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ecologia

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Jean-Marc Drouin [1], em seu livro sobre a “reinvenção da natureza”, traça um percurso histórico da ecologia. Apesar de compartilhar da mesma visão de nomadismo da noção de meio, de Canguilhem  , Drouin oferece algumas outras elaborações ao centrar sua abordagem sobre uma visão organicista do meio.

O livro de Drouin começa como de praxe, desde o prefácio de Michel Serres  , pela etimologia do termo ecologia, como teoria ou discurso (logos ) da casa (eco ), do sítio, do nicho, do hábitat, do “meio”,..., “dos lugares propícios e próprios aos viventes”. Mas, levanta logo uma conjectura muito interessante: a metamorfose de uma ideia, na passagem do lugar como sítio do indivíduo ao lugar como sistema de indivíduos, o meio; segundo Serres, “uma declinação segundo uma singularidade tópica, um universal da ciência do ser vivo”.

Para Serres, neste prefácio, e posteriormente em seu livro Atlas [2], o vivo e o não-vivo não ocupam lugares do mesmo tamanho. Pode-se falar de local e de global, respectivamente; o não-vivo, como global no espaço e no tempo, amplamente estendido e durável, e, por vezes, até submetido a leis universais, abriga o vivo, o local e singular, até mesmo breve, pequeno e frágil. “O não-vivo estabelece a condição necessária na qual o vivo se sustenta” (vale salientar a notável similaridade com a visão de Vidal de La Blache).

Drouin reconhece, como de hábito todos os historiadores, a criação do termo ecologia em Haeckel (1866), seguidor de Darwin. Designando originalmente “a ciência da economia, dos hábitos, do modo de vida, das relações vitais externas dos organismos”, o termo ecologia se contrapunha ao termo mesologia (estudo dos meios), criado por Louis-Adolphe Bertillon [3], que lhe consagra um artigo em 1865, no Dicionário de Medicina de Littré e Robin  .

Para Drouin, desde Hipocrates, que seria autor de um tratado intitulado “Dos ares, das águas, dos lugares ”, se pode identificar uma linha de pensamento que culminaria nas correntes higienistas dos séculos XVIII e XIX, onde se verificam diversas observações, reflexões e conselhos sobre a influência do “meio” sobre a saúde e as doenças.

Focalizando preferencialmente a modernidade, Drouin passa em revista alguns pensadores que considera significativos em sua perspectiva histórica. Começando por Lineu, que junto com sua proposta de um sistema de classificação e de nomenclatura das espécies, evocou, sob a luz da Teologia Natural de John Ray (1735), a ideia de “economia da natureza”: a sábia disposição dos seres naturais, instituída pelo Soberano Criador, segundo a qual estes tendem a fins comuns e tem funções recíprocas.

Seus seguidores preferem concentrar-se na sua proposta de sistematização e nomenclatura, mas seu rival, Buffon, mais inclinado a pintar comportamentos e a busca de causas, desenvolve esta ideia de uma certa “economia da natureza”, sem deixar de lado, no entanto, uma certa preocupação com classificações e descrições.

Lamarck, por sua vez, não desdenha a sistemática, mas promove uma direção das pesquisas, orientando-se para o conhecimento da origem, das relações e do modo de existência de todas as produções naturais que nos cercam, por todo lugar. A ideia de economia começa a se desdobrar, assumindo no século XIX, uma conotação ligada, mais especificamente à: interdependência das espécies, circulação dos elementos e localização das espécies.

A interdependência das espécies, com uma atenção voltada ao regime alimentar, se utiliza do desenvolvimento da química do final do século XVIII, para se apropriar das novas considerações sobre a inter-relação dos reinos mineral, vegetal e animal; a fisiologia emergente se considera apta a repensar a agronomia, enquanto Cuvier define a agricultura como “a arte de fazer de sorte com que haja sempre, em um espaço dado, a maior quantidade possível de elementos, combinados, por sua vez, em substâncias vivas”. Era preciso se contrapor, através da valorização da ciência e da técnica, ao espectro apocalíptico decretado por Malthus.

A Geografia Botânica tendo se elevado como nova preocupação ao final do século XVIII, se alia às demais ciências naturais, e se abre sobre a agronomia, a economia política e até a geografia humana, em grande parte, graças aos avanços na sistemática, na fisiologia vegetal e na geografia física. Com toda esta importância, valorizada politicamente como um estudo que pode combater as posições malthusianas, a paternidade da Geografia Botânica é disputadíssima entre De Candolle e Humboldt  . Reconhece-se, no entanto, desde aquela época, a importância das visões holísticas sobre planta e meio, levantadas por Bernardin de Saint-Pierre; assim como as distinções estabelecidas por Jules Thurmann (1849), sobre flora, como número de formas vegetais distintas, e vegetação, como sua proporção e associação em um lugar.

Sem dúvida, tanto para Drouin como para outros historiadores, foi Alexander von Humboldt, um dos principais fundadores deste pensamento complexo, reunindo, geografia, biologia, botânica, zoologia, cartografia, classificação, e particularmente quantificação. Nele se formaliza a ideia de cadeia causal, identificável por parâmetros físicos, definidos por dados espaciais, que determinam a vegetação, que influi sobre a fauna e o ser humano; este último, por sua vez, interferindo e modificando o composto.

Quando não se pode submeter fenômenos complicados a uma teoria geral, já se tem algum ganho se se consegue fixar relações numéricas pelas quais um grande número de observações sejam ligadas, e sujeitas a influência da causas perturbadoras, a leis puramente empíricas. [4]

Para Drouin, a quantificação assume o primeiro plano, sobre o qual Humboldt se apoia para dar conta do aspecto geral, da fisionomia da paisagem; ele se apoia sobre a medida, a quantificação e a pesquisa das causas físicas elementares, para compreender um real do qual tem que se preservar ao mesmo tempo a unidade e a multiplicidade; Humboldt afirma que o caráter da natureza em uma região dada está “na beleza absoluta das formas”, “na harmonia e no contraste que nascem de sua composição”. [de Castro  , Tese de Doutorado em Geografia, 1999]

LÉXICO: ecologia

Observações

[1DROUIN, Jean-Marc (1991), Réinventer la nature. L’ecologie et son histoire. Paris, Desclée de Brouwer.

[2SERRES, Michel (1994), Atlas. Paris, Julliard.

[3Para o geógrafo Augustin Berque, já no século XIX, se enunciava uma tentativa de ciência do “meio”, através do que se denominou de “mesologia”, instaurada por Louis-Adolphe Bertillon (1821-1883). A mesologia pretendia ser uma síntese do que chamamos hoje de ecologia e sociologia, pois tendia para uma fenomenologia do “meio” físico, em associação com uma teoria da imitação (mimesis) quanto ao “meio” social. (BERQUE, Augustin (1990), Médiance, de milieux en paysages. Montpellier, Reclus.)

[4Humboldt, apud DROUIN, Jean-Marc (1991), Réinventer la nature. L’ecologie et son histoire. Paris, Desclée de Brouwer.