, em uma relação e uma troca que é e que permanece de Único a único.
Segundo Roger Munier, referindo-se à obra de Henry Corbin, foi Molla Sadra Shirazi, que viveu no século XVII (morrendo justamente no início do cartesianismo na Europa, em 1640), o iniciador da teoria da «Imaginação Ativa».
Segundo Molla Sadra, a Imaginação é uma faculdade humana transcendente, sensível e não sensível, ou de preferência cuja essência consiste em escapar justamente a esta dicotomia, «de certo modo o corpo sutil , o veículo sutil da alma ». Logo se nos atemos a nossos esquemas, diremos que a ordem que lhe corresponde é intermediária entre o sensível e o inteligível. Não é em nada o mundo imaginário, tal qual temos costume de ouvir no Ocidente, pois o imaginário é irreal, mas um mundo verdadeiro, aquele da realidade plena, e que Corbin, por esta razão, qualifica de imaginal: mundus imaginalis, alam al-mithal. Este seria, sempre segundo nossos esquemas, como um terceiro estado do real, onde todas as forças físicas e psíquicas se reúnem, o elemento mesmo de sua conjunção, o «meio», em todos os sentidos do termo, de sua irradiação prévia.
A Imaginação ativa produzirá não alguma construção arbitrária, seja lírica, se interpondo diante do «real», mas funcionará diretamente como faculdade e órgão de conhecimento tão real, senão mais, que os órgãos dos sentidos. Mas ela perceberá a sua maneira própria: seu órgão, não é uma faculdade sensível, é uma Forma imaginal que ela possui desde a origem , sem ter tido de derivá-la de alguma percepção exterior. E o próprio desta Forma imaginal será justamente de operar a transmutação dos dados sensíveis, sua resolução na pureza do mundo sutil, para restituí-los em símbolos a descifrar, e cujo «código» é o próprio código da alma. Esta percepção pela Imaginação equivale portanto a uma «desmaterialização»; ela muda em um puro espelho , em uma transparência espiritual, o dado físico imposto aos sentidos; é então que levada à incandescência, a Terra, e as coisas e os seres da Terra, deixam transparecer à intuição visionária a aparição de seus Anjos. A autenticidade do Evento e sua realidade plena consistem então essencialmente neste ato visionário e na aparição que é dada neste ato. E é esse o sentido profundo disto que a história dos dogmas chamou docetismo, e sobre o qual a rotina repetiu incansavelmente as mesmas condenações.
Assim se constitui este mundo intermediário, intermundo das Formas imaginais (que não se deve confundir com o mundo das Ideias-arquétipos de Platão), e que é reservado à Imaginação ativa apreender. Esta Imaginação não constrói o irreal, ela desvela o real oculto; sua ação é em suma aquela do tawil, a exegese espiritual praticada por todos os Espirituais do Islã e cuja meditação alquímica é um caso privilegiado: ocultar o aparente, manifestar o oculto. É o mundo intermediário, este intermundo, que meditaram incansavelmente aqueles que se chama os orafa, os gnósticos místicos, a gnose se entendendo aqui desta percepção que apreende o objeto não em uma pseudo-objetividade, mas como índice, significância, anúncio que é finalmente anunciação da alma a ela mesma. [CorbinHA ]
Daryush Shayegan
Precisaria escrever um livro inteiro para se explicar em suas facetas múltiplas tudo o que Corbin disse a respeito do mundo do imaginal que caracteriza tão bem, segundo ele, a especificidade própria do universo espiritual iraniano. Sohravardi foi o primeiro a fundar ontologicamente o nível, mas já aparece na cosmologia de Avicena . É o fio invisível que constitui a memória do mundo iraniano que se renova e se metamorfoseia a cada assalto do estrangeiro, a cada corte que lhe impõem os inumeráveis invasores que atravessaram o planalto iraniano. Paraíso hiperbóreo , a Luz-de-Glória (Xvarnah) na cosmologia zoroastriana, ela reaparece no “oitavo clima” de todos nossos filósofos: de Avicena até Hadi Sabzavari, passando por Sohravardi e Molla Sadra Shirazi sem contar a contribuição dos grandes poetas visionários. Ela é esta fonte eternamente fresca onde a alma do Irã retira sua identidade e os tesouros espirituais que lhe legaram seus ancestrais. “De século em século, diz Corbin, a meditação dos pensadores iranianos portou seu esforço sobre o estatuto de um mundo, que não é nem este da percepção empírica, nem aquele do entendimento abstrato. A ideia deste universo intermediário reaparece depois de Sohravardi (século XII), até Molla Sadra Shirazi (século XVII), Hadi Sabzavari (século XIX) e tantos outros até nossos dias. Este universo, eles designaram de nomes diferentes: ora por referência aos sete climas da geografia tradicional (Geografia Sagrada), designado como o “oitavo clima”; ora mais tecnicamente, como o ‘alam al-mithal”.
