Página inicial > Termos e noções > alma e imagem

alma e imagem

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Filosofia
Glória Ribeiro: Excertos de seu ensaio sobre o Eckhart   Sermão 2 - SERMÃO II de Mestre Eckhart, em "Ensaios Filosóficos"

A alma é aquilo que nos anima, a atualização do nosso ser mais íntimo, isto é, do ser intelectual (intelecto tem aqui o sentido de um recolhimento). Compreendida desta forma, a alma é algo de espiritual, por isso, tudo o que é sensível, tudo o que é material, lhe é estranho. Assim, toda a ação da alma que visa algo para fora dela mesma, necessita de um meio através do qual possa operar sua união com o que lhe é exterior. Donde nos advém que a alma opera sempre por meio de faculdades e não com o ser. Ou seja:

Quando deseja algo, a alma deseja através da vontade; Quando se recorda de alguma coisa, o faz através da memória; Quando conhece algo, este conhecimento se dá pela razão; Quando percebe algo, a alma o faz pelos sentidos.

Segundo Eckhart, a alma retira, através das suas faculdades, uma imagem do que lhe é dado pelo sensível. Por exemplo: da forma sensível de um cavalo, com todas as suas particularidades e notas individuantes, as faculdades da alma retiram uma imagem que em tudo é semelhante ao cavalo concreto. Esta imagem é o modo como a alma, através das suas faculdades, converte o estranho em familiar. Sendo somente através desta familiaridade, trazida pela imagem, que é dado à alma se aproximar das criaturas.

"A imagem não é, pois, outra coisa do que algo que a alma recolhe das coisas através das suas faculdades. Quer deseje conhecer uma pedra, um cavalo, um homem ou qualquer outra coisa, a alma sempre vai buscar a imagem que antes assimilou para, deste modo, poder unir-se com ela"4.

Contudo, estas imagens apreendidas do sensível pelas faculdades da alma, muito embora possuam um certo grau de generalidade, são ainda imagens particulares, ou melhor, imagens do particular. Por conseguinte, não dão à alma o conhecimento verdadeiro das criaturas. Ora, conhecimento tem aqui o sentido de uma união que se opera entre aquilo que conhece (a alma) e a coisa conhecida (as criaturas), e verdade, o de uma adequação que se opera entre estes dois termos. Pois bem, as imagens não permitem a união adequada entre a alma e as criaturas porque ainda permanecem presas às particularidades destas, e, desta forma, nos remetem para o real em sua concretude — isto é, precisamente, aquilo do que a alma não consegue sequer se aproximar. A alma só pode unir-se de forma adequada com o que lhe é semelhante, com o que, de certa forma, nela já se encontra. Ora, a alma diz a atualização do nosso ser intelectual, por conseguinte, ela deve se unir com aquilo que nas coisas há de inteligível, isto é, com a essência. Sendo assim, é necessário que a alma busque, na imagem que tira das coisas, o que aí existe de essencial.

Esta busca é o que caracteriza o saber que a alma tem através da razão, e que transcende às coisas sensíveis, bem como às imagens destas onde nos mantemos presos. É um tipo de saber elevado que visa, acima de tudo contemplar as ideias — ou se se quer, o Uno do qual participa tudo o que é, sejam as coisas nelas mesmas, sejam as imagens que destas coisas possuímos.