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doxa
sexta-feira 25 de março de 2022
dóxa : 1) opinião, 2) juízo
Segundo Jayme Paviani, é uma modalidade de conhecimento considerado inferior ou pseudo-conhecimento na perspectiva platônica. Contrapõe-se ao conhecimento, episteme , da ciência (Filosofia e Método em Platão).
1. Opinião: a distinção entre o verdadeiro conhecimento (episteme) e um grau inferior de cognição remonta a Xenófanes (frg. 34), mas a exposição clássica dos pré-socráticos pode encontrar-se no poema de Parmênides (frg. 8, versos 50-61) onde a sensação (aisthesis) é relegada para a posição de «aparência» ou «opinião» (doxa). A distinção baseia-se no estatuto ontológico do objeto da percepção dos sentidos (aistheta) que, em virtude da sua exclusão do domínio do ser verdadeiro (on), não pode ser objeto do verdadeiro conhecimento.
2. A distinção surge de forma idêntica, na epistemologia platônica, embora então a posição tivesse sido fortalecida pelos insistentes ataques dos sofistas à aisthesis como relativa (ver Platão, Teeteto 166d-177a, referindo Protágoras), Na Republica 467e-480a Platão põe a distinção de Parmênides como uma série de correlativos epistemológicos e ontológicos: ao verdadeiro conhecimento corresponde a verdadeira realidade, i. e., os eide, enquanto a ignorância tem como correlato o totalmente não-real. Entre os dois há um estágio intermediário: um quase conhecimento do quase-ser. Esta faculdade intermédia (dynamis ) é doxa e os seus objetos são coisas sensíveis (aistheta) e as opiniões vulgarmente sustentadas da humanidade. Os resultados são posteriormente esquematizados no Diagrama da Linha (Republica 509d-511e) onde o domínio da doxa é depois aperfeiçoado ao ser dividido em crença (pistis . q. v.) cujos objetos são os sensíveis, e «conhecimento das aparências» (eikasia), uma categoria de cognição introduzida pelo ponto de vista platônico da natureza da atividade produtiva (ver techne , mimesis ).
3. A dicotomia entre episteme e doxa permanece fundamental para Platão, se bem que ele traia um crescente interesse pelo mundo sensível (ver aistheton, episteme).
4. Juízo: o ponto de vista platônico da doxa, baseado como é na separação dos eide das coisas sensíveis, não encontra apoio na visão aristotélica da realidade, mas há um outro contexto dentro do qual a problemática da doxa pode ser tratada. A questão da verdade e do erro surge particularmente no domínio do juízo, problema que também tem as suas origens nas premissas de Parmênides acerca do ser (on. q. v.): uma vez que só o ser pode ser pensado ou nomeado, como é possível fazer um juízo falso, isto é, uma definição acerca do não-ser (frg. 3; fr. 8, verso 34)? No Soph. 263d-264d Platão mostra que, tal como há falsa asserção ou discurso (logos ), assim também há falso juízo (doxa) que é a exteriorização deste discurso. As possibilidades do juízo falso são discutidas no Teeteto 187c-200d, mas uma vez que a posição verdadeira resulta da solução do problema do não-ser (me on ; ver on, neteron), a análise final não é apresentada antes do Soph. 263b-d: o erro (pseudos) é um juízo (doxa) que não corresponde à realidade, quer à «realidade» da situação sensível quer à verdadeira realidade do eidos do qual o sensível participa.
5. O tratamento que Aristóteles faz da episteme e da doxa desloca-se para outro campo . O conhecimento é ou imediato (ver noas) ou discursivo (dianoia ). O último pode ser descrito como episteme se procede de premissas que são necessárias, como doxa se as premissas são contingentes (Anal. post. I, 88b-89b), i. e., se pudessem ser de outro modo, e na verdade Aristóteles define a doxa como «aquilo que podia ser de outro modo» na Metafísica 1039b.
6. Ao discutir os tipos de silogismos in Top. I, lOOa-b Aristóteles trata a contingência da doxa de um ângulo um tanto ou quanto diferente. Um silogismo demonstrativo (apodeixis ) assenta em premissas que são verdadeiras e essenciais. Assim ele difere de um silogismo dialético (dialektike ) cujas premissas são baseadas em endoxa, definidas agora como opiniões que são aceites pela maioria ou pelos sábios. Para as implicações disto no método aristotélico ver endoxon.
7. O ponto de vista epicurista da doxa compartilha os traços platônicos e aristotélicos. É a opinião, certo movimento espontâneo existente em nós que se aparenta com, mas difere da sensação (aisthesis). Para Epicuro a aisthesis é verdadeira mas não necessariamente auto-evidente (enargeia) e assim a doxa é capaz de se estender para além da evidência dos sentidos como, por exemplo, ao atribuir por meio do seu juízo dados dos sentidos à errada prolepsis , e por isso é a fonte do erro e da falsidade (D. L. X, 50-51). [Termos Filosóficos Gregos, F. E. Peters ]