Este “oitavo clima” tem múltiplas ressonâncias ao nível da ontologia assim como da cosmologia e da angelologia. Ele funda uma metafísica das Imagens onde estas adquirem um valor cognitivo e noético próprio. Pois as Imagens surgem não do inconsciente mas da sobre-consciência; elas são portanto por este fato Imagens intelectivas. Para as distinguir claramente do imaginário que enquanto “louca da casa ” não secreta senão do fictício e do irreal, Corbin forjou o termo de imaginal. O mundo do Imaginal, ‘alam al-mithal é o mundo onde têm lugar as visões dos profetas, dos místicos e os eventos da alma, eventos tão reais quanto aqueles do mundo sensível mas que têm lugar em um outro nível do Ser.
Digamos então que o mundo do imaginal se integra no esquema de uma cosmologia que se traduz em angelologia. A Imagem metafísica se torna o pensamento do Anjo, o modo de sua espacialização própria; ela tem uma extensão e uma dimensão, “uma ‘materialidade imaterial’, certamente, em relação àquela do mundo sensível, mas enfim, uma ‘corporalidade’ e uma espiritualidade próprias” (FACE DE DEUS, FACE DO HOMEM ); o espaço de conjunção onde a alma humana e o Anjo se imaginam um e outro. Para bem distinguir a qualidade intelectiva da Imagem de sua natureza estimativa ou se se quer o Imaginal do imaginário, Sohravardi nos faz significar que quando é o Intelecto que a fecunda, a imaginação se torna um anjo, quer dizer uma faculdade cogitativa e meditativa (mofakkir). em revanche quando a estimativa (wahm) faz irrupção nela, ela se transforma em fantasia (motakhayyila) e se torna um demônio. Donde seu lugar ambíguo ora determinado pelo intelecto, ora perdido pela estimativa.
Se a Imagem intelectiva é a matéria sutil do Anjo, é que ela é um Intermundo entre o Inteligível e o sensível, beneficiando de uma existência autônoma e de um poder transfigurador próprio. Este mundo intermediário garante em primeiro lugar a continuidade e a progressão aos níveis ontologicamente superiores; ele é o situs dos eventos da alma, dos relatos visionários tão importantes nos estados contemplativos da mística; ele torna possível a articulação de uma linguagem simbólica posto que as imagens se transmutam neste lugar meio-espiritual, meio-sensível (Geistleiblichkeit) no qual as impressões subliminais da alma parecem sob formas simbolizadas, — e isto tanto ao nível da antecipação escatológica quanto ao nível póstumo do devir da alma (corpo sutil de ressurreição). Este mundo, sendo um desvelamento interior, é uma inversão do tempo e do espaço: o que estava oculto sob as aparências se revela subitamente para envelopar o que estava até então exterior; o invisível se faz assim visível; é portanto situacional e não situado (NO ISLÃ IRANIANO IV). A passagem a este mundo exige uma reviravolta do tempo dos horizontes em tempo da alma, logo uma hermenêutica espiritual (tawil). Finalmente, este mundo projeta, em razão de sua faculdade de metamorfose , uma geografia visionária com suas cidades fabulosas, suas montanhas, suas fontes e seus rios.