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cristianismo sexualidade

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Perenialistas
Frithjof Schuon  : Schuon Esoterismo Principio Via - O ESOTERISMO COMO PRINCÍPIO E COMO VIA

A sexualidade em si, no âmbito cristão, isolada portanto de todo contexto distorcivo, traz, naturalmente, o oprobio da "bestialidade", ao passo que, na realidade, nada do que é humano é bestial por sua natureza. É por isso que somos homens e não animais. Todavia, para escapar à animalidade de que participamos, é preciso que as nossas atitudes sejam integralmente humanas, isto é, conformes com a norma a nós imposta pela nossa deiformidade. Elas devem englobar a nossa alma e o nosso espírito ou, em outras palavras, a devoção e a verdade. Não obstante, só é bestial a paixão cega do homem que perdeu a graça divina e não a sexualidade inocente dos animais. Quando o homem se reduz à sua animalidade, torna-se pior que os animais, que não traem nenhuma vocação e não violam nenhuma norma; não se deve misturar o animal, que pode ser uma criatura nobre, com tabus e anátemas do moralismo humano.

Se o ato sexual é por sua natureza um pecado — como quer, no fundo, a perspectiva cristã e penitencial [1] —, transmite-se essa natureza à criança que nela é concebida. Se, em compensação, o ato sexual representa, por sua natureza profunda e espiritualmente integral, um ato meritório, porque em princípio santificante [2] — ou um sacramento primordial, evocando e realizando uma união com Deus sob as condições exigidas —, a criança concebida segundo essa natureza será hereditariamente levada à união, nem mais nem menos, como é levada ao pecado no caso contrário. Aliás, o fato de o próprio ato ser, de jure senão de facto, uma espécie de sacramento, implica que a criança seja um dom e não o fim exclusivo do ato. [3]

A Igreja abençoa o casamento em vista da procriação dos homens, dos quais fará crentes; ela o abençoa, assumindo o inconveniente inevitável, mas provisório, do "pecado carnal". Tenderíamos a dizer que, neste caso, ela está mais próxima de São Paulo do que de Cristo, ou seja, São Paulo, sem inventar nada — o que está fora de questão —, ressaltou no entanto as coisas tendo em vista uma aplicação particular e não necessária em si. Incontestavelmente, Cristo indicou o caminho da abstinência. A abstinência não significa necessariamente que o ato sexual seja de natureza pecadora; pelo contrário, pode significar que os pecadores o profanam, pois os pecadores, na união sexual, roubam de Deus o gozo que Lhe pertence. Visto deste ângulo, o pecado de Adão consistiu em açambarcar o gozo: atribuir a si mesmo o gozo como tal, embora o erro estivesse a um só tempo no roubo e na maneira de encarar o objeto do roubo, ou seja, um prazer substancialmente divino. Portanto, era usurpar o lugar de Deus, excluindo-se da subjetividade divina da qual o homem participava na origem; era não mais participar desta e se fazer a si mesmo sujeito absoluto. Fazendo-se praticamente Deus, o sujeito humano limitou e aviltou a um só tempo o objeto da sua felicidade e até todo o ambiente cósmico.


Observações

[1Aparentemente, esta perspectiva não é exclusivamente cristã, mas devemos interpretá-la aqui em sua forma mais conhecida.

[2O que se aproxima do fato de, nos diversos mundos tradicionais, considerar-se fertilizante o ato sexual do príncipe, através da mulher, para o solo do país, ou propício para o aumento da prosperidade do povo.

[3Se o ato sexual é uma faca de dois gumes, capaz de produzir consequências escatológicas totalmente opostas, dependendo das condições objetivas e subjetivas que o acompanham, ele pode fazer com que se pense, mutatis mutandis, nos sacramentos que, na ausência das condições requeridas, têm por efeito não a graça, mas a condenação.