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Naturphilosophie / Filosofia da Natureza

  

Segundo Antoine Faivre   por physica sacra, física sagrada entende-se geralmente, no Ocidente moderno, uma abordagem dos fenômenos naturais esclarecida por uma fé ou por um saber de caráter religioso. Trata-se de afirmar, ou de querer demonstrar, que a Natureza porta as assinaturas do divino, ou que entre ela e os relatos da Bíblia   (Gênesis, Ezequiel, Jó, Isaías, e outros) não poderia haver contradição. Mas esta maneira de abordar o mundo dos fenômenos pode tomar diferentes formas. Por comodidade e apesar da complexidade das correntes de pensamento ou suas sobreposições de fato, poderia se distinguir três principais: o literalismo bíblico, a físico-teologia, e o analogismo hermenêutico.

Nesta seção dedicaremos páginas à terceira corrente identificada por Antoine Faivre, que assim a apresenta de modo resumido:

A terceira forma de abordagem não consiste de modo algum em querer demonstrar, contrariamente a primeira, a compatibilidade ou a incompatibilidade de resultados científicos com a Bíblia, nem menos em apresentar, como faz a físico-teologia, comparações termo a termo marcadas de estranheza ou de pitoresco. Trata-se todavia de esclarecer os dois Livros — o da Natureza e o da Revelação — um pelo outro à luz da analogia, instaurando entre eles um diálogo permanente a favor do qual eles se enchem de sentido sempre novos e complementares. A Natureza é viva, a Escritura é carregada de conhecimentos múltiplos. Um jogo de espelhos se instaura entre os três principais dramatis personae: Deus o Espírito, o homem, a Natureza; uma Natureza percebida como viva em todas suas partes e que, à exemplo da Escritura, se apresenta como um texto interpretável a vários níveis. A Revelação confere aos fatos científicos significações novas, e inversamente uma hermenêutica dos fatos científicos ser para enriquecer o conteúdo da Revelação. Este duplo movimento não é desconhecido da Idade Média, mas o universo simbólico medieval repousava sobre um tecido de correspondências de caráter estático; por conseguinte, a necessidade desta reciprocidade hermenêutica se fazia sentir menos, enquanto com o advento dos Tempos modernos a ciência concreta tem todavia uma palavra a dizer. Em reação contra a dessacralização do mundo tratava-se de re-sacralizar a "física" e de transferir ao Espírito, ao Divino, propriedades desta mesma física. Na interface entre estes dois movimentos complementares tem lugar um imaginário apto a dinamizar, que neste caso sabe recorrer à tradições esotéricas como a Alquimia  , Astrologia, Cabala  , Filosofia Oculta...

Essa terceira forma de abordagem, por vezes denominada "física superior" — ou "sagrada" — por seus representantes, se exprime em duas correntes de pensamento que em alguns autores se recobrem naturalmente. Por um lado a Theosophia; por outro lado, a Naturphilosophie de tipo neoparacelsico depois romântico (vide Romantismo  ). Poderia se dizer da Theosophia que ela é uma hermenêutica se exercendo sobre textos proféticos ou revelados, ou sobre visões, para fazer fluir destes significações múltiplas, buquês de sentido. O teósofo escruta os mistérios da Divindade e do universo conjuntamente, ou melhor as relações unindo Deus, o homem e a Natureza; ele é mais ou menos um filósofo da Natureza — um Naturphilosoph — ou um teósofo, segundo sua imaginação criadora se exerça mais a partir da observação dos fenômenos naturais ou a partir do Divino. O Naturphilosoph, no sentido romântico do termo, pode não ser teósofo — assim como Schelling   ou Lorenz Oken — mas um bom número de Naturphilosophen partem do dado empírico, científico, para integrá-lo nas especulações de tipo teosófico — assim Oetinger   ou Johann Wilhelm Ritter. Pensadores como Franz von Baader   ou Johann Friedrich von Meyer   representam também bem uma e outra corrente.