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Fernandes (FC:37-38) – Desapego ao Conhecimento

sexta-feira 23 de setembro de 2022

      

A "sabedoria  ", no sentido positivo, de "conhecimento", mesmo quando atingida em exaltados, extáticos, alterados estados mentais, não liberta. Ao contrário, escraviza: sob o aspecto psicológico de "crença", exige uma adesão, ou uma não-adesão. Ora, o Buda   não é nenhum cético, que creia subrepticiamente em tão "altos" padrões lógicos de crítica, que seja levado a afirmar que nada sabe. Aquilo de que no Ocidente apenas nos aproximamos, sob a forma atitudinal (erigida em Método) de "suspensão do juízo", é, no Buda, o desapego   ao conhecimento, que é sempre dual. E estar desapegado de um conhecimento que se tem, e que se sabe que se tem, é muitíssimo diferente de negá-lo. Pelo contrário, é a condição sine qua non para usá-lo com espontaneidade, sem ser por ele "usado". Todo conhecimento é como o reflexo, na Lua  , da luz do Sol. E o erro   fundamental é a soberba   de reconhecermo-nos na Lua (que, às vezes, aliás, é desenhada com um rosto humano), ou tomá-la como estrela  : "Construtor de casas! Vós não construireis de novo. As vigas do salão estão quebradas, o topo, esfacelado ...". O "salão" é aqui um daqueles doados por autoridades e filantropos, junto com parques e pousadas, para discussões filosóficas ou religiosas. E a fonte   é uma das mais antigas que conhecemos, o Discurso sobre a Teia de Brahma  . Impossível não lembrar que Jesus   discutiu no Templo  , antes de expulsar dele seus "mercadores" de teses, antíteses e sínteses, que "tentam reconstruir as origens últimas das coisas e deduzir a eternidade   do mundo e do eu" (Brahman  -Atman  ) — no Ocidente, o Ego   Transcendental —, ou distinguir   o eterno do efêmero, discutir a finitude ou a infinitude do universo  , seu surgimento por acaso, a existência consciente ou inconsciente do eu após a morte, a possibilidade de total extinção da consciência, ou de a beatitude   ser atingida neste mundo.

Tampouco o desapego ao Conhecimento, construção sobre a fragílima ponte dessa vida, é como um veto epistemológico, kantiano, à metafísica. A resposta   do Buda à pergunta sobre porque ele "nada tinha a declarar" a respeito dos dez   problemas metafísicos: Se o mundo é eterno; se é efêmero; se é finito  ; se é infinito  ; se a alma   é o corpo; se são distintos; se a Sabedoria — no caso, o Buda — persiste após a morte; se não persiste; se persiste e não persiste ao mesmo tempo; e se a Consciência e o eu são idênticos ou distintos, é:

Nada tenho a declarar, porque esses assuntos não levam ... à Sabedoria. [FernandesFC  ]


Ver online : Sergio L. de C. Fernandes