Os que se dedicam às ciências positivas zombam do filósofo. Por isso, o filósofo pode ser tentado a demonstrar a utilidade da filosofia. [1] Mas em vão. [2] Com efeito, como os que não veem o significado do filosofar compreenderiam com o termo "utilidade" outra coisa senão a utilidade que experimentam no exercício de suas várias ciências ? A física nuclear, a biologia, a economia ou a psicotécnica, p. ex., são úteis para o mundo de trabalho em que estão integradas, mas para ele a filosofia é completamente inútil. [3] A primeira descrição dada por Josef Pieper, numa esplêndida dissertação sobre a filosofia e mundo do trabalho, diz: "Filosofar é um ato pelo qual se supera o mundo do trabalho." [4] O ato filosófico deixa muito atrás de si a "utilidade", como a procuram no mundo do trabalho. Caracteriza-se por uma "inutilidade" que não pode abandonar sob pena de não ser mais filosofia. [5] Justamente, [28] porém, por tender nossa sociedade mais e mais a uma organização tecnocrática do trabalho, [6] a filosofia não só é útil _ embora num sentido totalmente diverso do que o usado em uma tecnocracia — mas até necessária, ao menos para muitos.
Isso não se pode provar fora da ocupação com a filosofia. A compreensão da "utilidade" e necessidade da filosofia pressupõe a presença à realidade que se chama filosofar, à experiência do real filosofar. Dada a circunstância de que essa realidade está ausente para quem mergulha totalmente numa mentalidade tecnocrática, deve reconhecer -se que, na melhor das hipóteses, o que o filósofo diz acerca do ato de filosofar só pode ser aceito em boa fé. Acrescente-se ainda, como ficou demonstrado antes, a objeção de que essa "aceitação" não seja filosófica. Quase sempre verificamos, assim, que uma defesa como a que fizemos não convence os não-filósofos. Os filósofos, porém, não precisam dela, porque a significação da filosofia aparece no próprio filosofar. [7]