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socrático

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Na verdade, no contexto dos diálogos socráticos, a investigação da ἀρετή [arete] estriba-se, antes de mais, numa situação real e fáctica.

Estriba-se, porque tal investigação é feita dialogicamente, entre homens comuns, no ambiente comum e aberto da Cidade, discutindo as opiniões correntes e usando a linguagem natural desses homens e dessa Cidade. Estriba-se, a um outro nível, porque, como veremos, o exame socrático não visa tanto nem tão-só essas opiniões no seu simples valor propositivo e abstrato, mas ocupa-se do próprio interlocutor, do seu saber real ou aparente e das consequências que essa alternativa reflete na sua própria vida, de tal modo que, para utilizar a feliz expressão de Seeskin, se é certo que «umas vezes Sócrates fala acerca de examinar as opiniões das pessoas e às vezes [...] acerca de examinar as suas vidas», «o facto é que ele examina as opiniões nas quais as suas vidas estão baseadas» [Dialogue and Discovery — A Study in Socratic Method, Albany, State University of New York Press, 1987, p. 152, n. 14.]. Mas estriba-se, num plano mais radical, porque a própria excelência é de certa forma uma evidência real e fáctica, cuja evidente realidade e facticidade se demonstra na circunstância mesma de se poder falar sobre ela e, o que é mais, de se falar naturalmente sobre ela.

Com isto não se sugere, contra toda a imediata intuição e toda a constitutiva tendência do próprio questionamento socrático, que a excelência seja em si mesma alguma coisa de corrente, ou que abundem ou sequer se perfilem exemplos acabados de excelência. O que se afirma é que o simples falar sobre a ἀρετή é a prova de que há dela alguma experiência, pois todos sabemos o que significa a palavra e, antes disso, que essa palavra significa algo, o que supõe que o que tal palavra significa de algum modo nos foi dado, pelo menos o suficiente para que imediatamente possamos falar sobre ela. Ora não só Sócrates (conscientemente) e os seus interlocutores (atematicamente) sabem disso, como é daqui — desta facticidade da ἀρετή — que parte todo o diálogo socrático. [MesquitaPlatão:49]


LÉXICO: socrático