Os escritos de Gregório de Nissa versam sobre sua noção de “sentidos espirituais”, distintos de outras formas de percepções criadas, os quais tornam Deus acessível ao homem . Na Vida de Moisés, usando o relato bíblico como uma parábola da ascensão espiritual cristã, descreve como este encontro com Deus ocorre “na nuvem”, ou seja, sem a ajuda de uma visão criada, pois Deus é totalmente invisível e incompreensível aos olhos criados, e inacessível a mente criada (apophasis ). No entanto Ele é visível e perceptível pelo homem, quando pelo batismo e pela purificação ascética, pelo esforço e virtudes, é capaz de adquirir os “sentidos espirituais”, que lhe permitem perceber o Uno , através da comunhão com o Cristo e o Espírito Santo. (J. Meyendorff, prefácio a The Life of Moses, Abraham Malherbe & Everett Fergunson. Paulist Press, 1978)
Na excelente introdução de sua tradução da "Vida de Moisés, Abraham Malherbe e Everett Ferguson, consideram que a obra deve ter sido escrita nos anos 390 AD, Gregório já em idade avançada. Uma doutrina madura da vida espiritual se descortina, com ênfase na encarnação, e sobremaneira ancorada em textos bíblicos.
Na edição de Werner Jaeger das obras de Gregório, são reunidas na denominada Opera Acetica: De instituto Christiano, Da Profissão Cristã, Da Perfeição, Da Virgindade e a Vida de Macrina. A Vida de Moisés, Dos Títulos dos Salmos , Homilias sobre o Eclesiastes, Da Oração do Senhor, Das Beatitudes e Do Cântico dos Cânticos são obras tratadas geralmente em separado, como lidando com os aspectos "místicos" da vida espiritual, tomando o texto escriturário como ponto de partida.
A "perfeição de acordo com a virtude" pode ser considerado o tema não somente da Vida de Moisés mas também do "Da Perfeição" e "Da Profissão Cristã". Dos demais trabalhos exegéticos, a Vida de Moisés tem muito em comum com o comentário dos Cânticos. Estas obras parecem pertencer a um mesmo período da vida de Gregório. Jean Danielou - Daniélou põe a Vida de Moisés entre o "Do Cântico" e "Da Perfeição", e Jaeger a vê como precedendo imediatamente De instituto Christiano, que considera o clímax dos escritos espirituais de Gregório.
As mesmas ideias complexas recorrem em todos os escritos de Gregório. Daí a genuinidade da Vida de Moisés nunca foi questionada. O tratado se dirige a Cesário, que tudo indica ser um monge , procedendo de um tempo em que Gregório era reconhecido pelos ascetas da Ásia Menor como um mestre da vida espiritual. O tratado tem seu lugar como parte de um programa de Gregório de prover compreensão ideológica ao movimento monástico organizado por Basílio.
A Vida de Moisés tem a forma de um logos , ou seja é um tratado formal, lidando com a "Perfeição na Virtude". Pode ter sido projetado para leitura em voz alta na morada dos ascetas. Há quatro seções:
- (1) Prefácio, ou carta de introdução;
- (2) História (gr. historia ), ou paráfrase da história bíblica;
- Segundo o Abade Stephane não se trata de uma história profana; seria todavia o denominaríamos uma "história santa", uma exegese literal edificante.
- (3) Contemplação (gr. theoria ), ou sentido espiritual da narrativa escriturária, que é a principal preocupação;
- Onde a história de Moisés se torna símbolo do itinerário místico da alma . Os episódios maiores são a Sarça Ardente e a ascensão do Sinai; a estrutura geral da vida espiritual comporta então a purificação da vida carnal, depois a iluminação, e enfim o mistério do Ser inacessível que se persegue indefinidamente.
- (4) Conclusão.
A abordagem em História - historia e theoria era comum na instrução catequética. O importante é a hermenêutica que elucida toda uma simbologia como por exemplo: "o sexo feminino como símbolo do mundo sensível e das paixões"; "a virtude como a ‘via real’ que conduz o homem espiritual à montanha santa"; a ascensão da montanha é uma "mistagogia" onde Moisés é iniciado nos mistério do Sacerdócio. NO curso de sua ascensão, Moisés penetra nas Trevas, quer dizer na transcendência da Essência divina em relação a todo espírito criado: a alma, em busca de Deus, crê então o alcançar nas luzes que dele recebe, até que, de desafio em desafio, acaba por compreender que ver Deus consiste em não ver e é nesta demanda ela mesma que reside o conhecimento daquele que supera todo conhecimento.
O Abade Stephane considera que seria insuficiente ficar nesta exegese puramente espiritual, de inspiração platônica, e justamente Gregório vai além a "cristianizando" ou "batizando" por meio de outra exegese já incipiente no NT e nos primeiros Padres da Igreja . Tudo deve ser considerado como centrado em Cristo. A serpente de bronze, o maná, o Cordeiro pascal , a coluna luminosa, a fonte borbulhante são aplicados ao Cristo, tendo por fundamento texto decisivo de Paulo Apóstolo :
"Pois não quero, irmãos, que ignoreis que nossos pais estiveram todos debaixo da nuvem, e todos passaram pelo mar; e, na nuvem e no mar, todos foram batizados em Moisés, e todos comeram do mesmo alimento espiritual; e beberam todos da mesma bebida espiritual, porque bebiam da pedra espiritual que os acompanhava; e a pedra era Cristo. Mas Deus não se agradou da maior parte deles; pelo que foram prostrados no deserto . Ora, estas coisas nos foram feitas para exemplo, a fim de que não cobicemos as coisas más, como eles cobiçaram. (1Cor 10:1-6)
Assim Gregório de Nissa em conformidade com a tradição comum da Igreja, segue o mesmo método de interpretação do Êxodo. A travessia do Mar Vermelho é a figura do Batismo e o Rochedo é o Cristo. Na interpretação do Tabernáculo, Gregório se refere diretamente à Epístola dos Hebreus:
Dizemos portanto, nos valendo de Paulo Apóstolo que tratou deste mistério em parte e nas palavras de quem encontramos um ponto de partida, que Moisés foi instruído de antemão, em figura, do mistério do verdadeiro tabernáculo que contém todas as coisas, quer dizer o Cristo, Virtude e Sabedoria de Deus" (alusão a Hb IX, 11ss).
A seguir excertos da tradução em português oferecida em S. Gregório de Nissa: A Vida de Moisés, incluindo seleções segundo alguns termos e noções chaves.
- Gregorio Nissa Anabasis - ANABASIS
- Gregorio Nissa Katarsis - KATARSIS
- Gregorio Nissa Kakia - KAKIA
- Gregorio Nissa Arete - ARETE
- Gregorio Nissa Hermeneia - HERMENEIA
- Gregorio Nissa Divindade - DIVINDADE
- Gregorio de Nissa Primeira Teofania - PRIMEIRA TEOFANIA
- Gregorio de Nissa Segunda Teofania - SEGUNDA TEOFANIA
- Gregorio de Nissa Terceira Teofania - TERCEIRA TEOFANIA
- Gregório de Nissa Mandamentos - MANDAMENTOS