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quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

FILOSOFIA MODERNA
Martin Heidegger  : CIÊNCIA E PENSAMENTO DO SENTIDO — O REAL

O real é tanto o operante como o operado, no sentido daquilo que leva ou é levado à vigência. Pensando-se de maneira bem ampla, "realidade" (Wirklichkeit) significa, então, estar todo em sua vigência, significa a vigência em si mesma acabada do que se pro-duzir - pro-duz e se leva ao vigor de si mesmo. "Operar", "wirken", pertence à raiz indo-europeia uerg de onde provém a palavra "obra", "Werk", e o grego ergon. Mas nunca será demais repetir: o traço fundamental de "operar", "wirken", e de "obra", "Werk", não reside no efficere e no effectus mas em algo vir a des-encobrir - des-encobrir-se e manter-se desencoberto. Mesmo quando os gregos, a saber, Aristóteles, falam daquilo que os latinos chamaram de causa efficiens, eles nunca pensam em causa e efeito. Para eles, o que se per-faz num ergon é o que se leva à plenitude da vigência; ergon é a vigência, no sentido próprio e supremo da palavra. Somente, por isso, Aristóteles chama a vigência do que está em pleno vigor de sua propriedade, de energeia ou também de entelecheia, ou seja, o que se mantém na plenitude (de sua vigência). Em sua força significativa, um abismo separa estes dois termos, cunhados por Aristóteles para dizer a vigência em sentido próprio e pleno do vigente, do significado posterior e moderno de "energia" e "enteléquia", entendidas, como condição e capacidade inatas para agir.

Nossa palavra "realidade" [Wirklichkeit] só traduz adequadamente a palavra fundamental de Aristóteles para a vigência [Anwesen] do vigente (energeia) se pensarmos "real" e "realizar" de modo grego, no sentido de trazer para (her) o desencoberto [Unverborgene], de levar para (vor) a vigência [Anwesen bringen]. "Wesen", "viger" é a mesma palavra que "währen" "durar", "permanecer", "ficar". Pensamos a vigência, como a duração daquilo que, tendo chegado a des-encobrir - desencobrir-se, assim perdura e permanece. Desde o tempo posterior a Aristóteles, este significado de energeia, ficar e permanecer em obra, foi entulhado por outros significados. Os romanos traduzem, isto é, pensam ergon a partir da operação - operatio, entendida, como ação - actio, e dizem para energeia ato - actus, uma palavra inteiramente outra e com um campo semântico totalmente diverso. O vigente numa vigência aparece, então, como o resultado de uma operação - operatio. O resultado [Ergebnis] é o que sucede a uma ação - actio, é o sucesso [Er-folg]. O real é, agora, o sucedido, tanto no sentido do que aconteceu, como, no sentido do que tem êxito. Todo sucesso é produzido por algo que o antecede, a causa. É, então, que o real aparece à luz da causalidade da causa efficiens. Até Deus é representado na teologia, não na fé, como causa primeira - causa prima, causa primeira. [...]

No sentido de factum - fato e fatual, o "real" [Wirkliche] se opõe ao que não consegue consolidar-se numa posição de certeza e não passa de mera aparência ou se reduz a algo apenas mental. Mas, mesmo nestas mudanças de significado, o real sempre conserva o traço mais originário de vigente [Grundzug des Anwesenden], daquilo que se apresenta por si mesmo, embora se ofereça agora com menos ou com outra intensidade.

É que, agora, o real se propõe em efeitos e resultados. O efeito faz com que o vigente [Anwesende] tenha alcançado uma estabilidade e assim venha ao encontro e de encontro. O real se mostra, então, como objeto - ob-jeto (Gegen-stand).